MÚSICA  LONGINQUA

 

“A música  é a voz do infinito.”

Campoamor

 

CAPÍTULO 266

Na noite escura e silenciosa só se pode ouvir o som dos grilos e os pássaros noturnos cortando

o espaço infinito. Bilhões de pontos luminosos cintilam no céu, como diminutos diamantes num

estojo de veludo. O vento, um tanto forte, faz se  mover a cortina na janela do quarto. Esta

dobra-se e desdobra-se, ondulando o tecido claro em interminável movimento. Vez em

quando o latido de um cão ou uma música longínqua quebram o silêncio, que logo se renova,

ao cessar esses sons.

 Mulder abre os olhos. Vira a cabeça e vê Scully adormecida ao seu lado. Seus longos

cabelos ruivos espalham-se sobre o travesseiro e sua fisionomia é serena.

Alguns minutos depois  ela mexe-se na cama e solta um longo gemido. Movimenta os olhos

nas órbitas, ainda fechados.

Ele, carinhosamente, afasta da face dela os fios de cabelos que lhe caem no rosto.

Aproxima os lábios de sua testa para ali depositar um leve beijo.

Neste momento Dana desperta totalmente.

-          Ahn...?

-          Oi...?

Ela abre um belo sorriso:

-          Bom dia, Mulder. – senta-se na cama e olha o relógio na mesinha de cabeceira

– Nossa! Eu dormi demais!

-          Nem tanto! Quantas vezes você levantou?

-          Umas quatro vezes pra olhar as crianças.

Ele joga-se por cima dela.

-          Agora esta hora é só pra mim. Também exijo cuidados!

-          Oh, meu bebezão...!  - faz voz manhosa.

-          Eu qué! – ele imita voz de criança.

-          O que você quer, meu bebezão?

-          Voxê xabe...!

-          Huuum... – ela observa  que as carnes entumescidas dele junto ao seu corpo estão

preparadas para mais momentos de amor.         

Dana entrega-se toda a seu amado.

                                                                    *    *    *

Um choro é ouvido, vindo do quarto contíguo.

Dana levanta-se meio tonta. Vai direto ao quarto de seus filhos.

William dorme serenamente. Perninhas dobradas, braços também do mesmo jeito, voltados

para o travesseiro, modo peculiar de toda criança.

No pequeno berço, Vivien movimenta os diminutos pernas e braços, num chorinho baixo.

-          Docinho da mamãe...! Está com fome, é?

Corre a cuidar, rapidamente da higienização dos bicos dos seios. Retorna ao berço e retira a

filha, colocando-a em posição para ser amamentada.

E enquanto o bebê se alimenta, Dana desliza os dedos pela cabecinha da criança.

Seus pensamentos voltam-se para o tempo do nascimento de William. Quanto sofrimento tivera

que passar! Nas mãos de gente desconhecida entregara seu filhinho, sofrendo horrores com tal

decisão.

Enquanto a filhinha é alimentada, Dana continua pensando no quanto medo tem de que algo venha

a lhe acontecer e à sua família. Afinal, como poder estarem certos de que seus inimigos não os

espreitam? Como poder saber?

Mas não! Não quer deixar-se levar por tais divagações ! Tem mais é  que se  imaginar feliz, junto

a seus filhos e ao homem que tanto ama.

*   *   *

Mulder, com o filho no colo, aprecia a beleza da natureza ao redor da casa.

Árvores balançam sua folhagem,  pois são movidas pelo vento frio que sopra neste instante.

-          Meu filho... não está com sono, ainda?  - ele pergunta.

-          Não. Eu qué ficar.

-          Já tomou o seu leite, filho?

-          Já.

-          Ok. Vai ficar com o papai só mais um pouco.

O menino, aos poucos,  ali, no aconchegante colo do pai, sente seu pequeno corpo relaxar

e o sono da tarde aos poucos o domina. Ele cochila, levemente.

Um vulto aproxima-se do portão de entrada.

-          Oláaaa!

-          Ah, olá! -  - responde Mulder, vendo a recém-chegada.

A moça se aproxima dele:

-          Aí está o meu queridinho! – exclama, vendo o menino no colo do pai; estende os

braços para ele.

A criança, usando, como todas, sua autenticidade, fica com o semblante sério, enquanto a mulher

o afaga nos cabelos.

-          Venha comigo, William!  Eu faço você dormir pra tirar sua sonequinha da tarde.

-          Eu não qué! – diz ele, convicto.

Mulder sorri:

-          Que é isso, filho? Louise gosta de você!

-          Wilha não qué!! – brada o menino.

A jovem vizinha dá uma risada:

-          Deixa, Fox! Tudo bem. Criança é assim mesmo! – senta-se perto dele – Como

vão as coisas?          

-          Tudo nos devidos lugares.

-          Huum... isso é mal!

-          O quê é mal...? – ele surpreende-se.

-          Todas as coisas, sejam as mais acomodadinhas possíveis, sempre podem sair do lugar.

Mulder a  fita,  intrigado. Aperta os olhos e a observa melhor:

-          Com você é sempre assim?

-          Sempre! – dá uma risada, parecendo excitada; levanta-se – Bem, vou lá dentro bater

um papo com a senhora Scully.

Ela se retira, rapidamente.

Mulder se levanta, carregando o filho nos braços.

*   *   *

Enquanto Maggie está tomando conta da cafeteira ligada, Dana está preparando um mingau no fogão.

-          Oi, amigas! – saúda a vizinha.

-          Oi, Louise! Tudo bem? – cumprimenta a mãe de Dana.

Esta, por sua vez, pára o que está  fazendo, a fim de olhar quem acabara de chegar.

-          Louise, muito obrigada pelos favores que nos tem feito!

-          Tomar conta das crianças...? Sabe que pode contar sempre comigo.

-          Pois novamente lhe agradeço. – Dana fala, voltando a mexer o mingau na panela de ágata.

Louise se senta, sentindo-se bem à vontade.

-          E aí, Dana? Quanto tempo você está casada com o Fox?

A agente não responde de pronto. Num seu gesto característico, franze os lábios,  parecendo pensar

numa resposta.

-          Eles se amam já quinze anos, desde que se conheceram! O casamento foi somente uma

conseqüência. – antecipa-se a mãe de Dana.

-          Nossa! É mesmo?! Que história linda! Um verdadeiro romance!

-          É, sim! – concorda Maggie – E isso foi em ... em... não me lembro direito!

-          Aconteceu em dezesseis de março de mil, novecentos e noventa e dois. – completa a filha,

sem voltar-se para a vizinha.

-          Viva! Que precisão! – entusiasma-se Louise.

Agora, então, Dana volta-se para olhar a jovem falante. Num relance nota  seu corpo esbelto, pernas

longas como uma modelo de modas, de boa altura, um belo e chamativo tipo de mulher.

Louise, por sua vez, fita a mãe das crianças que costuma tomar conta quando necessário. Observa 

seu corpo pequeno, frágil, pernas bem torneadas, seus cabelos longos, ruivos e sedosos,  rosto com o

perfil de uma deusa grega.

“Não deixa de ser um belo tipo de mulher – ela pensa, levantando a cabeça, colocando o tórax  para

a frente, demonstrando uma certa presunção diante de alguém que pode ser sua rival em beleza;

e continua em seus pensamentos  - Dizem que os homens bem altos têm preferência  pelas mulheres

baixinhas, mas... também existem as exceções...!”

“O sucesso de uma mulher se

 mede pela inveja que desperta.”

Madame de Maintenon