EM DESESPERO
"O desespero é o maior de todos os erros."
Vauvernagues
Capítulo 212
A noite chegara e com ela o frio enregelante do inverno. A neve cai, ininterrruptamente, sobre toda a cidade. Nas janelas da casa, através da vidraça, a queda da neve pode ser vista como pequeninos flocos de alvíssima espuma, que, vez em quando são levados pelo vento.
A mãe de Dana, com ar preocupado, agasalhando ao máximo seu neto, está ligando o aquecedor do aposento; olha para sua filha, que está caminhando em passos ligeiros e firmes pelo corredor.
"Há muitos dias que Dana só fala com a gente aqui em casa o essencial e com muito má vontade de responder a qualquer pergunta que lhe façamos. - pensa Maggie - Meu Deus, o que será que está acontecendo com ela? Como poderei convencê-la de que deve ir ao médico? Já fiz de tudo, sem conseguir nada! É como se minhas palavras nem fossem ouvidas por ela! E o coitado do Fox, que ela está desprezando totalmente? Não sei mais o que fazer. Não tenho ninguém que me ajude, pois até o meu filho Bill, que está mais próximo de nós e poderia ajudar, está completamente a favor desse ato louco de Dana! O que devo, então, fazer? O quê? Como agir?"
Enquanto faz a si mesma tantas perguntas e vendo a filha passar novamente, surpreende-se ao perceber que ela está vestida para sair.
"Sair com esse tempo? - pensa Maggie - E para onde?"
Rapidamente aproxima-se da filha, que já está junto à porta da frente.
Dana a fita; sem expressão alguma na face. Aperta então os lábios, num bico. Vira-se para sair.
Dana simplesmente faz um sinal com a mão, indicando que dispensa seus cuidados de mãe.
Maggie chega junto dela e a segura com força.
Dana olha para sua mãe. Agora o seu olhar, de frio passa para uma expressão de ódio e desprezo.
Maggie, ao enfrentar esse estranho modo de sua filha, sente um arrepio de temor.
Com esse último gesto, a filha puxa fortemente o braço que estava seguro por sua mãe. Sai, em seguida, sem olhar para trás.
Maggie está atônita. Vira algo diferente em sua amada filha. Em desespero, o medo começa a tomar conta de seu ser.
"Meu Deus! A minha filha está doente! E talvez seja grave!"
Assim pensando, aflita, toma o telefone. Vai ligar para Mulder, dizendo o que havia notado em Dana. Tem certeza de que ele, com seu bom caráter, mesmo sendo desprezado pela mulher que ama, fará de tudo para ajudá-la a curar-se.
William a faz correr para o quarto, com seu choro convulsivo.
O menino, sentado na cama, chora, num pranto contínuo.
Ao segurá-lo pelos braços, percebe, aterrorizada, que uma alta febre está tomando conta do pequeno corpo do garoto.
O garotinho coloca a mão na testa.
Maggie, como uma desvairada, mas tentando não entrar em pânico, corre a buscar um frasco com analgésico líquido.
* * *
Mulder, sentado à mesa de um restaurante, tem o cotovelo sobre a mesa. Um dedo cobrindo os lábios. Pensativo.
Sua mente divaga, incessantemente. Procura, por todos os meios, entender, o que, realmente, está acontecendo com a sua Scully. Rememora, neste instante, uma cena de sua vida passada há vários anos atrás...
* * *
Aquele escritor que Mulder havia levado à prisão, agora fora liberado por ser apenas suspeito, sem provas.
O homem agradeceu e ia saindo.
Parou, porém e falou, sem voltar-se para Mulder e Scully.
O homem voltou-se para os dois Agentes.
Mulder e Scully viram-no sair, porém não se olharam, como habitualmente o faziam. Havia uma certa inibição da parte de cada um, ao ouvir as palavras proferidas pelo escritor.
Afastaram-se do local. Ela caminhava sem nada falar. Ele fazia o mesmo. Ambos sem coragem de iniciar um diálogo.
Em dado momento Mulder parara seus passos, ficando para trás.
Dana continuava a alguns passos adiante dele.
Ela estacou. Voltou-se para olhá-lo.
Recomeçaram a caminhar lado a lado, vagarosamente.
Pararam, novamente. Olharam-se, profundamente.
Dana segurou, firmemente, por alguns segundos o perscrutante olhar de Mulder, que continuava aguardando a esperada resposta. Logo, porém, ela desviou o olhar daquele ardente dele que a atraia, a possuía, quase...
O casal de Agentes voltou-se para ver quem estava falando com eles.
Dana, animada com a providencial interrupção, aceitou a carona do amigo, que estava em companhia de Langly.
Num segundo ela correu para o carro, despedindo-se ligeiramente de seu parceiro.
* * *
Após relembrar essas cenas, Mulder pensa:
"Se ela, realmente, já gostava de mim naquela época, esse sentimento se fortaleceu quando do desejo de ter um filho... e aconteceu gerarmos um filho e depois... depois fui levado à morte... e ela dizia ter sofrido muito com a minha ausência... mas será mesmo? Scully traz à tona com facilidade lágrimas por qualquer motivo um pouco mais emocionante... seria pura hipocrisia... fingindo um amor que nunca existiu? Ou será que ela não aceita ter sua vida ligada à minha para sempre com um casamento? Talvez seja por eu ter lhe falado em casarmos, que ela entrou em pânico e está fazendo tudo para demonstrar que nossa união não é tão importante, a ponto de chegarmos a uma ligação sob a luz da justiça. A senhora Scully acha que ela está doente, porém não é esse o caso; a doença dela é na mente e Scully é muito racional, segura de si, para fingir algum sentimento... - ele pára por segundos os pensamentos - ... mas o que é isso? Eu estou me contradizendo... desmentindo as minhas próprias palavras ao dizer isso?"
Mulder levanta-se, inopinadamente, quase levando ao chão a cadeira na qual estivera sentado.
O garçom, trazendo a bandeja com bules e xícara, só tem tempo de ver seu quase freguês afastar-se, sem nada mais esperar.
Fica parado, atônito, com os utensílios nas mãos, sem ação.
* * *
Maggie, ainda um pouco alarmada, nota com um certo alívio, que a febre de William havia cedido um pouco.
O garotinho, sem sua esperteza habitual, mantém os olhinhos tristes e ansiosos na direção da avó, deitado em sua cama, sem desejo de dali sair, para brincar.
William recomeça a chorar.
Maggie, junto dele, faz tudo para consolá-lo, porém o menino continua chorando.
Maggie o nina no colo, carinhosamente. Seus olhos estão cheios de lágrimas. Não sabe como fazer para contornar a situação. William não pára de chorar baixinho.
Mas ela insiste em tentar faze-lo parar e dormir um pouco.
Olha o relógio sobre o móvel. Dezoito horas e quarenta minutos. O pânico instala-se em seu interior.
Após longos trinta minutos, percebe que o menino já começa a adormecer. Aguarda que o sono instale-se logo na criança. Precisa fazer alguma coisa. Ajeita-o na cama. Cobre-o com ternura.
A passos rápidos vai ao telefone. O chamado de sua ligação é insistente e prolongado. Quando já está tensa, quase a desistir, ouve a voz de Mulder, do outro lado do fio.
"Aflições tornam o sangue em tinta e,
escrevendo, começamos nossa eternidade."
Henry Vaughan