VISLUMBRE NA CONSCIÊNCIA

 

A consciência é uma pequena lanterna

   que a solidão acende à noite.”

 Mme. de Stael

 

Capítulo 274

 

Maggie, com a menininha nos braços, fala ao telefone.

Mulder entra, nesse momento, passando a mão nervosa nos cabelos

desalinhados. Semblante  visivelmente perturbado. Aspecto doente.

Ele fica reparando sua sogra falar no aparelho.

Então aproxima-se, pega a criança para tomá-la em seus braços. Enquanto

segura Vivien,  que suspende os bracinhos em direção de seu rosto,

Mulder sente que as lágrimas afluem rapidamente aos seus olhos,

enquanto seu pensamento solta-se para a amada.

         ´Scully... nossa filhinha... ela precisa de você... seja forte amor,

resista, seja em que circunstância for, mas não deixe que o nosso amor

seja prejudicado pela tragédia... – pára de pensar, fecha os olhos,

respira fundo - ... pela morte....!

Aconchega o bebezinho mais contra o peito. E de seus olhos as lágrimas

caem, agora, livremente, enquanto o rosto se contrai pela tristeza que sente.

Maggie acabara de falar ao telefone. De onde está, permanece, vendo a

penosa cena de seu genro segurando a filha e em pranto.

Logo ele tenta recuperar-se da onda de dor, que o está assolando:

         - Senhora Scully...?

         - Sim, Fox. – ela aproxima-se.

         - Estava falando com o médico, não é?

         - Sim, buscando mais instruções, senão fico perdida. – fala,

com voz entrecortada – Fox... eu estou desesperada... nada de

notícias, ainda?

         - Nada. – responde, fechando os olhos, beijando a testa da

 pequenina filha em seus braços – Pegue-a, senhora Scully,

estou saindo...

         - Mas Fox! Coma, pelo menos algo rápido, pra enganar o

 estômago! É necessário! Temos que sobreviver a esse sofrimento!

         - Não dá! Sinto uma terrível pressão no estômago e não consigo.

Ela abaixa a cabeça, preocupada.

         - Fox... – geme um pouco - ... o que será de nós?

Mulder balança a cabeça, com os olhos perdidos no vazio.

         - Preciso ir. – fala em seguida, retirando-se.

Dirige-se à sala, rapidamente e, para sua surpresa, se depara com

Louise, ocupada em arrumar umas flores num vaso sobre a mesa.

Mulder estaca, surpreso:

         - Oi, Fox! – ela o saúda em voz jovial.

         - Oi. – ele responde, num murmúrio.

A jovem pára o que está fazendo e, num gesto charmoso, leva às

narinas uma das flores que tem na mão. Fita-o, com olhar de desejo.

         - Com licença. Estou saindo. – ele fala.

         - Espera! – ela detém-lhe os passos.

         - O que você quer?

         - Nada...! Só conversar um pouco.

         - Você não tem consciência?

         - Nossa! Que indelicadeza! Eu o trato com tanto carinho!

         - Ei, moça! Conheço as suas intenções e não estou a fim...!

Ela o fita, insistentemente:

         - Sei... mas tudo pode mudar.

         - Ora, cale-se! Não vê que... – ele pára de súbito; sente que

 algo acontece; um vislumbre em sua consciência.

         Não é possível! Não posso acreditar...!” – pensa, movendo

 imperceptivelmente os lábios.

         - Hum...? – ela murmura e sorri – Fox, você é tentador de

todas as formas e em todas as ocasiões. – e vendo-o, absorto,

a fitá-la, prossegue – Ai... você me olhando assim...!

Ele coloca as mãos sobre os ombros dela:

         - Louise... por favor... pra sua casa... não estou bem, física

 nem emocionalmente...! – pede, com voz suave.

         - Ai, meu querido! Você falando assim comigo eu sinto que não

 vou resistir...!

         - E eu também... talvez não resista mesmo...!

Os olhos da jovem brilham:

         - Fala sério?!

