TEMORES E DRAMAS EMOCIONAIS
 
“O temor é que desperta
a memória adormecida.”
Juan Grajales
 
Capítulo 239
 
No carro, Dana fecha os olhos, a fim de evitar que o vento incômodo os penetre. Olha para o seu parceiro, que está com as
 mãos presas ao volante. Lábios apertados. Calado.
-         Mulder...?
-         Sim, Scully?
-         Você quer que eu dirija um pouco?
-         Claro que não! – retira do bolso uma semente de girassol e a quebra entre os dentes.
-         Estou lhe achando cansado.
-         Engana-se, Scully. Entediado. Certas coisas que saímos pra investigar são tão complexas e outras tão óbvias, que
 me causam um certo tédio em continuar.
-         Você...?! – ela sorri – Não diga o que não condiz com a realidade. Você adora esse seu trabalho!
Por alguns minutos ele nada diz, para, em seguida falar:
-         Eu queria ter o poder de resolver todos os casos que nos chegam às mãos.
Dana o observa.
-         Esse caso do Reverendo Kelvin e Samuel o deixou perturbado, não é?
-         Não.
-         Eu sinto que sim, Mulder. Só quero saber o porquê.
Novamente ele se cala. Retorna à sua mente as duas vezes em que julgara ter visto sua irmã Samantha. Engano. Fora apenas
 uma visão. Como se um milagre de Deus pudesse dar ao rapaz Samuel o poder de lhe dar a felicidade de ter ao seu lado sua desaparecida irmã.
-         Por que não me conta o que o perturba? – ela insiste.
Ele não responde. Pressente que, se falasse alguma coisa a respeito de seus temores e dramas emocionais, Dana não entenderia.
  Ela  já sabia de sua vida o bastante.
E ela, por sua vez, tenta faze-lo abrir o seu coração totalmente. Sem sucesso, porém.
-         Sabe que o Diretor Skinner quer me mandar pra investigação de um  caso em Browning, Montana nesses próximos dias? – ele fala,
 nitidamente para mudar de assunto.
-         Por que me diz “quer me mandar”, Mulder? O que você está querendo dizer?
-         O que você ouviu; quer que eu viaje para lá.
-         Você está me fazendo entender que foi designado para ir... sem mim? 
-         Perspicaz, hein,  Scully? – olha-a levantando as sobrancelhas, mas sem sorrir.
Dana levanta a cabeça, olhando para o forro do teto do carro.
-         Isso faz parte do meu trabalho. Não vou deixa-lo ir sozinho. – murmura, quase para si mesma. 
-         O que disse, Scully?
Mas ela não repete o que havia falado. Em sua mente, nesse momento, estão se desenvolvendo cenas que para ela o seu significado é inverossímil.
 
“Dana vê-se no corredor do Bureau. Vê a porta abrir-se. É Mulder que sai. Dirige-se para ela.
-         Mulder, se isso for verdade...
-         Se for ou se não for, eu quero que você esqueça, Scully.
-         Esquecer...?!
-         Você não vai voltar lá. Eu não vou deixar você voltar lá!
-         Do que está falando?
-         Isso tem que acabar uma hora... e a hora é agora!
-         Mulder...!
-         Scully, você tem que entender! Eu não vou me arriscar a ... – fita-a, intensamente - ... perder você.
Ela aproxima-se, mansamente dele e abraçam-se terna e amorosamente.
-         Não vou deixa-lo ir sozinho! – murmura entre os braços dele.”
 
