“Quisera,
ah, como eu quisera poder, ao entregar
a alma ao Criador, levar através da
eternidade os
sonhos
realizados, as esperanças alcançadas, sem
o
amargor de nenhuma tristeza a toldar-me os meus
ingênuos,
mas inalcançáveis sonhos de mulher...!”
Wanilda
– 1971
Mulder,
abatido ainda, está no seu escritório, remexendo nos arquivos da gaveta. Ouve
chaves girando na fechadura da porta de entrada. Pára e fica observando quem
vai entrar.
Dana
entra, com ar surpreso.
-
Mulder! Quando teve alta?
-
Hoje! – responde e volta a remexer
as inúmeras pastas.
-
Ei! Não acredito! E já veio pra cá?
-
É a minha sina, Scully... e a sua
também.
Ela
concorda com um meneio. Senta-se na cadeira, diante do computador. Liga-o e
fica aguardando, enquanto ele inicializa o boot. Olha para o lado da sala onde
Mulder está. Calado, impaciente, continua abrindo e fechando pastas,
apressadamente.
Dana
sente que os pensamentos que estão se apossando de sua mente nos últimos dias,
começam a delinear-se, pouco a pouco, deixando-a perturbada, mas sem ter forças
para desviar o olhar de onde está Mulder.
“O porte
dele, o seu jeito de estar ali, diante dos arquivos, me dão a impressão de que
ele não é apenas um conhecido, um colega, um amigo... que estranho! As mãos
dele, de longos dedos me fazem tremer, parecendo já ter eu tido contato com
eles, no mais íntimo do meu corpo; o seu perfil, a boca... meu Deus! Pareço
sentir seu beijo, sem nunca ter sequer estado junto demais dele...!”
-
Scully, finalmente!
Imediatamente
os pensamentos de Dana dispersam-se na névoa de sua imaginação.
-
O que estava procurando, Mulder? –
pergunta, voltando-se para a tela do monitor.
Mulder
aproxima-se com uma pasta nas mãos.
-
Desde as seis da manhã que tento
achar estes dados, Scully!
-
Às seis horas você já estava aqui?
-
Sem dúvida, colega. – faz um bico com
os lábios apertados, virando as folhas da pasta; aproxima-se dela – Este caso
aqui acontecido em Minnesota nos anos setenta, é que repetiu-se no final do ano
aqui, veja só! – aponta o escrito para que sua parceira o leia.
Dana,
porém, não consegue concentrar-se nas letras diante dos seus olhos. A única
coisa que lhe chama a atenção é o perfume gostoso que emana dele, ali, bem
junto a ela e embriaga-a, quase a deixando atordoada.
“Terrível,
alarmante é essa sensação que eu sinto quando estou junto a ele! – pensa – Mas
acho que entendo essas fantasias da minha mente. Talvez porque a minha vida
sentimental não seja das melhores e eu não tenha, ainda, alcançado meus sonhos
de mulher...!”
Batidas
na porta, neste instante, fazem com que os dois voltem-se para a entrada do
escritório.
Mulder,
em passos rápidos, vai abrir a porta.
-
Bom dia, Agente Mulder! – o rapaz o
cumprimenta.
Mulder
apenas faz um gesto com a cabeça. Não sorri.
O homem
estica o pescoço para olhar para o interior da sala.
-
Oi, Dana!
O Agente,
meio a contragosto, lhe dá passagem.
O
recém-chegado já vai dando passos para entrar, quando a Agente levanta-se de
onde está.
-
Ethan!? – diz surpresa – Não! Por
favor, pode deixar que vou até aí! – e dirige-se para onde está o rapaz – Por
que veio até aqui?
-
Cansei de esperar seu telefonema.
-
Ora, pára com isso! – volta-se ela
para Mulder – Com licença; não vou demorar. – sai com o rapaz e bate a porta.
Os dois
sobem os degraus, para alcançar a porta do elevador.
-
Eu não tive tempo de lhe telefonar,
Ethan.
-
Pensa que acredito nisso?
-
Ora, então fica a seu critério o
que pensar. Não preciso pedir a sua opinião sobre o que pensa do que faço ou
deixo de fazer!
