VIDAS EM JOGO

"A vida é aquilo que acontece,

enquanto você faz planos..."

John Lennon

Capítulo 132

Olha para o relógio digital na mesinha.

06:57

Resolvera levantar mais tarde hoje. Nem tem certeza se vai até o FBI. Não está se sentindo muito bem. Seu coração pesa-lhe no peito. Dormira mal e num sono perturbado. Solta um longo e entrecortado suspiro.

Num ímpeto senta-se na cama. Tem que levantar-se, quer esteja cansada ou não. Quer sua noite tenha sido mal dormida ou não. A obrigação fala mais alto.

Fecha os olhos e faz uma curta oração.

Em seguida levanta-se, meio cambaleante. Veste o quimono e chega até a janela.

Medita o quanto sente-se tão solitária. Tivera tanta esperança certos meses atrás e depois tudo acabara.

Ela encaminha-se para o banheiro.

Retira, lentamente, o robe, a camisola. Olha-se no espelho. Está com os olhos avermelhados pela vigília da noite. Fecha os olhos. Engole em seco, amargurada. Hoje, mais do que nunca sente uma estranha sensação de que algo vai lhe perturbar mais ainda o viver. Algo que não sabe explicar.

Ela liga a torneira de água quente e, aos poucos, vai entrando no chuveiro. Deixa que a água caia em cheio sobre sua pele. Em seus pensamentos. Parece-lhe estar como no tempo em que sentia seu filho dentro do ventre.

É como se sentisse nesse instante os leves tremores que demonstravam que ele estava movimentando seus membros, fechando os punhos ou ainda mexendo os pequeninos dedos das mãos ou dos pés.

Fôra tudo simplesmente maravilhoso! Ela sentira-se privilegiada. Tudo uma dádiva de Deus! E ainda duvidara disso!

Sacode a cabeça, perturbada por esses pensamentos.

Ela passa a mão na pele do ventre liso e vazio.

Sem seu filho!

Como pudera ter coragem para entregá-lo a braços estranhos? E como ele estará? Qual a sua reação diante de uma nova mãe?

Sob as gotas da água morna do chuveiro que caem sobre seus olhos, brotam as lágrimas quentes que vêm do fundo do coração.

* * *

Vinte minutos se haviam passado.

E enquanto, na cozinha, esquenta a água para colocar na xícara que já contém o café solúvel, ela deixa que os pensamentos fluam, naturalmente.

"Não sei se devo ir ao Bureau. Se eu pudesse mesmo, iria para um lugar desconhecido, distante, onde ninguém pudesse ver-me, falar comigo, nem lamentar a minha dor e tristeza."

Ela coloca o líquido quase fervente dentro da xícara e mexe com a colherzinha.

"Que vontade de sumir pra sempre...!"

Engole, aos poucos, o café, colocando a mão na garganta, pois sente arder o líquido fumegante em suas entranhas.

Deixa a xícara sobre a pia e sai da cozinha.

Dirige-se ao quarto. Abre o armário e retira dele seu uniforme de agente.

"Preciso ir lá. Não desejo ir, mas não sei porque, algo me chama."

Dana veste a roupa. Olha-se no espelho do armário. Ajeita o cabelo, agora muito liso e longo.

O som do toque da campainha a distrai de sua concentração.

Ela pára, por instantes.

"Quem será? - pensa e olha para o relógio de pulso

Vai até a porta e observa pelo olho mágico. Vê o rosto de Skinner.

Ela abre a porta, surpresa.

Ela quer entender.

Ela leva a mão à boca, abafando um grito.

E enquanto está atento ao volante e ao complicado trânsito, Skinner lhe conta sobre a descoberta do paradeiro do Mulder naquela cruel e fria cela da prisão militar.

Fala-lhe, também, da estranha submissão dele à sanha atormentadora dos seus algozes.

* * *

Haviam sido dias de muita dor e angustiante tempo de julgamento, no Tribunal Militar, do suposto crime do qual Mulder fôra acusado.

Mas ambos haviam conseguido ultrapassar essa barreira de terror, naquela fuga tempestuosa.

Agora, um pouco de paz.

Penumbra. Quietude. Um quarto de hotel comum.

Scully vasculha, rapidamente, peças de roupa dentro de uma bolsa. Com mãos nervosas. Dedos agitados. Ansiosa.

Mulder deixa o box do banheiro. Apressado. Cheio de desejo.

