NESSA TRISTE RECORDAÇÃO

 

 

¨As recordações são o único paraíso

do qual não podemos ser expulsos.¨

P. Richter

 

Capítulo 263

 

Dana, de pé, parada junto à mesa de jantar, observa um porta-retrato sobre um móvel.

Vê a foto de  Melissa, sua falecida irmã covardemente assassinada há bastante tempo atrás;

suspira tristemente, saudosa; seu olhar prossegue por sobre o móvel; junto a esse porta-retrato,

inúmeros outros aparecem. Num deles pode ver Tara, sua cunhada, o marido Bill e o filho de

ambos, ainda bem pequeno.

A mente de Dana a faz retornar a uma cena antiga.

Sentados à mesa do jantar, em pleno Natal, ela havia se entristecido pelo fato de que

descobrira que, ao ser abduzida por alienígenas, estes lhe haviam retirado os óvulos e isso não

a iria permitir engravidar jamais. Ainda nessa triste recordação, ela desliza a mão sobre

o ventre já bem pronunciado. Está bem perto a chegada de seu novo bebê, agora uma menina.

¨Como a vida nos traz surpresas...! – pensa - Naquele tempo eu estava amargurada,

 acabrunhada mesmo, imaginando nunca poder ter filhos... e agora vou ter o meu segundo...

 aliás minha filhinha. Como será ela? – sorri, levemente –

William é ruivo como eu, mas herdou os olhinhos pequenos e esverdeados do pai... – e essa

agora...? A genética é fantástica!¨

 

*   *   *

            - E então, lindinha, a gente vai até o parque fazer a caminhada?

            - Não acredito que dê pra fazer isso hoje.

            - Por quê?

            - Estou me sentindo um tanto diferente.

 

- Diferente...? – há apreensão na voz – Está sentindo alguma coisa extra, Scully?

Dana sorri e medita um pouco.

Vai tentar disfarçar, para que Mulder não deixe de sair com seu filho.

                   - Não, Mulder. Estou bem! Não é nada para alarmar! Está tudo sob   

                     controle!

Ele segura-lhe o rosto, beijando- a  levemente nos lábios.

                   - Eu vou levar William e logo volto, ok?

            - Vai, sim e divirtam-se!

Mulder afasta-se.

William já vem correndo, entrando na sala.

            - Mãaae! saí cum meu pai! Olha como munito!!

            - Está lindo, meu filhinho! – o faz sentar no seu colo e o beija.

            - Você não qué  í com a gente?

            - Não, filhinho... preciso ficar cuidando de sua irmãzinha que vai chegar.

            - E quando ela chega, mãe?

            - Logo, logo, meu filho! – beija-o nos cabelos mais uma vez – Vai, vai com 

            seu papai. Bom passeio.

O menino desce rápido do colo da mãe e sai.

Dana permanece sentada. Já havia notado que está com os nervos à flor da pele e sentindo-se

Mais pesada que o normal. Havia notado que a linha escura que se desenha no seu ventre parece

ter-se acentuado mais ainda, nesses últimos dias e o peso no baixo ventre é bem maior.

 

*   *   *

O sol já se pusera e Maggie, ajeitando a mesa para o jantar, está sorridente.

         - Dana, Wiliam não cabe em si de contentamento! Também o pai o mima  

          demais!

Dana sorri, também, porém meio sem entusiasmo.

            - Filha, estou lhe achando menos ativa hoje.

            - É verdade, mamãe. O cansaço é grande!

            - Também pudera! Essa sua barriga parece até que é um esconderijo de   

            gêmeos!

            - Nem brinca, mãe!

 

*   *   *

Mulder estã  sentado no amplo sofá, junto a seu filho que tem ao lado sua mãe, Dana.

            - Wilha qué dumí. – fala o menino.

Dana levanta-se, segurando-o pela mão.

            - Vamos, filho... – fala com um suspiro.

Encaminham-se para o quarto da criança.

Ela o deita, carinhosamente,  ajeitando os lençóis para cobri-lo.

Ele olha as vidraças da janela. Puxa o braço da mãe, chamando-lhe a atenção.

            - Hoji ta feio!

            - O que está feio, filho?

            - Lá fora, o céu!

            - Por quê?

Ele abre os braços,  num gesto de desânimo:

            - Num tem nua, num tem estêla...!

Dana tem que sorrir diante dessa frase. Confere o que diz seu filho. Realmente o céu

está despojado da lua e estrelas. Somente a escuridão nas nuvens.

