DESCONFIANÇA

"A desconfiança é a mãe da segurança."

Mlle. De Scuderi

Capítulo 174

Dana abre os olhos. O sono conseguira vencê-la e ela adormecera, quase sem querer, pela tensão em que se encontra.

Num relance vem à sua mente o acidente sofrido por Mulder, na noite anterior..

"Mulder"- pensa, virando-se para vê-lo ao seu lado. Mas ele ali não está.

Ela levanta-se e vai ao banheiro, achando que lá irá encontrá-lo.

Veste, rapidamente, o seu pesado casaco que está sobre uma cadeira e sai à procura dele, usando sua percepção de que o homem que ama é sempre impulsivo, não aceitando deixar nada para depois.

Olha em todos os compartimentos da casa. Até no quarto de William ela chega. Está tudo bem, ali. Maggie dorme num sofá, perto do berço da criança.

Dana lembra de quando, ainda em Georgetown, dormia junto ao berço de seu filho, ao ficar sozinha, na ausência de Mulder, numa época de terríveis lembranças.

Ela sai do quarto.

Pelos outros lugares da casa Mulder também não está. É o que seu subconsciente já previra.

A porta de saída de trás da casa está aberta.

Ela vai para fora da casa, também.

Dana segue a direção da voz dele. Vê o facho de luz da lanterna, que está voltado para os seus próprios pés.

Ela abaixa-se e constata serem verdadeiras as palavras dele.

Ele nada fala. Prossegue, ainda, sua pesquisa, buscando algo sobre as pedras ou o gramado. Vai abaixando-se para apanhar do chão qualquer coisa que lhe chame a atenção.

Dana suspira, profundamente. No seu íntimo sabe que ele não desistirá. Decide apenas acompanhá-lo no seu objetivo.

Em dado momento ele pára, enverga bem o corpo para trás, demonstrando cansaço pela posição que usara, voltado para a direção do solo.

Ele é que solta um longo suspiro agora.

Toma-a pela mão e dirigem-se para a casa.

Entram. Logo ele tranca a porta e vão na direção do quarto de William.

Seu filho e Maggie estão em sono tranquilo.

O casal sai dali, aliviado por vê-los tão serenos. Vão para a cozinha.

Ele senta-se. Com os cotovelos apoiados à mesa. Segurando o queixo.

Mulder levanta-se.

Ele sai da cozinha. Dirige-se à sala.

Dana detém-se a observar o borbulhar da água fervendo na cafeteira ligada. Está apanhando no armário o açucareiro, quando ouve o barulho de algo caindo, onde Mulder se encontra.

Corre até a sala, para ver.

Uma cadeira está virada, caída no chão.

Mulder está de pé, voltado para uma das paredes, estático.

Em seguida sua vista fixa a superfície da parede de cor clara, em frente a ele.

Uma mancha vermelha, vinda do teto, escorre lentamente, até atingir o rodapé, onde se espalha, em abundante poça no piso.

Mulder observa, atentamente, esse acontecimento de horrível visão.

Chega bem perto da superfície da parede.

Mulder aproxima-se mais. Encosta a ponta do dedo médio na estranha mancha escorrida; leva-a suja com a substância vermelha até o nariz e a cheira; em seguida leva-a à boca, provando-a.

Um ruído do lado de fora chama a atenção de Mulder. Ele chega até a janela, abrindo-a, vagarosamente. Examina o ambiente que circunda a casa. Com toda a cautela aproxima-se da porta de saída. Abre-a e, num ímpeto, sai correndo pelo piso de pedras da frente da casa.

Na calçada oposta, um vulto, ao sentir-se perseguido, sai em desabalada carreira, para livrar-se de seu perseguidor.

Dana sai no encalço de Mulder, também.

Maggie, nervosa, vai direto para o quarto onde está seu neto. Tranca a porta por dentro e fica junto ao berço, olhando aflita e chorosa o garotinho, que está dormindo.

Do lado de fora, um vento frio está fazendo gelar até a alma. Os galhos dos arvoredos curvam-se diante daquele fenômeno da natureza.

Folhas são levadas em roldão à ação da ventania.

Mulder continua sua perseguição àquela figura que estivera, minutos antes, em frente à sua casa. A corrida é incansável.

Em dado momento os passos de Mulder são tolhidos por um objeto que vem atravessar seu caminho, embaraçando-lhe os pés.

O homem a quem ele está perseguindo havia atirado em sua direção a tampa de uma lata de lixo, com intuito de impedir sua corrida contra ele.

Mulder, num gesto rápido, dá um pulo sobre o objeto de flandres, conseguindo, dessa forma, prosseguir em seu caminho à caça do inimigo.

Mulder atira para o ar, a fim de intimidar o homem a quem persegue.

Este pára por somente alguns segundos. Reinicia, então, em seguida, sua correria.

E Mulder, não vendo resultado no disparo dado para o ar, recomeça, também

a correr.

As inúmeras sombras projetadas na rua, possibilitam ao homem perseguido perder-se da vista do ex-agente.

Dana, no encalço de Mulder, continua correndo, acompanhando o mesmo objetivo que o dele. Ela agora consegue aproximar-se dele, que havia parado.

Dana fecha os olhos, chateada por Mulder haver perdido a chance de agarrar o sujeito e ver de quem se trata, mas também aliviada por sabe-lo inteiro, sem nenhum perigo de vida.

Mulder a segura pelo braço.

Os dois retornam seus passos, com o olhar atento na calçada, por onde vieram, anteriormente.

E continuam o caminho de volta.

Mulder chega perto dela. Toma o objeto de suas mãos e aproximam-se os dois do poste de iluminação.

Imediatamente, o pensamento dele vai para as palavras do garotinho vizinho:

"Aquele homem da rua tem um telefone celular. Minha mãe diz que ele odeia as pessoas."

Mulder passa o braço à volta dos seus ombros, fazendo-a caminhar junto a ele.

Voltam, em passos rápidos, atravessando as quatro quadras que haviam percorrido minutos atrás, em perseguição ao malfeitor.

Chegam, enfim, ao jardim da casa onde moram.

Mulder estaca sob a luz da varanda; examina o objeto em sua mão. Franze a testa. Aperta os lábios.

"O homem pensa e só por isso ele é

o senhor dos seres que não pensam."

Buffon