A luz discreta de um abajur ilumina o quarto simples.

Ela sorri levemente e larga as peças de roupa e a bolsa sobre uma poltrona.

Aproxima-se dele e deixa-se enlaçar por seus braços de amassos amorosos.

Dana sente o corpo dele pronto a dominar o seu num ato de amor.

Mulder procura-lhe a boca, que ela entreabre, para receber o desejo dele.

Neste momento se procuram, se desejam, se unem, iniciando aquele momento esperado por tanto tempo. Boca com boca. Corpo com corpo. Sexo com sexo.

Ele a carrega nos braços para o leito, mesmo assim, colados. Se amando.

Os corações batendo descompassados, os gemidos, o ritmo antes lento e logo acelerado, os abatem numa vertigem infinita de prazer realizado.

Desabam ambos sobre os lençóis macios, curtindo a sua respectiva satisfação do corpo e da alma.

Agarram-se, deitados, aconchegados um ao outro. Sentindo-se, com prazer.

Dana repousa a cabeça sobre o peito de Mulder e deixa-se ficar assim. Aos poucos, sua respiração afogueada vai voltando ao normal.

Mulder, enfim saciado de seu desejo, continua abraçando sua amada bem junto a si, sentindo-lhe os seios apertarem-se-lhe na pele quente de seu peito.

Acaricia-lhe as costas. Beija-a nos cabelos.

Neste momento sente-se quase feliz.

Permanecem quietos, relaxados e em silêncio.

E o sono do descanso desce sobre eles, acalentando-os.

Descanso. Paz. Quietude. Silêncio.

Tudo isso estimula-os a um sono reparador. Até mesmo com suas vidas em jogo.

* * *

Dana abre os olhos.

"Nossa! É verdade mesmo o que está acontecendo?" - pergunta-se em seu íntimo.

Dormira durante horas um sono benfazejo. Sente-se aliviada da terrível tensão na qual se encontrava há dias.

Ela vira o rosto para o lado. Ali está o seu amado.

"Inacreditável!"- ela reflete, novamente.

As horas de fuga, tensão, ansiedade por um porto seguro, haviam lhes deixado quase em pânico. Mas, para sua felicidade estão nesse lugar agora, em momentos de paz e relativa segurança.

Com os olhos presos na figura querida de Mulder, ela o observa de lábios entreabertos, em pleno sono, relaxado sobre a cama, entregue a um sono descansativo, após muitos dias de tensão, tortura e desconforto, na cela fria e úmida onde ele estivera encarcerado, como um delinquente, um criminoso.

Dana vagarosamente levanta-se. Não deseja acordá-lo. Pega as peças de roupa sobre a poltrona.

* * *

Estavam ainda, cansados, esgotados. Foram horas de uma terrível aventura o que havia acontecido com eles.

Fuga. Correria. Cansaço. Desespero. Agonia na espera do resultado de tanto esforço.

Agora estão num merecido descanso, após muitas horas de perigo antes de chegar a esse motel.

Scully havia vestido um quimono.

Mulder já está usando a camisa de malha e a calça jeans.

Ele, abraçando-a, agarrado a ela sobre a cama, a perna por sobre seu pequeno corpo, parece como se nunca mais desejasse soltá-la de seus braços.

Roçam os narizes levemente um no outro, numa carícia sutil.

Ela se aperta mais contra ele.

Permanecem calados, por longos minutos.

Dana acaricia as feições de Mulder: sua face, seus olhos, seus lábios. Fecha os olhos, por fim. Franze o cenho.

Mulder nota que ela reflete sobre alguma coisa.

Ela retira o rosto que estava junto ao dele e volta-se para cima, deitada na cama.

Não dá para continuar o diálogo sem chorar. Dana entra num pranto silencioso. Seu peito tremula pelo choro.

Ela, com o seu olhar infinitamente azul, indagador, deseja penetrar na mente dele. Desejaria entender, pelo menos, um pouco o que ele está insinuando.

Mulder aproxima mais o rosto do dela e procura-lhe os lábios.

Provam-se, levemente.

Ele parece estar tocando pela primeira vez os lábios dela. Experimenta-os, várias vezes.

E ela apenas o retribui, com carinho, embora exista, entre ambos, um ar de preocupação.

"Preocupação é uma coisa que não deixa o que

ainda não aconteceu, sair de seu pensamento."

Mario Prata

Wanshipper@yahoo.com.br