Manhã nublada. Uma névoa esfumaçante cobre os perfís das montanhas. Não há bando de pássaros cortando o ar. Nem o vento a movimentar as folhas das árvores na rua. A natureza está imóvel.

Mulder, apoiado sobre o parapeito da sacada avarandada, tem o seu verde olhar fixo na faixa do mar que ao longe pode avistar.

Mar azul. Calmo. Que lhe transmite paz. A leve brisa que sopra em seu rosto, lhe faz sentir prazer. E seus pensamentos divagam.

"Estou, afinal, muito longe da minha terra. Que coisa triste! Fugindo, tentando sobreviver com minha família... minha família... que está aumentando... Scully, a minha amada, já me deu dois filhos. Estou feliz e ao mesmo tempo... preocupado... - ele muda a direção do olhar para os veículos que passam lá em baixo, no asfalto - ... preocupado porque vejo a necessidade da minha família ter paz e segurança... nós precisamos! Minha família... minha família... eu tenho uma família... que necessita ser regularizada, segundo as leis. Eu tenho que conversar sobre isso com Scully... acho que é chegada a hora."

Neste momento sente seu tórax envolvido por braços quentes e suaves.

• Pensando, Mulder?

Ele a faz ficar diante dele, para olhá-la, fixamente.

• Pensando em soluções para um assunto sério. - faz uma pausa - Acordou cedo!
• Não. Seis horas é uma boa hora para levantar. Estou dormindo muito bem ultimamente e só acordo na madrugada, quando sinto sua perna sobre meu corpo. - ela o beija no peito nú, sorrindo.
• E chego a machucar você?
• Claro que não! Nem se preocupe! É gostoso sentir isso.

Ele ri, gostosamente.

• Clima interessante, hein Scully? - olha para fora - Amanhece desse jeito, como se uma forte tempestade estivesse prestes a cair e depois aparece o olho do sol, mostrando que veio pra ficar quente e brilhante sobre tudo.
• É assim o Rio de Janeiro.
• Scully... como você está hoje?
• Melhor do que ontem.
• Verdade? - acaricia-lhe os cabelos - Scully... tenho pensado muito em algo necessário e de extrema seriedade.
• Necessário? O quê?
• Algo que deve logo passar a ser projeto de um cara que já tem uma família, como eu.
• Não estou entendendo, Mulder...

Ele a olha profundamente.

• Scully, eu estou querendo lhe dizer que é o meu maior desejo regularizar nossa situação.
• Ahn... como assim?
• Fazendo o que deve ser feito. Precisamos nos casar, Scully.

Dana apenas cobre os olhos e levanta as sobrancelhas, com ar surpreso. Leva as mãos faces, em seguida.

• Ooooh, Mulder...! - exclama, num murmúrio - Eu não sei...
• O que você não sabe...?!
• Devemos pensar... analisar racionalmente.

Ele a segura, apertando-a em seus braços.

• Ah, Dana... você sempre querendo impor a sua formação circunspecta!

Ela afasta-se dele para encará-lo.

• É realmente isso que você quer? - pergunta.
• Não tenha a menor dúvida, desde que você me ame e deseje compartilhar comigo o futuro de nossos filhos.

Dana sorri para Mulder, sem abrir os lábios.

É uma decisão série e está convicta de que se amam e têm que decidir que seus filhos devem ter segurança familiar em seu desenvolvimento. Para um futuro melhor.

Dana, arruma, uma por uma, dobrando as roupinhas de William, colocando-as numa cômoda. Leva-as até às narinas, sentindo-as perfumadas. Sorri, levemente.

Coloca-as ordenadamente na gaveta. Afasta-se até a janela.

Com o olhar perdido no espaço azul do céu, como seus olhos, parece refletir em seu semblante algo que a entristece.

Mulder, chegando neste momento, a vê desse jeito, divagando.

Ele detém os passos e fica a observar. Logo percebe, na fisionomia de Dana uma nuvem de tristeza a toldar-lhe as expressão.

E ela permanece com o olhar fixo no horizonte, além do cimo das montanhas escuras. Uma lágrima desce, vagarosamente, pela sua face tristonha.

Seus pensamentos estão voltados para a ocasião em que estivera num hospital, certa vez. Lá estava, inerte naquela cama fria, sua pequena Emily; filha gerada de uma forma artificial, mas havia sido retirada de suas entranhas.

Que cena triste olhá-la naquele leito, sendo devorada pela doença e ela, sua mãe, nada pudera fazer para salvá-la. Hoje poderia ter três filhos...

• Dana...?

Ela desperta de seus pensamentos.

Mulder está ao lado, fitando-a com amor demonstrado em seu verde olhar.

• Sei em que está pensando. - ele fala.

Ela o fita, atônita. Seus lábios distendem-se num leve sorriso.

• Ah, Mulder, pelo amor de Deus! Eu não estou pensando nada...!

Ele segura-a pela cintura e a faz voltar-se para sua direção.

• Emily. - fala, sem mais subterfúgios.
• Mulder... como pode saber...?!
• Simples. Você tem um importante motivo para se alegrar. No entanto, parada aí, pensativa, fico observando e acho que seus pensamentos voltaram-se para sua Emily.

Ela anui; aperta as mãos.

Mulder desliza, mansamente, a mão sobre seu ventre.

Dana sorri, entre as lágrimas.

• Vamos pensar no que está pra vir, lindinha... eu... fico pensando é em tomar outra atitude ... pelo menos após alguns dias mais aqui.
• Sim...?
• Deixar esta cidade... porque realmente não dá pra ficarmos aqui; precisamos retornar.
• Retornar? Para onde, Mulder?
• Nosso país, é claro!
• Nãaaao!! Como pode querer isso, Mulder? Não agora!

Ele faz um ar impaciente, dá as costas e afasta-se, passando as mãos sobre os cabelos. Na verdade, nem sabe convencer sua mulher do que deseja realizar. Como poderia resolver as coisas pendentes de sua vida e de sua família? Tudo muito difícil, realmente!

Não pode possuir uma residência fixa; impossível ter um modo de passar sua vida num trabalho. Está ciente de que a parte financeira está segura, visto que a venda das casas de seus pais, o havia deixado financeiramente acomodado. Pelo menos isso.

Mas tem a necessidade usar o tempo disponível em algo proveitoso. Não sabe bem por onde iniciar tudo o que deseja. Porém, quer queira, quer não, algo ele tem que fazer. O futuro de seus filhos está em jogo. E ele e Dana não têm que deixar-se levar pelo temor, já que tudo na vida é incessantemente perigoso e complicado; a conquista na vida é tomada por um grande esforço; significa enfrentar sempre uma batalha constante; tanto física como espiritual.

E Mulder, cita em seu pensamento, uma frase otimista, que ouvira há algum tempo atrás: