A MEMÓRIA RETORNOU
“A paixão faz perder a memória e
a falta
de memória serve à paixão.”
Valtour
Capítulo 257
Mulder, com ternura, afaga os longos cabelos ruivos de Dana.
- Sua memória voltou, não é, Scully?
- Sim, sim! O nosso filho, Mulder! Precisamos voltar! – fala, entre soluços.
- Eu sei que precisamos, Scully, eu sei, mas a nossa tentativa falhou... agora temos
que tentar novamente... – ele a segura pelos ombros e a fita, intensamente – Me
diga, Scully... você está bem mesmo? Olha, pergunto porque agora estamos
preparados para retornar à nossa realidade; até nosso corpo terá as reações
anteriores... no caso então você ... está me entendendo?
Dana fecha os olhos e atira-se novamente nos braços dele:
- Mulder, perdoa a minha fraqueza em não lutar pra relembrar tudo...! Eu te amo,
- Mulder! Preciso de você! Sou sua!
Ele continua a acariciá-la, ternamente.:
- E o que mais vem à sua mente? Seu corpo indica alguma coisa?
- Está falando sobre a minha gravidez, não é? Sinto que estou bem, Mulder, mas
agora vou começar a me preocupar.
Ele aperta-a contra seu peito.
- Não, não! Nós vamos descobrir a saída pra toda essa enrascada. Confie em mim.
Com o rosto molhado de lágrimas, ela passa os dedos para enxugá-lo; respira fundo.
- Eu tenho certeza que sim, Mulder. – lança o olhar à sua volta, no cubículo
que forma o aposento da pequena moradia – Mulder, estamos em casa de alguém
que logo deverá voltar. O que vamos fazer? Está anoitecendo!
- Sim; temos que ficar aqui porque não sabemos nem andar por esses caminhos e
estradas desconhecidos. Vamos aguardar aqui mesmo.
- Sim, é melhor.
Ele dispõe-se a examinar o casebre, sem o mínimo de conforto ou limpeza.
- Scully, não vejo sinal de algum alimento aqui! Essas vasilhas estão vazias! Que
troço estranho! Não há armários, nada!
- E a cama, Mulder...?! Vem olhar!
Ele se dirige até onde ela lhe mostra. Vê estreita e tosca caixa de madeira coberta de palha,
que serve de cama. Os panos jogados por cima são sujos e fétidos.
- Caramba, Scully! Onde viemos nos meter?! Isso aqui é uma habitação de alguém
que está na miséria...
- ... total! – ele completa, desanimada.
- Como vamos fazer? Está se aproximando a noite e não podemos adquirir nada.
Mulder volta-se para Dana, preocupado. Fita-a, com paixão e tristeza. Seus olhos enchem-se
d’água; sente absoluto arrependimento.
- Scully... você me perdoa...?
Ela apenas confirma, anuindo.
Mulder pega um e outro objeto jogado pelo chão; vasilhas de barro, de ferro, à procura de
algo com que pudessem alimentar-se. Logo joga os braços ao longo do corpo, desanimado.
Nada está encontrando na mísera habitação.
- Nem sequer água temos aqui, Scully!
- E o pior é que nem sequer um banheiro...!
Mulder a fita, sentada na caixa de madeira que serve de cama, olhar triste e pensativo.
Nessa hora da noite nada poderá fazer, mas logo pela manhã tem certeza de que algo poderá
resolver para bem dos dois.
A penumbra do entardecer vai tornando, pouco a pouco o local menos aconchegante possível.
O frio. A escuridão. A sujeira. O desconforto. Tudo os deixa atordoados. Perturbados. Só
podem escutar lá fora o barulho das aves noturnas que rasgam a escuridão.
Carinhosamente ele toma Dana entre os braços. Sente-se completamente sem rumo. Sem a mínima
capacidade de saber como proceder para tirar suas vidas dessa situação extremamente precária.
Então, deixando que ela se aninhe entre seus braços, deita-a no catre forrado com palha. Após
minutos, ouve que ela ressona levemente. Está cansada.
Vagarosamente, Mulder a retira de seus braços, para que ela fique melhor acomodada no
desconfortável leito. Escorrega o corpo para o chão; apóia os braços e a cabeça sobre a
beira da cama e assim permanece para poder pensar no que deve fazer.
Ele sente o frio chão de terra no qual está sentado; olha as paredes feitas de varas trançadas,
recobertas
de barro, o teto de palha, tudo muito rústico; praticamente inabitável.
“Que situação miserável! – pensa ele – E que sorte que o morador daqui não ter aparecido,
senão estaríamos dormindo na rua... e Scully...? No estado dela não lhe é conveniente
passar fome e desconforto... preciso dar um jeito de sairmos dessa louca realidade... tem que
existir um portal, algo que nos permita retornar...! Tenho que descobrir em como fazer
pra nos salvar dessa situação!”
* * *
A lua ainda está aparecendo timidamente no alto do limpo céu. Pássaros voam em todas as direções.
As montanhas têm seu perfil delineado no azul carregado de nuvens.
Mulder, está de pé junto à estreita porta, os dedos dobrados sob o nariz, pensativo e cabisbaixo.
- Mulder! – ela o chama, pedindo a atenção dele.
Ele vai até ela.
- Conseguiu dormir, Scully... bom isso; precisava mesmo descansar.
- Você não dormiu?
- Cerca de alguns minutos, somente, porque também estava bem caído de cansaço.
- Mas então não descansou muito!
- Nem posso, Scully, só pensando num meio de voltarmos à nossa era! Escute, preciso sair...
- ... não! – atalha ela as palavras dele.
- Mas tenho que ir em busca de algum alimento!
- Vou com você.
- Mas, Scully...
Ela já está de pé. Puxa a roupa de lã, amarfanhada no corpo.
- Estou pronta pra irmos agora.
Ele não contesta. Nem adiantaria.
* * *
Os caminhos longos e tortuosos, nada convidativos causam em Dana, a todo momento, certo
temor, por ver, de vez em quando, sapos e serpentes atravessando no local.
- Veja, Scully!
Mulder aponta na direção de uma lebre que corre ligeira pela mata. Em seguida ouvem o
canto das galinholas selvagens. Corvos voltejam por todos os lados.
Em dado momento o casal pára, a fim de observar uma adolescente trazendo no ombro um pote
de barro.
- Quer que eu peça água a ela, Scully? – ele pergunta.
- Água...? – ela repete a palavra, como se fosse algo estranho, por estar tão debilitada.
Mulder chama a mocinha.
- Ei! Espera aí!
A jovem pára.
Mulder aproxima-se:
- Por favor, me arranje um pouco d’água. – e aponta na direção de Dana É pra ela.
A jovem toma de um saco de pano que leva no ombro uma caneca de barro; enche-a com a água
e entrega a ele.
- Obrigado, menina.
Em seguida Mulder, em passos rápidos vai até Dana. Entrega-lhe a caneca. Ela bebe a
água. Sente-se mais reconfortada.
Ele retorna para entregar a caneca à garota. Agradece mais uma vez pelo que bem que havia feito
a ambos.
A jovem, afasta-se.
O casal prossegue sua caminhada. Já avistam ao longe uma aldeia de cerca de doze casas.
Todas são construídas praticamente iguais. Somente com a porta; nem janelas possuem. Ao lado
delas um bosque.
Já podem avistar lá, mais no alto o castelo do homem que dirige a vida dos aldeões.
A ignorância do bem é o que
mais perturba a vida humana.
Cicero