 

            - Mãe, conta aquela históra! – ele pede.

Ela pega um dentre as dezenas de livros numa pequena estante.

O menino já está acomodado. De olhos e ouvidos atentos.

Ela começa a leitura:

- Era uma vez... uma mulher pequenininha... que morava numa casinha

  pequenininha...

E a mãe vai narrando a história, para deleite da criança. Os olhinhos de William

curiosos, prestam atenção à narração da mãe. Alguns minutos depois começam a se

fechar. E logo o sono toma conta dele.

Dana se levanta, pesadamente, colocando a mão no quadril. Sai do quarto.

Súbito, sente que um líquido quente lhe desce pelas pernas. Ela pára por segundos.

            - Meu Deus! – murmura.

Olha para o relógio sobre um móvel, que marca vinte horas e quatro minutos. Ela,

em seguida, dirige-se ao banheiro. Verifica que o líquido quente continua a descer-lhe

pernas abaixo.

            - Mamãe! – ela chama.

Maggie, que estava sentada numa poltrona lendo uma revista, ouve o chamado. E

sai dali, para atender sua filha. Em passos rápidos chega até ela.

            - Mãe, me ajuda.

            - O que aconteceu, filha? – pergunta, aflita.

            - Nada demais, nada demais. A bolsa estourou e o líquido está descendo

             cada vez mais. Preciso que me traga aquele pacote de absorventes que está  

             no meu   quarto.

            - Claro, claro!! – sai rapidamente.

Mulder surge, pois vira Maggie a acudi-la.

            - O que houve, Scully?

            - Chegou a hora, Mulder... nossa filha quer nascer.

            - Nossa!! – ele exclama, arregalando os olhos – Vou já pegar o carro!

            - Sim; eu aguardo. Estou me preparando.

            - Toma, filha. – diz a mãe, voltando e entregando o pacote de absorventes.

            - Scully, você prevê para que horas o parto? – ele pergunta.

            - Não sei ao certo, Mulder... – suspira - ... quando todo o líquido sair da  

              bolsa, começarão as dores e contrações.

            - Scully, isso pode dar algum problema...?

            - Nenhum, se eu for logo para o hospital e permanecer em repouso.

            - Do contrário o que acontece?

            - O cordão umbilical pode se enrolar no pescoçinho da criança.

Mulder sai, em passos largos e rápidos.

            - Mamãe, não se preocupe se não puder ir comigo para o hospital.

            - Não, filha! Eu vou com você. Louise já disse que pode tomar conta de 

             Wiliam. Vou falar com ela agora mesmo que tenho que ir com vocês.

            - Está certo, então. Ela dirige-se ao interior do banheiro.

*   *   *

 

Mulder está andando a passos largos pelo imenso corredor da maternidade. Vez em

quando tira uma semente de girassol do bolso e a mordisca, tirando-lhe a casca, a qual

repõe no bolso do casaco.

Maggie, sentada, aguarda com ansiedade, o desenrolar do tão esperado acontecimento.

 

Funcionários, enfermeiros e médicos do hospital passam, incessantemente, por ali.

Uma mulher com um carrinho repleto de xícaras e copos pára diante dos dois.

            - Cafezinho, senhor? Água?

Mulder pára de caminhar e aceita a quente bebida.

Maggie a recusa.

            - Tome um cafezinho, senhora Scully. Serve para tirar essa tensão que nos  

              abala!

            - Negativo, Fox! Só serve pra me excitar mais!

A funcionária que leva o carrinho sorri e prossegue no seu trabalho, afastando-se dali.

A porta do quarto em que Dana se encontra é aberta e uma enfermeira sai.

            - Ei, por favor! – chama a mãe de Dana – Diga como está minha filha!

Mulder chega, também, em passos rápidos.

            - Ela já está sentindo as contrações até poucos minutos.

            - Mas desde a madrugada que ela sente as contrações! – reclama Maggie.

            - Sim, sabemos, senhora! Mas é que o médico achou que ela poderia ter a

            criança por vias normais, mas agora ela vai fazer uma cesárea.

            - Ah, é?! Mas por que depois de tanto tempo pra tomar essa solução?

            - É que ela não tem passagem por vias normais. – afasta-se, rapidamente -=

              Desculpe, preciso ir, agora.

As carnes das mandíbulas de Mulder pulsam dentro de sua face.

 

A criança não é feliz quando nada lhe deixam

ignorar – e aí é que se vê para que existem os

pais

Ogden Nash¨