PRAZEROSOS SENTIMENTOS

"As mulheres conhecem sempre,

muito antes de nós, a natureza dos

sentimentos que em nós despertam."

Julio Dantas

Capítulo 166

Dana percebeu que ele estava com as mãos um pouco trêmulas. Fato anormal, já que seu parceiro sempre era muito seguro de si.

Ele colocou-lhe nas mãos o cartão.

Dana iniciou a leitura. Na segunda frase, levantou a vista para olhá-lo e sorriu. Quis falar.

Mulder a impediu de fazê-lo, segurando-lhe um braço.

Ela retornou à leitura do cartão, até o final. Deu um profundo suspiro, mantendo-o em suas mãos.

Nesse momento foi Dana quem se sentira trêmula por dentro. Já havia aprendido a amar aquele homem há muito tempo e percebia que, naquele momento, iria ter que pôr para fora seus sentimentos.

"Teria eu coragem para tanto? - pensou - Dentro de mim sinto arder o fogo da paixão, mas no meu exterior tenho que me manter ponderada, cautelosa... estudar bem o caso... pensar mais friamente..."

Ela deu uma risadinha, sem graça.

Ele continuava fitando-a, firmemente, com seus verdes olhos perscrutantes. Talvez esperando ver a reação de Dana e no íntimo pensando: "Será que ela vai dobrar o cartão?"

E quem sabe seria esse o seu desejo mais íntimo? Porém, no fundo conhecia bem o temperamento dessa mulher que estava à sua frente, linda, inteligente, determinada, culta, mas indecisa quanto ao amor.

Logo, ele parte para uma pergunta:

Dana segurou firme aquele olhar que a fascinava sempre.

A seguir, como que despertando, retornou as mãos ao volante, girou a chave na ignição e recomeçou a fazer o carro deslizar sobre o asfalto.

Dana endireitou-se no seu lugar, agitada, interiormente. Seu coração começou a palpitar forte. Sentiu-se quase afogueada, com a emoção. Guardou, imediatamente, o cartão no bolso do casaco. Sem dobrá-lo, é claro.

* * *

Dana escuta a voz de sua mãe falando carinhosamente com seu filho, lá fora.

Sente prazer. Felicidade. Paz. Realizada em sua vida de mulher.

As lembranças que haviam chegado à sua mente, lhe trouxeram esplendidos e prazerosos sentimentos.

Ela põe-se a relembrar que, a partir daquele instante, sua vida com Mulder passara a tomar um novo rumo.

Houve um certo estremecimento, no entanto, na sua grande amizade, quando Mulder não aceitara sua participação numa busca insana e perigosa, a qual o Canceroso havia engendrado malévolamente, para que Dana o seguisse, para assim, talvez, colocá-la num perigo bem maior do que o que lhe ocorrera naquela ocasião. E assim, por ela ter acreditado nas palavras daquele desalmado homem que era seu pai, Mulder não a havia perdoado em tal falha. E ela passara uma temporada sentindo-se mal com o desprezo dele.

Fôra, porém, uma breve temporada de ressentimento, porque após essa fase, tudo ficara maravilhosamente romântico, pois ela finalmente assumira sua posição de realmente apaixonada por Mulder, culminando com a ida dela até o seu apartamento, quando, enfim, ele a levara para a cama.

* * *

"Como é bom recordar! - pensa - Faz bem ao nosso coração relembrar coisas boas. Um fato passado triste não nos é grato. Só traz um dor, canseira, enfado de senti-lo."

Dana lê novamente a mensagem do pequeno cartão.

"Como adolescentes! Mas foi tão bom quando aconteceu isso! Como Mulder comentou, foi como se eu tivesse voltado à minha juventude, na realidade."

Ela abriu novamente, a caixa de madeira.

Lá estão mais dois cartões plastificados.

 

 

FBI

Special Agent

Fox Mulder

Signature

This is to certify that whose signature and photograph appear here on, is a regularly appointed special agent

of the FBI.

Dana pega o outro cartão e lê:

FBI

Special Agent

Dana Scully

Signature

This is to certify that whose signature and photograph

appear here on, is a regularly appointed special agent

of the FBI.

Os crachás, dela e de Mulder.

Dana suspira. Profundamente. Sente um pouco de tristeza invadir seu coração.

Aquele fôra o seu trabalho, o seu sustento, por muitos anos.

Terão, agora, que sobreviver dignamente; mesmo sabendo que têm, ambos, condições para viver sem problemas financeiros: o retorno ao passado a faz sentir-se um pouco chateada com a situação atual de não poder estar inteiramente independente financeiramente, nem despreocupada.

Ela resolve voltar a mexer nos objetos dentro da caixa.

Uma foto. Antiga. De alguns anos atrás.

Ela ainda usava cabelos curtos.

Mulder bem alto, junto à sua pequena estatura. Cabelos castanhos, cortados com costeletas, como gostava de usar.

E ela com a cabeça da altura do ombro dele.

Na foto Mulder a estava abraçando; havia aconchegado-a a seu peito. Ele usava camisa azul, de mangas compridas. Ele a havia vestido com seu próprio paletó acinzentado, da cor da calça que usava. Estava com uma gravata vermelha.

Dana afasta de seus olhos a foto na palma da mão, para examiná-la, mais detidamente.

Nesse momento ela sente um leve sopro sobre sua orelha. Volta-se imediatamente.

Mulder olha-os. Franze o cenho, com ar de preocupação. Nada comenta.

Dana sente-se quase arrependida por ter mostrado a ele os resquícios de uma parte de suas vidas, num trabalho difícil, duro, perigoso, mas que os permitia ter um dia-a-dia movimentado e repleto de horripilantes ou, por vezes, fascinantes situações.

Mulder é quem, agora, remexe a caixa contendo os pequenos objetos.

Uma fita cassete. No estojo plástico está escrito:

LOW NOISE OUTPUT A60

Reliable cassette mechanism

TDK IECI/TYPEI Normal Position

Normas Bias 120 us EQ

Ele abre esta caixa, que acondiciona a fita.

Vê uma relação de onze nomes de músicas, que estão colocados lado a lado, sobre a etiqueta. Ele os lê, um a um.

Ela olha onde ele aponta. Vê escrito o nome da música.

THE X-FILES THEME

"Há uma coisa mais aviltadora do

que o desprezo: é o esquecimento."

Camilo Castelo Branco