DESPERTAR DE UM PROFUNDO SONO
¨O sono
é a sombra em que a alma repousa.
É um mergulho na eternidade.¨
Coelho Neto
Capítulo 262
Carregando, ainda, o seu precioso fardo nos braços, Mulder vai enfrentando a longa caminhada
pela escura gruta.
Ele sente-se quase feliz. Estão agora a caminho da sua realidade e graças àquele cardume de
mugem vermelha, os peixes que os levaram até seu tempo real.
Dana, apesar de estar consciente, sente-se ausente do próprio corpo. A sensação é horrível. E ela
geme, levemente.
Como um pequeno, mas forte raio, o brilho de uma luz quebra o negro da escuridão.
Isso faz Mulder reavivar o ritmo de seus passos. Pára por alguns segundos, a fim de observar
as reações de Dana. E logo, ao senti-la tão frágil junto ao seu corpo, sensibiliza-se e uma
imensa ternura o invade. Aconchega, com carinho, a amada e a beija, suavemente nos cabelos.
Caminha novamente em largas passadas, quando, como num milagre, um quadro luminoso se
distingue bem ao longe, rasgando a escuridão.
O entusiasmo dele pela solução do problema que os está atrapalhando a vida é grande.
¨Finalmente livres!¨- pensa então.
Em poucos minutos mais já se encontra junto à grande saída.
Mulder estaca os passos. Respira fundo.
Dana, parecendo despertar de um profundo sono, abre os olhos e vê Mulder.
- Huuum... nossa! Estou sendo carregada assim tão...
- Tão o quê, Scully?
- ... docemente acomodada pelo meu amado...!
Ele acha interessante como Dana pode estar bem humorada, se seu estado geral era tão
desanimado.
- Você melhorou? – ele pergunta.
- Se melhorei...? Eu estou óti... – cessa de falar, arregalando os belos olhos azuis –
Mulder!! Estamos aonde?
- Retornando à nossa vida, Scully!
Ele a solta de seus braços.
Dana, de pé, no chão, olha com interesse ao seu redor. Em seguida baixa o olhar para seu
próprio corpo.
- As minhas vestes... – desliza as mãos pelo corpo - ... estão normais, Mulder!
- Sim, eu sei. Notei logo que a vi. E até examinei meu próprio corpo e vi que eu
também estou vestido do jeito que saímos daqui.
- Será que retornamos mesmo? – fica apreensiva – Ainda tenho minhas dúvidas.
Ele a ajuda a caminhar por entre o bosque de altas e frondosas árvores, onde aqui e ali
estão pássaros cantando e pode-se ver casais e crianças.
Mulder pára por um instante, observando as pessoas.
- Engraçado, pode até ser impressão minha, mas acho que o pessoal que anda
por aqui não tem o menor interesse de aventurar-se por entrar nessa gruta, da qual
acabamos de sair... notou isso, Scully?
- Sim, notei...
Ambos voltam-se, agora, olhando para trás.
- Mulder... – ela balbucia, espantada.
- Incrível! Você está vendo o mesmo que eu, Scully?
- Ou melhor, não estamos vendo nada!
Diante do olhar estupefato de ambos, notam que, do ponto onde haviam saído, a entrada da
gruta, só dá para perceber muitos arbustos floridos, grandes árvores de troncos grossos e um
grande espaço gramado.
Mulder, de mãos na cintura, pernas afastadas, olha, fixamente, para o local.
- Não estou entendendo nada...! – murmura.
- E nem quero entender! – ela o adverte, falando em alta voz.
- Certo... – resmunga, em sua voz murmurante - ... mas preciso saber o porquê disso.
- Mulder!! – ela o chama em voz estridente.
Ele a olha, levantando as sobrancelhas:
- O que houve, Scully?
- Só tem um detalhe: se você decidir agora verificar o que está acontecendo, irá
sozinho!! – diz e, em passos rápidos, afasta-se dali.
Ele desiste de seu objetivo:
- Scully, espera! – e vai, em passos largos, acompanhar-lhe o caminhar.
* * *
- Finalmente! Nem acredito, ainda! – comenta Mulder, ao ver a casa diante de seus olhos.
As flores e plantas do jardim parecem até estar a saudá-los, encurvando suas folhas e hastes
ao sabor da brisa que sopra neste instante.
Dana contempla, maravilhada, os encantos da natureza e nem vê alguém a se aproximar dela,
com os olhos brilhantes de felicidade.
- Filha!!
Dana volta-se ao ouvir o chamado.
- Ahn...?
- Dana, minha filha! – grita Maggie, com ar feliz.
- Mamãe! Mamãe!! – agora ela vê que, na realidade, sua mãe a está saudando pela sua chegada.
Mulder, com leve sorriso nos lábios, aprecia a tocante cena.
Enquanto Maggie abraça a filha numa sincera ternura materna, Dana, aos prantos, agarra-se a ela,
como se fosse alguém que tivesse perdido e está agora a recuperar. A emoção é forte demais.
- Filha, mas que emoção! Que coisa boa! – exclama a mãe, ainda abraçado à filha.
Logo desprende-se dos braços de sua filha e apressa-se a abraçar Mulder.
- Que felicidade, Fox! Fico tão feliz em vê-los de volta!
- Você não sabe o quanto nós dois estamos felizes, senhora Scully... mais do que possa
imaginar.
Dana cessa de soluçar. Enxuga os olhos com os próprios dedos. Detém os pensamentos em algo
importante, agora.
¨E se, na verdade, esta não é a nossa realidade... a nossa vida normal... o nosso tempo?
Só podemos ter a certeza se eu puder ver meu filho...!¨
- Venham! Venham logo, porque William vai ficar super feliz! – fala Maggie,
interrompendo-lhe os atormentados pensamentos.
Pronto! A partir dessa frase dissipam-se todas as dúvidas de Dana e Mulder, que também estava
à espreita do que lhe seria apresentado agora nesta realidade em que estão.
Ele segura Dana pela mão; esta abraça-se à cintura de sua mãe e os três entram na casa.
William, acompanhado de suas dezenas de brinquedos à sua volta, arrasta com a mão um
carrinho vermelho, que desliza sobre o piso, enquanto ele cria, com sua própria voz, o ruído do motor.
- Rrrrr...
Dana vai, em passos rápidos na direção do filho.
Este levanta o olhar e fita os pais com ar deslumbrado.
- Mamã! Papá! – levanta-se ligeiro do chão e corre a abraçá-los.
* * *
- Fox, eu estou tão contente com a volta de vocês...! – comenta Maggie, enquanto retira,
da mesa os pratos e talheres usados no almoço.
- Não mais que nós, senhora Scully. Aconteceu alguma novidade por aqui?
- Não! Tudo correu bem, graças a Deus. William agora arranjou um amiguinho de sua
idade, que é nosso vizinho e brinca à vontade.
- E ele sentiu muito nossa falta?
- Nem queira saber, Fox! Perguntava todos os dias quando é que vocês estariam de volta!
Dana acabara de entrar na sala de jantar e ouvira a frase que sua mãe falara.
- É mesmo, mamãe? E o que você dizia a ele?
- Claro que logo vocês estariam aqui! – ela sorri – Ele já dormiu?
- Sim; eu o deitei, li a história que ele pediu e logo depois caiu no sono, segurando minha
mão.
- O tadinho estava sentindo muito falta de vocês! Já nem quase dormia o soninho da tarde!
Andava agitado.
- Mamãe, nós já estávamos desesperados até por estarmos fora daqui.
- Ah, eu faço idéia, filha! Imagine uma mãe não se sente feliz longe de seu filhinho! Que
dias difíceis, viu? Foi preciso inventar um monte de passeios e brincadeiras para
convencê-lo a esperar vocês com tranqüilidade. Que semana! Ufa!
- O quê?! – Mulder e Dana exclamam, ao mesmo tempo, com expressão surpresa.
Maggie os fita, sem entender bem o espanto dos dois.
- Você disse uma semana, senhora Scully? – quer saber Mulder.
A mãe de Dana ergue as sobrancelhas.
- O que eu falei de errado...? – pergunta.
Mulder dá umavolta na sala, passa o dedo indicador sobre os lábios e vai responder.
- Ah... é que nós... – precipita-se Dana a explicar.
- ... perdemos a noção do tempo! – interrompe ele, para dar uma
suficiente e
definitiva
explicação.
- A felicidade faz essas
coisas! – Maggie sorri, abraçando-os, contente.
Mulder e
Dana fitam-se, entendendo
que Maggie jamais poderia saber da realidade pela
qual
haviam
passado, antes de retornar à sua vida normal.
¨A
felicidade não passa de uma ilusão vivida.¨
Vargas Villa