"Uma mulher sem pudor é
como uma rosa sem perfume."
Beauchéne
Capítulo 188
Mulder, sendo acariciado pelas mãos sensíveis de Dana, deixa-se ficar entregue a essas gostosas sensações.
Dana percebe que alguma coisa está no ar, pois enquanto Mulder está a seu lado, ali recebendo seus carinhos, demonstra na fisionomia uma preocupação.
- Fala logo, Mulder.
- Falar o quê, lindinha?
- O que está aí nessa sua cachola.
Ele sorri.
- Curiosa...!
- Ah, Mulder, não está vendo logo que eu sei que você saiu? E muito cedo até! Foi até onde?
- Fazer uma pesquisa.
- Sobre as...?
- ... abelhas.
Dana joga-se na cama, com ar enfadado.
Mulder a olha. Faz um bico com os lábios, juntando-os, como que a reprovar o gesto dela. Levanta-se.
Busca no bolso do casaco o frasco que havia trazido da casa do cientista. Volta para a cama. Sustenta o pequeno frasco diante dos olhos de Dana.
Ela franze o cenho, perturbada.
- Mulder... isto é...?
- Exato. Espera aí. - levanta-se, novamente, para ir até onde está o casaco. - Olha com esta lupa.
Dana examina o inseto.
- Oooooh, não! Não acredito!
Mulder tem um ar satisfeito. Ergue bem o tórax, coloca os polegares na cintura. Aprecia, com gosto, Dana estupefata, examinando o inseto dentro do vidro.
- Scully, até quando você vai duvidar das coisas que lhe falo?
- Eu já disse, Mulder, que há já algum tempo, eu acredito em tudo que você acredita! - fala, sem tirar os olhos atentos do frasco à sua frente.
Ela levanta-se, rapidamente.
- Como é possível um sujeito dedicar-se a estragar a vida dos outros, Mulder? E por quê?
- É uma incógnita, Scully. Nunca se sabe os motivos que causam essas coisas. - ele puxa-a por um braço para junto de si - Vem cá, Scully. Olha só. Quero contar o que descobri mais.
Ela faz um meneio, concordando.
- Aquele homem idoso, que parece inofensivo, é extremamente ardiloso. Vi lá no laboratório dele essas abelhas...
- Você conseguiu chegar lá?
- Claro! Como você acha que consegui trazer essa abelha? Tem um montão lá!
- O quê?!
- É verdade! E tem mais! Ele usa essências, para que as abelhas sejam atraídas para as pessoas.
- Essências... - ela murmura, pensativa, usando a memória; coloca a mão nos lábios, com ar preocupado - ... essências! - faz um gesto rápido - Mulder, sim, tem razão! Essências!
- Por que a surpresa?
- Ora, ora veja só. No dia em que esteve aqui, o Mitchell entregou à minha mãe dois vidros de essência... aliás, um delicioso perfume de flores e explicou a ela sobre o poder que as mesmas tem de curar certos males.
- Scully!! Foi por isso que...
- ... que o quê?
- Espera. O nosso filho foi fotografado.
- Fotografado? Quando, Mulder?
- O George, nosso amiguinho vizinho, viu a foto dele no jornal, com um brinquedo... e nós...
- Nós o quê?
- Nós dois também saímos numa foto, Scully.
- Como?! Você viu?
- Sim. Tem um jornal desse aqui em casa. Eu te mostro. Só não entendo uma coisa: por que William atraiu as abelhas? Vocês o perfumaram com a tal essência?
- Não. Ele, num dia, derramou o vidro que estava com minha mãe
- Sobre o corpo dele?
- Exato. Foi... espera, Mulder! Foi naquele dia em que você viu uma abelha perto dele e você a perseguiu. Lembra-se?
- Claro. Scully, esse sujeito tem invenções fabulosas.
- Como assim?
- Deixa eu explicar. No laboratório dele há uma espécie de controle remoto posicionado numa das altas janelas da casa. E dali, ele controla, mais ou menos, os seus insetos para as micro câmeras captarem as imagens.
- E ele faz acionar daquele local, para a foto que a micro câmera está mostrando onde a abelha estiver pousada... fantástico, Mulder!
- Sim. Espera para ouvir mais. Muitas, uma infinidade de fotos reveladas estão perdidas, jogadas numa lixeira, demonstram que ele gasta um baita de um material para aproveitar, talvez, às vezes, uma ou duas fotos.
- São fotos captadas à esmo?
- Hum, hum. - confirma.
- É um louco cheio do dinheiro!
- Sem nenhuma dúvida.
Dana olha, novamente, o inseto através da transparência do frasco.
- Mulder...?
- O que é?
- Eu quero ver a foto.
- Tá. Eu te mostro.
Ele sai, em passos rápidos. Em questão de segundos, está de volta. Desfolha o jornal na página que deseja mostrar.
- Aqui está, Scully. Você é bem fotogênica.
Dana toma o jornal nas mãos, curiosa.
- Mas... o que é isso?! Oh, meu Deus, num momento tão...
- Já viu a legenda?
Dana lê. Fecha os olhos e nada fala. A raiva pelo que está vendo, mexe com seu ser, sentindo-se ferida em seu pudor.
- É um cretino! - comenta, após segundos, entre dentes.
Com o jornal nas mãos ela senta-se, vagarosamente, na beira da cama.
- Sujeito cretino! - repete, murmurando - Mulder...
- Fala.
- O que você pretende fazer?
- O óbvio.
- Entregá-lo às mãos dos moradores, claro que preservando-lhe a vida, naturalmente.
- Devo recomendá-los procurarem a Polícia.
A noite nas redondezas está escura, sem lua, nem estrelas, que possam clarear o céu.
O alvoroço nas casas do local deixa Maggie curiosa do que possa estar acontecendo entre os vizinhos.
O burburinho e a agitação demonstram a animosidade que paira no ar, contra o incrível Mitchell.
Grupos de pessoas discutem entre si a situação, cada qual mostrando sua queixa quanto ao fato de Mitchell ter se valido de sua privacidade para divertir os outros do bairro e a si mesmo.
Maggie, encontrando-se só em casa, resolve ir até onde está a maioria das pessoas, para ver o que vai surgir dali em diante. Afinal de contas, sua filha e seu genro haviam sido os descobridores de toda a trama que o cientista usara para prejudicar os moradores daquele bairro. E a inteligência e audácia dos dois ex-agentes do FBI havia desbaratado toda a diabólica mania do estranho vizinho.
Em dado momento, porém, Maggie atemoriza-se com o tumulto que aumenta entre a vizinhança.
Ela vê a figura de Mitchell, com as pernas um tanto trôpegas pela idade, a correr, esbaforido, procurando ficar longe do alcance dos homens e mulheres que o intimidam nesse momento.
A turba ameaçadora, munida de lanternas, brandindo pedaços de pau e pedras, persegue Mitchell, sem cessar, a gritar:
- Peguem ele!!
- Safado!!
- Mata!!
- Miserável!!
O homem encontra forças para conseguir chegar até sua casa, onde penetra, justamente, na mesma porta secreta, a qual dá acesso a um porão, por onde Mulder e Scully haviam entrado dias antes.
A multidão irada, continua em sua perseguição, sem, no entanto, perceber que Mitchell já encontrara refúgio naquela parte abandonada da sua casa.
"A ira é uma demência de pouca duração."
Sêneca