DESCANSE NOS MEUS BRAÇOS!
 
“O maior gozo do mundo é o 
descanso depois do trabalho.”
Kant
 
Capítulo 248
 
Mulder entra no banheiro. De cuecas, apenas; põe-se diante do espelho. Desliza os dedos sobre a pele do rosto escurecida
 e arranhenta pela barba por fazer. Cuidadosamente começa a passar o creme de barbear. Em seguida,  a lâmina sobre a pele.
E nesse momento seu pensamento volta-se para o seu trabalho diário. A mesa do escritório repleta de papéis. As estantes com
dezenas de livros empilhados. O pôster mostrando aquele pensamento que vive incrustado  em sua mente desde há muito tempo:
Eu Quero Acreditar. Os arquivos de aço que contém sua preciosa coleção dos mais fantásticos casos, sendo em sua grande parte,
não resolvidos, apesar de seus grandes esforços;  seus e de sua colega de labuta, Dana Scully...
“... Dana... a minha jovem e bela parceira... a pequena figura humana, enorme no seu caráter imponente e severo...!” – ele pensa.
Um leve sorriso esboça-se em seus lábios. Gosta de ficar pensando nessa mulher com quem compartilha o seu dia-a-dia.
Vivem passando o seu tempo, a  maior parte dele, só nas investigações de casos, às vezes terríveis, outros desagradáveis apenas,
outros até mortais. Não têm, nunca, tempo para uma diversão, um agradável lazer... nada!
Mulder conclui seu barbear e lava  o rosto. Acabou, nesse momento, de ter um pensamento que acha o máximo! 
“Tenho certeza de que ela vai relutar, mas eu a convencerei.”- pensa, organizando na mente o seu propósito.
*   *   *
Dana está arrumando sua cama, sem pressa. Vai, logo em seguida, trocar-se e  vestir uma macia camisola, deitar, descansar o corpo
estafado e desgastado pela emocionante lida diária. Está resolvida a passar assim as suas horas  de folga. 
Ouve umas pancadinhas que ressoam no apartamento.
“Compartilhar de um mesmo prédio com um monte de vizinhos, é tão incômodo...!  Me dá a impressão até de que é aqui na minha 
porta que estão  batendo.”-  fala, com seus botões.
Novamente, porém, as pancadinhas. Na porta, nota, então. Insistentes.
“Nossa! É aqui mesmo! M... mas será Mulder...?! Não entendi! Hoje...?!”
Vai  até a porta para abri-la.
Ali parado, com seu belo sorriso de menino, combinando com o olhar carente, está Mulder.
-         Oi, Scully! Desculpe; sei que não me esperava.
-         É verdade... ahn... eu estava até... 
-         ... se arrumando pra sair?
-         Não! – ela sorri – Não, eu ia ficar refestelada na minha cama, descansando.
-         Novamente te peço desculpas, Scully.
-         Tudo bem, Mulder. – ela fecha a porta, fazendo-o entrar e afasta-se.
Ele senta-se numa poltrona.
-         Vim aqui chamá-la para ir ao cinema.
-         Cinema?! – ela levanta as sobrancelhas.
-         Por que a surpresa?
-         Não... é ... é porque isso  é uma coisa que não faço há muito... não tenho tempo disponível.
-         Claro! Mas agora eis sua oportunidade! – fala, com seu habitual ar de troça.
Novamente Dana deixa aparecer em seu semblante  um discreto sorriso.
-         Sinto muito, Mulder, mas não dá.
-         O quê não dá?
-         Não dá pra sair com você.
-         Por que não?
-         É que... realmente, quero descansar!
Ele a fita, apertando os olhos.
-         Scully,  descanse nos meus braços...!
-         Aaah... – afasta-se, com um sorriso mais aberto - ... desculpe, sim? Fica pra outra vez!
-         Não acredito que vai fazer isso comigo! – ele murmura, com ar triste.
-         Mulder, você sabe tanto quanto eu o desgaste físico e mental que sofremos a cada dia. O trabalho desta semana me deixou
 realmente esgotada. Preciso ter umas longas horas de relaxamento!
Mulder suspira, insatisfeito.
