UM MAL JUIZO
"Os olhos e o coração são muitas
vezes a causa do juízo das mulheres."
Meilhan
Capítulo 141
Mulder aperta os lábios. Olha-a de soslaio e coloca-a no chão.
Dana apoia-se numa parede, para ajudar os passos que tem que dar.
Ela o fita, fixamente. As narinas sob a pele fina e corada, movimentam-se, com a raiva que está sentindo.
Mulder coloca as mãos na cintura. Fita-a, apertando os olhos pequenos. Tem um leve sorriso nos lábios bem delineados.
Ele passa a mão nos cabelos e levanta a cabeça, olhando para o alto:
Dana recomeça a caminhar, com dificuldade.
Quer ajuda-la a caminhar, segurando-lhe um braço.
Eles defrontam-se.
Um olhando fixamente para o outro, como se quisessem atacar-se mutuamente.
Dana, na sua pequena estatura, ergue um pouco a cabeça, para defrontar-se com Mulder.
Num ímpeto, Mulder retoma Dana em seus braços longos e fortes e caminha rapidamente.
* * *
Dana está sentada, relaxadamente, na poltrona. Olhos fechados, lábios contraídos. Mãos apertadas uma contra a outra, pousadas em seu colo.
Mulder a observa de pé. Afastado dela.
Ela lança para ele um olhar flamejante.
Ele anda pelo quarto. Balançando as mãos.
Ela não responde. Pega o pé machucado e morde os lábios, denotando dor.
Mulder aproxima-se. Agacha-se junto dela, para tentar conversar com mais calma.
Ele levanta-se, incomodado.
Vai para a cama e joga-se sobre ela, transversalmente.
Está chateado. Não gosta quando há qualquer problema entre os dois.
Vem, então, à sua memória a época em que Dana sentia ciúmes de Diana Fowley. E recorda-se quando, num mal entendido, ao ser encontrado com a Detetive White numa cama, Dana o havia rejeitado por vários dias. Não lhe dirigira a palavra, a não ser a serviço, dentro do escritório. E isso já era uma demonstração clara de ciúme, que por sua vez seria ...amor!
Mulder sorri, ao lembrar as cenas.
Começa, também, a rememorar seus próprios sentimentos de ciúme quando encontrara Dana quase sendo beijada pelo cara que se fizera passar por ele... o cara que fazia as mulheres engravidarem e terem bebês com rabinho.
"Ah, que raiva! - exclama em pensamento - E quando ela esteve quase a fazer amor com o sujeito meu vizinho, que a assediava? O tal escritor...? Tenho certeza de que eu o mataria se..."
Mulder ergue-se da cama. Precisa ir até ela e explicar-lhe todo o seu sentimento por ela.
Aproxima-se de Dana. Debruça-se até falar-lhe bem próximo a seu rosto.
Mulder ergue o corpo, vai até um móvel, toma papel e caneta. Retorna até Dana.
Ele ensaia, com a caneta rabiscando o ar junto à folha de papel, mas sem tocá-la, antes de iniciar sua escrita. Pára. Pensa por alguns segundos. Começa, então:
"O amor é tão fugaz como o som, tão passageiro como a sombra, tão curto como o sonho, tão rápido como o relâmpago em noite escura, que bruscamente se descobre aos olhos do céu e a terra, e antes que se tenha tempo de dizer - olhai - desaparece no seio das trevas; tão certo é que tudo quanto brilha está próximo a dissipar-se."
Mulder conclui sua escrita sobre o papel.
Dana vai lendo, pouco a pouco, as linhas postas diante de sua vista.
Ao terminar a leitura das últimas palavras, ela dirige a Mulder o olhar azul e triste.
Ele não a olha, agora. Apenas a ouve falar.
Ele a abraça, com ternura. Sorri.
Alguns minutos de absoluto silêncio. Somente o ruído do motor da pequena geladeira no canto do quarto é ouvido.
Mulder torna-se sério.
Fitam-se um ao outro, intensamente.
Sustentam o olhar. Seus semblantes vão se descontraindo, pouco a pouco.
Súbito, ambos caem numa gostosa risada, divertidos com suas próprias idéias e pondo um fim àquela discórdia.
"A discórdia tem três inconvenientes:
o tédio, a impaciência e a perda de tempo."
Marco Aurelio