UM DIA SEM SOL
"Se choras porque perdestes o sol, as
lágrimas não te deixarão ver as estrelas."
Rabindranath Tagore
Capítulo 171
O tempo havia mudado rapidamente. No céu azul claro e luminoso, haviam se instalado nuvens pesadas e escuras. Logo o aguaceiro desaba.
Mulder, na varanda, aprecia a chuva caindo pesada e abundantemente sobre o gramado.
As árvores da rua, cujas flores lilás as enfeitavam, caem aos montes, agora, com o peso da água. A chuva encharca a grama, que se torna mais verde, estando molhada.
Dana, aconchegando nos braços o bebê, preparando-o para dormir o soninho do dia, conversa com Maggie.
Mulder está entrando no quarto.
Maggie interrompe.
Mulder sai do recinto e dirige-se para fora da casa. Na varanda retira os chinelos e sai, pisando o solo coberto de pedras de granito, entremeadas com a grama verde.
A chuva agora tornara-se menos densa.
Ele pega as ferramentas e, dentre elas, a tesoura de podar os galhos dos arbustos. Começa a sua tarefa.
Fica assim por alguns minutos. Em dado momento sua vista alcança a silhueta de alguém que se esgueira junto à cerca baixa e às árvores da casa em frente. No outro lado da rua.
O capote que a pessoa veste encobre-lhe quase todo o rosto. Usa um chapéu.
"É um cara do estilo antigo."- pensa Mulder.
Recomeça o que havia parado de fazer, cortando os ramos mais velhos dos arbustos.
Novamente sua visão enxerga o homem que move-se à frente da casa oposta.
Mulder franze o cenho, observando mais atentamente a figura desconhecida. Aperta o lábio inferior. Continua olhando. Ao ver o homem movimentar-se num certo ângulo, percebe que o mesmo é o que havia visto dias antes, mencionado pelo garoto vizinho, George.
A partir deste instante despreocupa-se. Não tem porquê imaginar que seria um malfeitor. Claro que tem que estar sempre atento, já que é um eterno perseguido, juntamente com a mulher que ama.
Mulder resolve continuar com mais afinco o serviço que se propusera fazer.
Agacha-se, para apanhar os diversos pedaços de ramos que já havia cortado e que estão no chão.
A chuva já havia cessado.
* * *
Com os pés sujos da terra molhada, Mulder penetra na varanda da parte de trás da casa.
Seus rastros vão sendo marcados no chão claro e limpo. Ele olha para a frente.
Dana, com os braços cruzados e sorrindo, está prestando atenção no pouco caso que Mulder faz de estar com os pés tão sujos, entrando na casa limpa.
Ela aproxima-se e lhe dá um beijo rápido na testa molhada. Em seguida um tapinha nas nádegas.
Ele dirige-se ao banheiro.
Toma um banho. Enxuga-se, veste um short e a camisa.
Diante do espelho, passa, rapidamente, o pente nos cabelos. Sai do banheiro.
Num segundo, sua vista detecta algo estranho que passara velozmente pela parede. Ele volta-se, rapidamente, tentando saber do que se trata. Nada vê.
"Acho que estou vendo coisas." - pensa.
Liga o rádio digital na mesinha de cabeceira, que emite notas que penetram suavemente no ambiente. Ele senta-se na beira da cama.
Novamente algo o faz dirigir o olhar para a parede, onde divisa uma espécie de sombra, quase uma silhueta que, rapidamente, se desfaz ante seu olhar.
Ele levanta-se, olha para um lado e outro, achando que alguém havia passado ao seu lado.
No mesmo momento a porta abre-se.
Ele nota e presta atenção.
Dana entra, procurando-o com o olhar.
Ele lhe faz um sinal para que se cale.
Dana entende e pára no lugar em que se encontra.
Ele aproxima-se da janela. Como o máximo cuidado para nenhum ruído fazer, destranca-a, girando o trinco.
Num segundo, abre as duas bandas da janela de madeira e venezianas. Coloca a cabeça para fora, procurando ver alguém.
Ele coloca o dedo sobre os lábios, para que ela se cale, ainda.
Inopinadamente, sai do quarto às pressas, indo para o lado de fora da casa.
Dana o acompanha, também a correr.
Encontra-o parado. Polegares presos à cintura. Lábios apertados.
Ele a fita, levantando o olhar, devagar.
Ela puxa-o pelo braço.
Ela o leva para dentro da varanda, caminhando devagar ao seu lado.
Dana sustenta o olhar dele. Coloca as mãos em seu peito forte, como para amparar-se a si própria.
Caminham para a sala. Sentam-se no sofá.
* * *
O céu de nuvens pesadas havia derramado abundante chuva o dia inteiro.
Mulder, sentado sobre um tapete com seu filhinho, diverte-se, apreciando-o a engatinhar, aceleradamente, em busca de quadrados coloridos, os quais vai entregando para seu pai, uma a um.
Mulder levanta-se e vai até a janela.
O ar fresco da tarde penetra no ambiente, no momento em que ele abre as bandas da janela.
Sua vista corre à volta da cerca branca e baixa que circunda a residência.
Tudo calmo na rua extremamente molhada.
O vasto gramado circundado de arbustos com flores, balançam ao sabor da brisa que sopra.
"Flores silvestres não se importam
com o lugar onde nascem."
Dolly Parton