ATITUDE DE DESCONFIANÇA
"Não há nada mais fácil do que semear
a desconfiança num coração que ama."
Mme. de Ceulanges
Capítulo 206
A mulher estuda, calmamente, cada gesto de Mulder.
Este havia transposto a entrada do camarote, um tanto indeciso.
"O que estou fazendo aqui? E por que aceitei o convite dessa mulher? Por que não reagi? O que Scully irá pensar?"
Sua mente debate-se em perguntas, sem dar-lhe um entendimento correto do seu procedimento nesse instante.
Maureen chega-se a ele. Calmamente retira-lhe o pesado casaco. Parte do peito desnudo dele aparece. E ela o acaricia com os lábios.
Mulder aperta o lábio inferior. Sente-se numa dupla sensação de repulsa e atração. Ao mesmo tempo que a mulher o atrai, é seu desejo sair dali o quanto antes.
Ele não responde. Responder o quê? Sua mente está confusa. Nem sabe bem o que deseja. Num impulso final nos pensamentos, resolve perguntar.
Maureen dá uma risada, divertida com suas dúvidas.
Ela dá uma volta ao redor do pequeno recinto. Pára e aproxima-se novamente dele.
Ela faz um muxoxo.
Ela dirige-se rapidamente para a porta trancada. Apoia-se de costas nela, enquanto enfrenta o olhar aborrecido do ex-agente.
Ele reage, por sua vez.
Novamente a forte dor o incomoda.
Maureen desencosta-se da porta. Encaminha-o para o ambiente contíguo, que tem uma cama. Deita-o, cuidadosamente. Começa a tocar os dedos em sua testa.
Como por encanto, Mulder sente que a dor havia sumido.
A mulher beija-o numa das faces. Depois beija-o na testa. Desliza os lábios para alcançar sua boca.
Um forte barulho de alguém batendo à porta, se ouve nesse momento.
Maureen, num pulo, sai da cama.
Mulder levanta-se. Sente-se um pouco tonto.
A mulher mostra um semblante aborrecido, mas resolve ver quem está batendo na porta e atrapalhando-a em seus projetos românticos.
Mulder está encostado na lateral de um armário, que o esconde. Observa os dois.
Maureen penetra no lado oposto do recinto, para pegar uma bolsa.
Mulder, aproveitando esse lance, aproxima-se da porta, e, fazendo um gesto amigável para o rapaz, sai, afastando-se, rapidamente.
* * *
Maggie olha para a filha, intrigada. Há tempos não a vê tão entristecida.
A filha, sentada à sua frente, dedos dobrados sobre a boca, cujo braço apoia-se no colo, está com o olhar distante. Ouve a mãe chamá-la e a fita, sem mover-se de sua posição.
Dana sai e dirige-se à porta ao lado. Abre-a e entra. Percebe que Mulder já havia retornado. Seu casaco está sobre uma pequena mesa.
Ela vai para o quarto.
Ele está deitado, todo embrulhado no cobertor. A luz está apagada.
Dana aproxima-se para olhá-lo.
Dana vai até uma bolsa para tirar dela um comprimido. E o traz com um copo d'água.
Mulder senta-se e pega o comprimido na palma da mão. Observa-o detidamente. Minuciosamente. Acende o abajur na cabeceira da cama. Examina mais atentamente o remédio em sua mão.
"E por que motivo isso? Acaso ele pensa que eu seria capaz de envenená-lo?" - pensa e interiormente ri, com esses pensamentos tão tétricos.
Ele resolve engolir o comprimido. Faz isso e deita-se na cama, novamente. Enrola-se completamente no grosso cobertor. Ajeita-se, enfiando o rosto no travesseiro.
Dana senta-se ao lado, na beira da cama. Coloca a mão, levemente, sobre sua testa. Quer ajudá-lo para que passe a dor, com um gesto de carinho.
Mas como ele sempre usara falar frases sarcásticas, fica na espreita, observando se ele irá reparar a brincadeira de mau gosto que acabara de fazer.
Porém Mulder permanece calado. O rosto enfiado no travesseiro.
Dana levanta-se da cama. Dirige-se ao banheiro, para mudar a roupa. Após isso sai e olha para Mulder deitado. Vê que o cobertor de casal está inteiramente sob seu corpo. Ela vai até um armário, para tirar dele um outro cobertor.
Deita-se. Nota que Mulder está voltado para o lado oposto de onde ela está, deitado sobre a lateral do corpo, o mais afastado possível dela .
Ela nota, também, frustrada, esse detalhe. Garante para si mesma que, a partir deste momento, não irá mais mendigar o amor dele. Ele não tem o direito de tratá-la dessa maneira. E ela, por sua vez, tem todo o direito de ser respeitada em sua dignidade de mulher honesta, decente e fiel.
"A restituição do respeito é muito
mais dificultosa que a do dinheiro."
Antonio Vieira