UM INIMIGO

"É a nossa felicidade aparente que

nos cria maior número de inimigos."

Alexandre Dumas

Capítulo 172

Este estenda a vista por sobre o prolongamento da rua.

O menino toca em seu braço.

Mulder olha na direção que o menino aponta.

Mulder o observa, imaginando seu filho quando tiver a idade de George. Certamente vai lhe exigir comprar os mais intrincados e arriscados tipos de brinquedo, como todo menino.

Inopinadamente, o menino recomeça a sua corrida sobre o skate, deslizando na calçada. Afasta-se, rapidamente.

Mulder volta a entrar na casa.

A sala está vazia.

Ouve, mais distante, vindo do quarto de Maggie, os seus lamentos angustiados.

Mulder apressa o passo. Entra no quarto.

Dana está consolando sua mãe. Dirige para Mulder o olhar, ao vê-lo chegando.

Mulder está olhando-a, com o dedo indicador sob o nariz. Uma ruga surge-lhe na testa.

O choro alto de William ressoa na casa. Parece estar sendo molestado.

Dana corre, quase desesperada, em direção do quarto do menino.

Mulder a segue, em passos rápidos e Maggie o acompanha, ainda angustiada.

Ao penetrarem os dois últimos no recinto onde Dana se encontra, vêem-na parada, estupefata, olhando para o berço.

Mulder e Maggie também dirigem para ali seu olhar e deparam com a cena.

William dorme, placidamente. Perninhas dobradas, como é característico das criancinhas, braços voltados acima dos ombros, sobre o colchão. Em sono pacífico.

Dana abraça-se a Mulder.

Ele abraça-a fortemente. Mas afasta-se em seguida. Olha para um lado e outro.

Ele vai, rapidamente, seguindo o caminho pelo corredor.

O ruído de um vento uivante incomoda os seus ouvidos. Ele pára. Tenta localizar de qual janela está vindo a ventania. Corre para uma janela e a fecha, com ímpeto.

O zumbido sibilante continua. Mais forte.

Dana já está perto de Mulder.

Dana corre a fazer o que Mulder lhe pede.

O ruído sibilante continua. Aumenta, pouco a pouco.

Dana coloca as mãos tapando os ouvidos.

Corre para o quarto, onde estão sua mãe e seu filho.

Dana corre pelo corredor, aflita.

No segundo seguinte cessa, por completo, o estranho ruído.

Mulder e Dana fitam-se pasmos.

Mulder a segura pelo braço. Leva-a até uma das janelas. Abre-a.

Nem adianta prosseguir. Os passos pesados dele levam-no até a varanda, com rapidez.

Mulder observa a parte da frente da casa. Dirige-se rápido para o lado esquerdo. Vai percorrendo a parte de trás, onde não existe o gramado.

A noite já descera a esta hora.

As luzes dos postes da rua e do terreno da casa iluminam-lhe o caminho. Ele nada vê de anormal.

Súbito, uma dor lancinante na cabeça o faz tombar com tontura. Ele desaba no chão.

* * *

Dana, junto à janela do quarto, olhos vasculhando todo o terreno à volta da casa, responde, preocupada.

Ela não parece ouvir sua mãe.

Dana deixa o recinto. Anda pelo corredor, com cautela. Acende as luzes por onde passa. Já está muito escurecido dentro da casa.

Ela vai para a porta da rua. Observa à sua volta. Tudo calmo.

Não ouve resposta. Passo a passo, prossegue sua caminhada.

Numa das laterais da casa o poste de iluminação do terreno está apagado, ela nota. Caminha nessa direção.

Não dá para ver se tem algum ferimento, mas passando os dedos nele, sente o molhado do sangue saindo do corte num dos dedos dos pés, que estão apenas amparados pelos chinelos que ela calça.

Seus pés esbarram em algo que emite um ruído cristalino.

Automaticamente, seu cérebro capta o que havia acontecido. Olha para o alto do poste.

Mesmo com a ardência no dedo do pé, causada pelo ferimento, ela prossegue, caminhando em direção da parte de trás da casa.

Pára, novamente. O ferimento dói.

Ela sente frio, nessa noite de inverno.

"O inverno está sobre minha cabeça, mas

uma eterna primavera vive em meu coração."

Victor Hugo

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