DESENCANTO

"Se na vida colheis o desencanto, fazei tal

como eu, que sempre tento das mágoas

retirar o verso e o canto."

Horacio Didimo

 

Capítulo 111

Com as mãos cobrindo o rosto, Dana mantém-se de pé, no meio da sala, paralisada pela absurda dor. Seus soluços haviam cessado aos poucos, enquanto no peito dorido, ficara somente os suspiros dobrados da angústia.

Mulder apanha as malas uma a uma, vagarosamente. Olha Dana ali, sofrendo a dor da separação. Corre o olhar para aquele corpo pequeno e frágil. Um longo suspiro liberta-se de seu peito. O sentimento de infelicidade é tão grande, tão imenso, que acha qe seria grandemente beneficiado se algo acontecesse naquele instante: que a terra o tragasse, que uma violenta síncope viesse sacudir o seu corpo necessitado de descanso.

Ele dá os primeiros passos com as malas nas mãos. Aproxima-se da porta de saída. Abre-a, sem fazer ruído. Como se quisesse evitar que Dana percebesse este momento em que está deixando o apartamento.

Ele dirige um último olhar para o ambiente que os cerca. Sente-se como um soldado derrotado que se rende e abandona a batalha. Tem asco de si mesmo.
"Covarde! - diz a voz interior - Vais abandonar tudo isso? E a mulher da tua vida? E o ser que vocês fizeram vir ao mundo? O futuro dele...? E a obscuridade dos caminhos das vidas desses dois? Tu poderias estar com eles, agora. E com eles lutar, guerrear mesmo pelo paz que vocês merecem ter...! no entanto aí estás, pronto para largar tudo... num ato de asquerosa renúncia! Pobre e infeliz Fox Mulder! És digno de pena...!"

Esses arrasantes pensamentos o deixam cabisbaixo. Ombros caídos. Vencido. Fita, uma vez mais a mulher amada parada, à espera, talvez, de uma desesperada solução ou, quem sabe, apenas duas palavras: vou ficar.

Mas ele não rende-se ao sentimentalismo.

Levanta os ombros. Ergue a cabeça. E com passos pesados e decididos, fecha a porta e caminha rápido pelo corredor.

* * *

O taxi pára diante dele. Entra.

O taxista resolve não insistir em conversar. Pelo espelho retrovisor nota que seu passageiro está passando por algum sério problema. Sua fisionomia preocupada indica isso.

Mulder segue sua corrente infinita de pensamentos.

"Deixei Dana... talvez para sempre. Como vai ser minha vida daqui pra frente? Tudo será um total desencanto. Agora, mais do que nunca, sinto-me um morto-vivo! Sim, é isso! Porque por fora eu prossigo normalmente o decorrer da minha vida, mas o meu interior está acabado! Tudo terminou, agora! E ela estará cuidando sozinha daquela criança. Eu não estarei ao lado de William..."

E, por muitos minutos sua mente vaga, imprecisa, pelas últimas cenas que tivera com Dana, sua companhia, sua força, sua própria vida.

Com os olhos admirados por ver o movimento das pessoas, num burburinho sem fim, Mulder retira do bolso as cédulas para pagamento da corrida do taxi. Agradece ao motorista. Sai do carro.

O saguão do aeroporto está em grande movimento. Ele sente-se incomodado. Nem quer sentar ali, esperando. Prefere andar em meio às pessoas.

Os maxilares de Mulder se apertam. Está grandemente revoltado com o que tem que fazer com a vida, com tudo, enfim.

Um grande desejo de falar com Scully agiganta-se em seu coração. Dirige-se até onde está a fileira de inúmeros telefones públicos.

"Vou ligar pra ela; assim podemos matar a saudade."

Sua mão pega o aparelho, quase sem forças.

"Não!!" - grita o seu interior.
No mesmo instante larga o telefone. Pensativamente recoloca-o na base.

"Não devo telefonar. Primeiramente porque nossa comunicação pode estar sendo grampeada e segundo, porque o sofrimento de Scully já é imenso e isso serviria para fazer com que ela tivesse maiores desgostos. Não vou telefonar. Preciso me segurar e deixar os desejos de lado. Scully... Dana... que falta você me faz...!"

A voz no alto-falante tira Mulder dos pensamentos. É exatamente o vôo no qual seguirá seu destino.

Entra no avião, procurando a poltrona devida.

"E se e pudesse viajar sobre a asa deste avião... e lá, bem no alto, o vento me jogasse no espaço..."

Sacode discretamente a cabeça, tentando livrar-se dos atormentadores pensamentos.

Sente-se estranhamente infeliz. Mas tem que seguir o seu caminho. Esta é a sina de Fox William Mulder. Sempre seguir em frente, tendo, a partir de agora, como única e verdadeira companheira, a solidão.

Estavas comigo, mas te pressentia distante,

demasiadamente longe, como algo só.

Era apenas solidão."

 

Nota - Agradeço à minha amiga Luzimary os versinhos que compõem este Capítulo, bem como os demais nos capítulos que a seguir farão parte deste Folhetim.

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