BOAS AMIZADES

                                                                                                 

“Tirar  a amizade da vida

seria tirar o sol do mundo”

Cícero

 

Capítulo 293

 

Mulder, com seus pequenos e atentos olhos fixos no

sujeito que ali está invadindo a sua privacidade, pergunta

de estalo:

— O que está fazendo esse sujeito aqui?

O homem ensaia um sorriso:

— Que é isso, amigo?! Parece até que está diante de um

malfeitor!

— Convença-me do contrário.

Dana achega-se rápida a ele:

Mulder, por favor!

Burton aperta os lábios, um tanto irritado:

— Olha, me desculpem eu estar aqui assim, atrapalhando

um pouco vocês, mas eu expliquei à doutora Scully o que

me trouxe aqui.

— Não tenho interesse em saber. — replica Mulder.

Dana segura-o pelo braço.

Mulder... — balbucia.

— Por favor, me entendam! Venho como amigo! Preciso de

amigos!

Mulder o fita com ar de escárnio.

— A ilha é bem vasta e tem bastante habitantes, para

que você tente boas amizades.

— Obrigado pela sinceridade. — dá uma risada, com ar

condescendente.

Mulder, ele veio aqui procurar ajuda. — arrisca Dana a

explicação.

— No quê...? — ele pergunta rápido, sem fitá-la.

— Ah, por enquanto não se importe com esse detalhe.

 Depois falaremos melhor, doutora Scully. Prazer em conhecê-la

mais de perto. — ele estende a mão — E mais uma vez obrigado —

agora estende a mão para Mulder.

Porém o ex-agente não lhe retribui o cumprimento.

— Bem... eu vou agora. Até uma outra oportunidade.

Dana e Mulder permanecem calados enquanto o homem se afasta.

Mulder bate a porta, fechando-a estrepitosamente.

— Mas o que esse sujeito pretende vindo até aqui, Scully?

— Ele disse que me conhece do hospital onde trabalho e precisa

de ajuda.

— Ajuda...?! Mas no quê?

— Na verdade não o entendi, Mulder. Ele diz sofrer de uma doença.

— Ah, é? E qual? — pergunta, arrancando fora as sandálias de

couro do pés; pára o que está fazendo; leva o dedo indicador

acima dos lábios e a olha:

— Hum...

— Nossa! Que ar de incredulidade é esse, Mulder?

— Chega! Deixa pra lá esse importuno. Vamos ao melhor que é...

— ... o sorvete!

Ela toma nas mãos a caixa que ele havia colocado na mesa.

— Espera aí. — dirige-se à pequena copa.

Ele a segue.

Dana vai colocando, com uma colher, as porções em taxas inox.

Huuum... que delícia! — geme ele.

— Qual é o sabor? — ela quer saber.

— Eu sei lá, Scully... é indefinido... sei que me leva aos píncaros

do prazer!

Dana se volta para ele, com a colher cheia de sorvete erguida no

espaço:

Mulder... é desse sorvete que você está falando...?

Ele a segura pela cintura para fazê-la ficar presa a seu peito:

— Claro que não, lindinha...

Ela coloca os braços ao redor  pescoço dele, deixando

afluir toda sua sensualidade:

— Ai, Mulder... você me mata!

Scully, o seu trabalho, as preocupações com os acontecimentos

nos afastaram um pouco um do outro. Vamos aproveitar esta

trégua para reatar nossos momentos de amor, Scully.

Dana solta a colher sobre a bancada de mármore da pia.

Enquanto ele fala com sua voz na qual as bolinhas de gude

lhe deslizam na garganta, ela vai pousando os lábios docemente

no peito dele, em vários pontos, como que buscando sentir  algum

sabor.

Ele então a segura pelos cabelos, os dedos entre eles e apossa-se

da boca que o atrai desmedidamente.

Por minutos deixam-se levar ao extremo do desejo. Impulsionados

pela paixão, a qual move seus instintos, eles vão, aos poucos

sentindo que seus corpos exigem as carícias um do outro.

 

*    *    *

Dana abre os olhos. Por segundos sua mente não consegue

identificar o ambiente onde se encontra.

 

“Mãe! Olha, a Vivien pegou meu brinquedo e jogou no chão! Agora

 o meu robô de controle remoto não anda mais!

 

Dana pareceu ouvir a voz de William fazendo queixa da irmã.

Ela olha ao redor; aí então é que percebe que está numa pousada

numa ilha, bem distante de casa.

Mulder ainda dorme virado para sua direção, o que a faz se sentir

tentada a beijá-lo, com carinho, na ponta do nariz. E assim faz.

Ele mexe-se, fazendo uma careta, franzindo o nariz.