-         Tudo bem, Scully, mas veja bem, nós temos que relaxar, ter alguns momentos de puro lazer... é necessário a mente estar
 descansada,  para o corpo receber os benefícios.
Ela o está fitando; braços cruzados, fisionomia séria.
Mulder aproxima-se mais, segura-a pelos ombros. Há dias estivera com ela apertada em seus braços, trêmula, carente, hesitante se
 devia abrir o coração e chorar em seus braços, mostrar sua fragilidade de mulher, após ter passado momentos de terror com o
 bandido que está preso agora: Donnie Pfaster.
Dana percebe que ele está lembrando dessa cena e dirige um fraco sorriso para ele.
-         Scully, eu compreendo perfeitamente que você ainda está traumatizada com o que lhe fez aquele bandido, e eu,  melhor do que
 ninguém, compreendo isso e só quero o seu bem!
-         Eu sei disso.
-         Pois então entenda que só quero ajuda-la a passar algumas horas de descontração tão valiosas! – diz, fitando-a com doçura.
-         Obrigada, Mulder. – dá um profundo suspiro -  Você me convenceu.
-         Realmente...? – ele sorri, animado, retirando as mãos dos ombros dela.
-         Vou me arrumar. – ela fala, afastando-se dele.
*   *   *
O cinema está com poucos lugares desocupados.
Os Agentes, sentados em poltronas localizadas no  centro da platéia, conversam.
-         Já leu algo sobre esse filme, Mulder?
-         Sim; é um sério candidato ao Oscar.
-         Bem, pelo menos poderemos estar certos de que não perdemos tempo vindo aqui.
-         Scully, mostre-se um pouquinho mais animada! Afinal, este seu amigo aqui não quer vê-la tão sisuda e triste em todas as horas!
-         Sinto muito, Mulder!
Ele levanta-se.
-         Espere... vou rapidinho só comprar umas balas pra adoçar a boca.
-         Acha que é necessário? Por mim não precisa!
-         Eu vou sim! Disfarço com as balas, já que não posso sentir... o seu gosto na minha boca...! – fala junto aos ouvidos dela, com ar
 matreiro.
Ela baixa a cabeça, olhando-o de soslaio, com um leve sorriso nos lábios.
“Esse Mulder não toma jeito mesmo...!” – pensa.
Mulder sai em passos rápidos.
-         Por favor, pode me dizer as horas?
A pergunta feita junto aos seus ouvidos a perturba, num susto. Olha para quem lhe falara. Nem havia notado que um homem bem apessoado
 estava sentado numa poltrona logo após outra vazia ao lado da sua.
Ela consulta o relógio de pulso.
-         Seis  e cinqüenta. – fala ao desconhecido.
-         Muito obrigado! – sorri ele.
Em seguida a isso, um casal chega e, ao acomodar-se numa cadeira próxima ao homem, este muda de lugar, sentando junto da Agente.
Dana retorna o olhar para a grande tela ainda vazia.
-         Estou doido pra ver o filme. E você?
Ela lhe dá uma rápida olhada, dizendo:
-         Também.
Dana dirige o olhar para a poltrona de onde saíra  Mulder, torcendo para que logo ele retorne. Para sua tranqüilidade, coloca nesse assento
 sua bolsa a tiracolo, marcando assim o lugar para seu colega, numa inquieta espera de  logo ele volte para  a sala  de projeção.
O desconhecido estende-lhe a mão, que tem vários caramelos.
-         Pegue alguns.
-         Não, obrigada. – fala, sem jeito.
-         Ah, por favor! – ele insiste.
-         Não... é que... meu...  amigo foi lá comprar alguns.
-         Ah, sei... desculpe; está acompanhada...!
-         Sim.
-         É um descuidado, o seu amigo! Deixa-la aqui, assim, à mercê dos olhares de outros homens...!
Ela o fita, surpresa.
O homem, no entanto, continua em sua conversa mal aceita  pela desinteressada moça.
-         Desculpe, -  recomeça – mas devo dizer que você é muito linda! 
-         Obrigada. – ela fala, virando a cabeça e olhando para trás, impaciente e esperando que Mulder logo reapareça.
 
“Deus nos livre das inimizades dos amigos!”
Lope de Vega