         - Por favor, Louise, eu preciso resolver o drama da minha

família. Será que não percebe o que estamos passando?

Diante dessas palavras pronunciadas como um apelo, Louise anima-se

 e, com ar agradecido, achega-se a ele:

         - Posso ter alguma esperança?

Mulder pensa por alguns instantes:

         - Quem sabe...?

Louise aproxima-se rapidamente e, num gesto inesperado, beija-o na face.

Após isso, sai em passos ligeiros e em tentadores requebros.

Mulder passa a mão nos cabelos.

         Estou aqui maquinando uma idéia que não dá pra descartar

da minha mente. Quase inacreditável, mas não impossível, principalmente

nos dias de hoje, onde existe tanta gente insensível!

Com decisão dirige-se até onde está Maggie:

         - Senhora Scully, quero lhe perguntar algo que, por favor, não

pense que estou duvidando de sua palavra!

         - O quê, Fox?

         - Você pediu a chave da nossa casa que estava com Louise?

         - Sim, claro! E ela a entregou ontem!

Mulder forma um bico com os lábios e balança a cabeça, positivamente:

         - Ok. – ele fala.

         - Por que está me perguntando isso? Aconteceu alguma coisa?

         - Não...! – faz um semblante de descaso – Nada não! Foi só pra

 lembrar.

Após essas palavras sai dali.

Os pensamentos surgidos lhe martelam a mente.

         - E por que não? A certeza não me sai da cabeça agora.”

 

*   *   *

 

É madrugada. Madrugada fria e silenciosa.

Mulder chega até a janela. Olha a longa rua arborizada. As casas

vizinhas. Resolve ir para fora. No jardim pára, segurando o queixo

com a mão, pensativo. Permanece no lugar. Olha à distância, no

espaço do céu, as estrelas ainda a brilhar. Um ruído o faz  voltar-se

para o portão.

         - Você...?! – exclama, vendo quem se aproxima – O que faz aqui

 a esta hora?

         - O mesmo que você. – responde Louise.

         - Será que temos os mesmos pensamentos?

         - Sem dúvida, meu querido, sem dúvida. É uma união de

 pensamentos...!

         - Sei... – ele murmura.

Ela aproxima-se, sensual:

         - Ai, estou maravilhada vendo-o aqui, assim, falando comigo.

         - É... – ele a fita, profundamente, como que estudando seu

olhar – Seus olhos... -  ele comenta, num sussurro.

         - O que têm meus olhos?

         - Um enigma...

         - Enigma...? – ela ri - Hum... está querendo ver o quê, dentro

 dos meus olhos?Só vai encontrar amor! Sabe que te amo, não é?

         - Ahn... por mim você seria capaz de tudo... não é...?

Ela hesita por alguns segundos, mas responde:

         - Eu te amo, Fox.

         - Por que alimenta esse sentimento a meu respeito?

         - Porque sei que posso.

         - Pode...?!

Ela disfarça, olhando parao lado, a fim de que ele não a veja com

ar de triunfo.

Mulder passa o dedo acima do lábio superior.

         - Louise... eu...

         - Ai, Fox...! O que é? – anima-se cada vez mais, sentindo ternura

 na voz dele.

         - Estou pensando...

Ela faz um gesto inquiridor:

         - Pensando...?

         - Logo, logo esse sério problema da minha família será resolvido...

         - Sim...? – fica ansiosa.

         - Você verá o que farei... por você.

Ela sorri, encantada:

         - E eu vou aguardar...! – sussurra.

         - Mas antes...

         - Sim...

         - Temos que resolver tudo.

         - Sim, claro! Tudo!! Nos encontraremos  mais tarde, então.

         - E por que não desde agora?

         - Tenho algumas coisas a resolver.

         - Certo.

Mulder a vê sorrir. Acompanha-lhe os passos apressados e sua silhueta

desaparecendo entre as árvores da rua.

 

O sorriso apaga-se como a luz”

R Gomes de la Serna