— Nossa! Mosca chata! — ela brinca.

Mulder abre os olhos.

Huuum...! — ele geme.

— Sentiu a mosca?

— Mosca...?

— Inseto chato, não?

— Do que você está falando, Scully? — pergunta, sentando-se.

— Disso aqui. — ela explica, depositando novamente os lábios

na ponta do nariz dele.

Aaah... inseto danado! — ele se deita novamente.

Mulder olha para a janela e vê através da ampla vidraça o céu

escurecido. Um vento um tanto forte movimenta as folhas,

causando um farfalhar ininterrupto.

Agora os pássaros já não cantam. Parecem adivinhar o quão

molhados ficarão suas penas, mesmo tentando resguardarem-se

da chuva por entre as folhas das árvores.

— Dana...?

Ela ouve embevecida. Sempre se sentira completamente

emocionada quando o ouve tratá-la dessa maneira.

 Fala, Mulder...! — sussurra.

— Eu queria que a vida nos permitisse ter sempre ocasiões

felizes e em paz como essas que estamos vivendo.

Ela volta-se inteiramente, deitando de lado, na direção dele,

para acompanhar suas palavras.

— Eu quero que a felicidade não se afaste de nós, Scully. —

continua ele.

Ela somente meneia a cabeça, afirmativamente.

Mulder segura as pontas dos longos cabelos de Dana,

levando-as às suas narinas, para lhes sentir o perfume.

Ela sorri. Sente-se deveras feliz estando ao lado do seu amor.

— Hum... estou perfumada?

— Sim... e como!

— Quer saber de um segredo?

— Conta.

— Estou com um perfume que é usado por aquele ator da

série que acompanho... aquele que é a sua cara!

— O quê, Scully? Que negócio é esse? — irrita-se.

— Qual o motivo da irritação, Mulder? O que tem isso?

— Ah, Scully, você está me saindo uma fanzoca de artista.

Que idéia!

— Fui sugestionada por alguém.

— Como assim?

— Uma fã do ator quase desmaiou de emoção ao vê-lo entrar

no elevador em que estava.

Humpf... que frescura!

— Espera aí; deixa eu contar... então ela sentiu que o

ambiente foi impregnado com o gostoso perfume daquele

homem que ela tanto admira.

Argh! Mais que coisa mais ridícula!

— Posso continuar, Mulder? — ela aguarda por segundos.

, fala.

— Então eu comprei também o tal perfume, que é esse

gostoso que você está sentindo.

— Eu não disse que era gostoso. — fala amuado.

Aaaaaaaaaaah, meu amado! Você gostou, sim! Só está com

 ciúme.

— Ciúme... eu?

— Pode deixar que eu vou comprar um pra você. É da Carolina

Herrera.

— Obrigado. Dispenso o presente.

— Mas que bobo! Pára com isso!

Neste momento ele aperta mais os olhos pequenos

 para fitá-la, concentradamente.

— O que é, Mulder?

— Estou analisando você... espera...

— Ah, e essa agora! .  Tudo bem. Faça o que quiser

comigo, então.

— Agora somente quero estudá-la, Scully... espera... ahn...

bem, deixa ver... seu nariz....

— O que tem ele?

— É o seguinte: de acordo com o tamanho e forma dos

ombros, nariz, seios, cintura, queixo, etc, demonstra como

está o seu interior e seus conflitos mais íntimos.

— Nossa! Então me fala... me analisa! Quero saber.

. Mas vai ficar pra depois, porque antes quero saber o

que está querendo me dizer.

— Eu não...

— ... está sim. Você está cruzando as mãos. Está me

dizendo que aceita  o que estou lhe falando. — ele espalma

a mão — Agora você está nervosa.

— Nervosa... eu?

— Sim; mordeu os lábios.

Ela ri divertida. Concentra-se logo após.

— Ah, agora sim!  — ele fala entusiasmado.

— O que foi?

— Você está olhando para minha boca; é um gesto de sedução.

Dana lança o olhar adiante, num leve movimento das sobrancelhas.

— Isso! Eu acredito, lindinha! Acertei?

Ahn...? O que você disse? Eu não respondi nada! Nem em

pensamento!

— E nem precisa. Seus olhos me falaram exatamente a verdade.

— Como...?!

— Sim. Você lançou o olhar para a esquerda.

— Ora essa! — ela dá uma risada — E se fosse para a direita?

— Aí seria outra história. Depois eu conto. — ele se levanta.

— E a análise do meu corpo, Mulder?

— Vou fazê-la, lindinha. Mas agora vou tomar um bom banho.

 Me aguarde.

 

“A história é filosofia em exemplos.”

D. de Halicarnaso