-
Você está cada vez mais geniosa! –
fala, com um falso sorriso.
-
Ando muito cansada, Ethan. E sobre
o que penso do nosso relacionamento, você já sabe.
-
Mas não aceito.
-
Bem... – ela dá de ombros - ...
fazer o quê?
O casal
entra no elevador.
-
Pra conversarmos um instante é
preciso ir lá pra rua? – ele pergunta.
Dana
lança um olhar de admoestação para o
rapaz, ao notar que as outras pessoas ali dentro os olham com ar crítico.
Alcançam
o hall e vão para a rua.
-
Antes de mais nada, devo dizer-lhe
que nunca mais me procure em horário de trabalho. Tenho responsabilidades e
seriedade no meu serviço! – ela fala em tom severo.
-
Parece até uma tia chamando a
atenção do sobrinho! – dá uma risada – Dana, até quando você vai agir desse
modo, fazendo essa palhaçada comigo?
-
Ora, por favor, Ethan! Não está
vendo que eu estou querendo terminar esse namoro? Não dá pra notar que a minha
vida está muito tumultuada pra pensar em namoro sério agora?
-
Tumultuada?! Uma jovem de sua idade
com a vida tumultuada? Ora, Dana, você tem é que curtir a vida e o amor
desestressa mais que tudo!
-
Pelo amor de Deus! Eu não quero
magoá-lo mais, sendo obrigada a falar o que você está cansado de ouvir... por
favor, vamos dar um tempo... será benéfico pra nós dois...
Ele,
nervoso, dá um passo para trás e outro para a frente, demonstrando raiva.
-
Eu quero você! – diz, convicto.
-
Pára com isso! – afasta-se mais
dele – Desculpe, tenho que voltar ao trabalho.
-
Não agora. Vamos conversar! –
segura-a por um braço.
-
Por favor, Ethan; é serio! Tenho
que ir agora!
Ele, num
gesto brusco, toma-a de encontro ao seu peito, tentando beija-la à força.
-
Não! Pára! – ela pede.
Ele
insiste.
-
Você não vai me deixar, Dana! Não
vai! E segura-a, ainda.
Súbito,
enquanto a Agente é arrancada de seus braços, o rapaz é atirado à distância, o
que o obriga a equilibrar-se em suas pernas, para não cair em cheio na calçada.
O
acontecimento foi tão rápido que Ethan e Dana ficam atônitos da surpresa desse
ato insólito.
Mulder
ali está; pernas afastadas, respiração afogueada, lábios apertados, mostrando
ira. Os punhos fechados indicam o desejo de socar o rapaz que está diante de
seus olhos agora acinzentados.
-
Meu Deus! – é só o que Dana
consegue murmurar.
Ethan
caminha na direção do Agente para falar:
-
Com que direito você fez isso?
-
A Agente Scully é uma profissional
do FBI e merece todo respeito de qualquer pessoa que queira lhe perturbar.
-
Perturbar... eu...? Sou o namorado
dela!
Dana
pigarreia, nervosa, aproximando-se dos dois.
-
Olhem, por favor, chega disso! –
volta-se para o o rapaz – Ethan, vá embora, por favor. Eu procuro ligar pra
você.. por favor! – pede, sentindo-se desconfortável.
Mulder
enfia as mãos nos bolsos do paletó, ainda irritado.
Ethan,
por fim, após fitar por segundos os dois Agentes diante de si, afasta-se
caminhando apressadamente. Logo chega até um carro adiante estacionado, entra
nele e após ligar o motor, sai dali, cantando pneus.
Dana suspira
profundamente. Caminha para entrar no prédio do Bureau.
O
parceiro a segue.
-
Desculpe, Mulder... mas não lhe dou
o direito de agir assim, envolvendo-se nos meus assuntos particulares.
Ele nada
retruca. Apenas levanta as sobrancelhas, mas não a olha.
A Agente
está surpresa com a atitude inesperada de seu parceiro. Apesar de pensar que
conhece bem esse seu temperamento explosivo, na verdade nada sabe do seu real
modo de ser.
“Quem
conhece os outros é sábio,
mas
aquele que conhece a si mesmo é iluminado”.