A CARNE É FRACA
“Somos feitos de
carne, mas temos
que viver como se fossemos de ferro.”
Sigmund Freud
Capítulo
228
Dana,
sentindo suas carnes vibrarem ao contato do corpo dele, percebe que quase
desmaia de prazer.
-
Vamos
embora logo daqui o quanto antes...! –
pede, em voz murmurante.
-
Fala
sério? Pra onde?
-
Ah,
pára com isso! Quer fazer o favor de não brincar com as minhas palavras? Quero
ir embora!
-
E eu
ouvi! Mas... mas...
-
Mas
o quê? Qual é a dúvida?
-
A
dúvida? Não... nenhuma... apenas... as crianças... como ficarão?
-
As
crianças? Elas ... aliás elas não... ela... porque é apenas uma criança... a
outra ainda está aqui... guardadinha...!
-
Ah,
você sempre com suas loucuras! Mas é assim que eu te quero! De qualquer
jeito... te amo!
-
Arre!
Sabe que às vezes você me deixa confusa, com essas suas respostas vacilantes?
Ele a
toma nos braços, carregando-a como a uma boneca.
-
O
que vai fazer? – ela pergunta.
Ele não
responde. Encaminha-se para um grande sofá e coloca-a deitada ali.
-
Não...
não podemos ficar tão à vontade! Logo vão nos procurar! – protesta ela.
-
Temos
que aproveitar a oportunidade.
-
Não...! Temos que deixar pra outra hora...! – pede, tentando não sucumbir à boca ansiosa
que lhe acaricia avidamente o colo alvo –
Espera...!
Porém
ele, num gesto rápido, vai até a porta e verifica se está trancada, voltando
até onde Dana está.
-
Meu
Deus, você está impossível! – ela sussurra e deixa-se acariciar.
E ele
toca com os lábios em seu rosto e vai
descendo por todo o seu frágil corpo, enquanto as mãos enchem-na de carícias de
avassalador desejo.
-
Sei
que não é... um momento apropriado... para nossos anseios, mas... – ele murmura
afogueado.
-
Me
beija! – ela pede, ardendo de paixão.
* * *
O homem
gordo sente-se cansado. Havia subido e descido escadas naquele labirinto e não
conseguira encontrar sua noiva.
Bufando
e arquejando, chega agora até uma grande sala, onde vários equipamentos estão
instalados. Há muitas pessoas ali dentro. Ele dirige-se a uma delas.
-
Sabe
me dizer onde está a Gillian?
O outro
o olha, sem interesse, manipulando diversos pequenos aparelhos que estão à sua
frente.
-
Desculpe,
não tenho idéia.
-
Mas
não são várias salas aqui?
-
Sim,
mas estamos em gravação neste momento e as pessoas não podem ter acesso a
qualquer uma delas. Desculpe. – diz isso, afastando-se.
O
grotesco indivíduo, irritado, dá meia volta nos passos e sai do
ambiente.
* * *
Mais de
uma hora havia se passado naquele lugar quieto. Ninguém havia batido à porta.
Tudo calmo.
O casal
está num doce aconchego. De vez em quando apertam-se, apaixonados. Ele a beija
e ela quer sempre mais.
-
Não
acha que já é tempo de irmos? Já não temos mais motivos para permanecer aqui. –
ela sugere.
-
Sempre
temos motivos pra estar juntos, seja em que circunstância for e... a carne é
fraca...!
-
Está
tudo bem. Mas agora chega. Já é hora de irmos. – ela levanta-se, decidida,
ajeitando a roupa e os cabelos.
Ele
suspira, fazendo ruído.
-
É...
não tem jeito mesmo... fazer o quê?
-
Por
que você está falando assim? Não está cansado disto aqui?
-
Ah,
deixa pra lá! Você vive fingindo que não me entende.
-
Ai,
meu Deus! Eu não estou mais agüentando o que você me fala! Parece que bebeu!
Parece que está no mundo da lua! Parece que...
-
Gillian, pára! Não vê que...
“Gillian,
pára!”- detecta, de súbito, o
pensamento dela – “Gillian! Gillian...! Deus!! Como eu não percebi logo? É por
isso que nossa conversa é tão confusa... não nos entendemos! Oh, meu Deus! É o
que o Mulder sabe e sempre tentou me
convencer! Este é o ... ator! David! E ele pensa que sou a atriz...
Gillian! E eu o beijei e trocamos
carícias e... nossa!!
Que horror! Que
horror...?? Não!! Foi como se eu estivesse com o meu Mulder o tempo todo! A voz
acariciante dele... seus dedos ágeis e delicados ao mesmo tempo... o seu corpo
quente e tentador... até o mesmo perfume...é o meu Mulder...! Não! Mas não é
ele! Mas... mas... é a mesma coisa! Como um clone!”
-
Gilly,
amor, só mais um pouquinho... vem! – ele pede, carente.
-
Espera,
espera! Eu preciso ir ao banheiro, tá? Depois eu volto.
Ele a
olha, pisca as pálpebras e aperta os lábios, distendendo-os num sorriso, confirmando.
Dana
deixa o local, atordoada.
Ela nem
sabe por onde começar. Começa a pensar. Tem que encontrar Mulder o quanto
antes.
Como
pudera confundi-lo com o ator? Ah, mas não teria como ser diferente! Não teria
mesmo, porque ... mesmo porque... são a mesma pessoa!