-         Oh, meu Deus! – ela murmura baixinho, voltando à realidade.
-         O que houve? – ele a fita.
-         Ah, Mulder, eu não sei... o que se passa comigo... eu não estou... me sentindo bem...!
Mulder leva a direção do carro para o acostamento da estrada. Gira a chave na ignição. Desliga o motor. Volta-se totalmente para sua parceira.
-         O que você está sentindo, Scully?
-         Eu não sei... – queixa-se, levando as mãos à cabeça.
-         Como não sabe? Alguma dor... tontura, mal estar...?
-         Não, não!
-         Scully, o quê...?
-         Por favor, eu lhe peço, não se preocupe. Eu não estou doente!
-         Mas, Scully, você acabou de me dizer que  está se sentindo mal!
-         Sim, Mulder. – balança a cabeça, nervosa – mas não é um mal físico!
Mulder faz um gesto de impaciência; dá um soco no volante com a mão fechada.
-         Droga, estou regredindo! – diz, com um sorriso sarcástico – Já não tenho o mesmo desempenho, colega!
-         Do que você está falando?
-         A minha antiga capacidade de desvendar a mente humana. Está falha agora. Essa não!
-         Fala isso por minha causa?
-         Sim.
-         Ora, Mulder, de repente é porque para que um psicólogo possa estudar o comportamento de uma pessoa é necessário que ele
 se concentre nela.
Ele olha sua parceira, fixamente.
-         Scully, eu estou sempre ligado no que você faz; convivemos dia-a-dia e...
-         Entendo o que quer dizer.
-         ... mas não é o bastante.
Essas palavras dele fazem com que Dana cesse a conversa, evitando leva-la a um ponto mais sério.
*   *   *
Nesses últimos dias os dois Agentes haviam tido algum tempo de descanso. Logo após, porém, já se encontravam numa das cidades de Montana.
Mulder chega apressado da visita ao chefe da tribo, com o qual fora tomar algumas informações sobre os ataques do homem lobo.
Encontra Dana abatida, sentada na beira da cama, no quarto de hotel onde estão hospedados. Ele senta-se ao seu lado.
-         Scully, novamente sentiu-se mal?
-         Não. – responde, sem olhá-lo
-         Pergunto isso porque o Xerife me contou que você havia encontrado o filho do Parker inconsciente, precisando de cuidados médicos e 
você recusou-se a leva-lo ao hospital e isso acontecendo com você é porque alguma coisa está errada.
-         É verdade.
-         Então o que aconteceu?
-         Me recusei a leva-lo porque senti que algo ruim iria acontecer.
-         Como assim? – pergunta, sem entender.
Ela volta-se para ele, fitando-o, com ar angustiado.
-         Mulder, Lyle Parker é o homem que se transforma em fera.
-         O quê?! – dá um pulo, levantando-se, espantado – Como descobriu isso, Scully?
-         Apenas “vi” que quase fui atacada por ele, como se esse fato já tivesse acontecido.
Mulder sorri, levemente. Leva a mão à boca:
-         Scully, você está me saindo de um jeito do qual eu nunca esperava.
-         Não brinca, Mulder... eu estou confusa!
Ele apronta-se para sair imediatamente dali.
-         Confusa ou não, Scully, você está aceitando as minhas teorias. E isso me alegra – abre a porta para sair – Até mais!
A pancada da porta batendo faz com que ela sinta-se perturbada. Faz uma careta e leva as mãos à cabeça.
“Por que está acontecendo essa coisa comigo, eu exatamente não sei. Só preciso é de me manter controlada, porque senão não conseguirei
 evitar uma sobrecarga emocional.”- pensa.
*   *   *
Dana deixara-se repousar em absoluta calma no quarto de hotel. Tem que esperar seu parceiro chegar a fim de retornarem à sua cidade.
Agora ela está ajeitando seus pertences numa bolsa, quando batem à porta. Ela vai abrir.
-         Oi, Scully. – Mulder a cumprimenta.
-         Até que enfim, Mulder. Sei que concluiu a investigação. Nós já vamos embora?
-         Sim, vamos. – ele toca-a no braço – Antes devo-lhe uma informação.
-         Sobre o quê?
-         O filho do Parker era, realmente, a besta humana; ele foi levado ao hospital pelo Xerife que lhe deixou em casa e após isso ele passou
 os piores momentos de sua vida...
-         O filho de Parker entrou no banheiro porque estava passando mal... ali transformou-se e...
-         Como sabe disso? – espanta-se.
-         Por favor, não me pergunte, porque não sei explicar.
 
“Não pode definir-se a 
vida sem a morte.”
Ehrenberg