“Deus!
Que confusão! Onde viemos parar?! Ai... preciso logo encontrar o Mulder, mas...
como saber a diferença? Como? Como?”
Um arrepio
toma conta de sua pele, relembrando os momentos que passara com David.
“Então...
– continua pensando - ... eles... os atores se amam! E ela é noiva e ele
casado! Que balbúrdia de situação! Situação nada racional nem plausível!
Doideira total!”
Dana caminha
rápida, pelo longo corredor, por onde poucas pessoas passam, neste momento.
“Mulder
deve estar com a roupa do personagem das filmagens, assim como eu, de certo
modo, ainda estou. É como poderei distingui-lo. E costuma levar sempre em sua
carteira a foto de nosso filho.”
Dando
continuidade a seus agitados pensamentos, vai andando em passos ligeiros,
olhando cada sala.
Para
seu grande alívio, consegue ver Mulder, que está saindo do banheiro masculino.
-
Mulder...?
– chama-o, discreta e timidamente, com receio
de estar equivocada, novamente.
Ele a
olha, um tanto escabreado.
-
Mulder!
– ela chama novamente, agora bem perto dele.
-
Sim?
-
Por
favor, preciso falar com você.
-
Ok.
Pode falar. – ele diz, gentil, mas simplesmente, sem olha-la.
Dana
está em dúvida de como aborda-lo, sem mais nenhum engano. Recomeça, então.
-
Bem...
é... é que eu preciso saber...
-
O
quê? - ele tem um leve sorriso nos lábios.
“Ora,
que coisa! – ela pensa – Ele não está com o paletó. Colocou uma camisa. Agora
já não tenho certeza se...”
-
O
que precisa falar comigo? – ele quebra os pensamentos dela, perguntando
atencioso.
-
Vem
cá. – puxa-o pela mão, para um canto do
corredor; vai jogar com a sorte e espera estar falando com o verdadeiro
Mulder.
Ele
demonstra não estar muito interessado em atende-la.
-
O
que você quer agora?
-
O
que eu quero?! Mulder! – faz um gesto nervoso e fixa o olhar ansioso nele;
decide jogar as palavras e ver no que pode dar; suspira, profundamente – Passo
horas para te encontrar e o sinto assim, meio indiferente! O que é isso?
-
Hãn...?
– agora ele a fita, levantando as sobrancelhas, surpreso – Scully...? –
pergunta, um tanto indeciso.
Ela
coloca-se à sua frente. Cruza os braços.
-
Quem você
pensava que fosse?
-
Aaaah! – ele lança um gemido de satisfação,
ao notar os cabelos ruivos dela e faz menção de abraça-la.
-
Espera,
Mulder.
-
Por
que? O que eu fiz? - não entende a
rejeição de parte dela.
Dana
olha-o, profundamente nos olhos.
-
Dá
licença. – pede.
E após
falar isso, mete a mão no bolso da calça dele.
-
O
que é que...? – ele ri, achando divertido o gesto dela.
Dana
puxa de dentro do bolso a carteira.
-
O
que você quer? Precisa de dinheiro? – ele quer saber.
Ela não
responde. Apenas abre a carteira de couro. Um sorriso doce e aliviado surge em
seus lábios.
-
Ah,
meu Deus, até que enfim o encontro! Ai,
Mulder... Mulder... Mulder!
-
O
que foi, Scully...? – faz uma pausa – Você... é a Scully, não é?
-
Vou
te provar mostrando isso. – coloca diante dos olhos dele a foto de William – O
nosso querido filhinho!
Agora
abraçam-se, felizes. Passara toda aquela situação vexatória que ambos haviam
enfrentado.
-
Scully,
seu cabelo...! Sim, você está com seus cabelos ruivos... claro! – ele
deslumbra-se.
-
E
desde quando foram de outra cor?
Ele
coça o nariz, atrapalhado.
-
Ah,
nada, nada, Scully. Esquece. – toca-lhe nos cabelos – Você está um pouco
despenteada, o que não é normal acontecer.
Dana,
agora fica quase sem ação. Sente a pele do rosto esquentar. Deve estar corada.
Sim!
Nos momentos de carícias com o “outro”
Mulder, ele lhe despenteara, claro!
-
E
você... você parece que acabou de tomar um banho! – ela admira-se.
-
Sim...
é que eu estava... com calor. – explica-se ele, meio sem jeito.
-
Mulder...
espera! Só uns minutos, tá? Eu vou no banheiro do outro lado e volto logo...
mas, por favor, por
favor, não sai daqui.
Combinado?
-
Por
que fala assim tão... ansiosa?
-
Ah,
porque é preciso, ok? – dá um beijo rápido nele – Volto logo!
Dana
corre para o toalete. É necessário lavar-se um pouco. Está impregnada em sua
pele, nas suas partes íntimas, a
umidade que provém daquele homem que é, na verdade, outro e não o seu amado
Mulder. Não tem como fugir dessa realidade. Terrível, mas é a verdade. O que
pode ser feito agora, depois de tudo isso? Estivera nos braços de outro homem,
sim. Mas não fora culpada por esse grande engano. Porém o seu Mulder nunca
saberá disso, garante. Nunca!
“Aquele
que colhe culpas no amor, colhe penas.”
Raimundo
Lulio