SORTE ENCONTRA-LA
“A sorte é como o raio;
nunca se sabe onde vai cair”
Frank Crane
Capítulo 295
Dana vai escolhendo, um a um, os frutos expostos na extensa banca
do hortifruti.
Aos poucos ela vai colocando no carrinho de arame os inúmeros
e coloridos frutos. Sua mão neste momento segura um cacho de
uvas; num segundo o grande cacho solta um de seus galhos.
Dana tenta segurá-lo
no ar.
Uma providencial e rápida mão faz o que Dana tentara sem conseguir.
Apanhara o cacho no
ar.
— Sorte encontrá-la
aqui, doutora Scully.
Ela não responde,
sentindo irritação pelo encontro.
— Será que pode haver
uma chance de conversar um pouco com você?
Dana dirige o olhar na
direção dele:
— Estou certa de que
não temos nada a falar, senhor...
— Nossa! Como você é
categórica! Sabe que temos, sim doutora!
Ela franze as sobrancelhas e volta a escolher os frutos. Coloca-os numa
sacola e entrega o dinheiro
ao vendedor que aguardava para atende-la.
— Obrigada. — ela
agradece e começa a afastar-se.
O homem louro a
acompanha:
— Doutora Scully, por favor me dê atenção por um instante! —
ele pede, segurando-a
fortemente pelo braço.
— O que deseja? — pára
de caminhar, a fim de ouvi-lo.
Ele a fita
intensamente.
Dana se sente perturbada. Tem a impressão de que esse olhar tão
concentrado nela lhe traz ordens mentais. É a nítida impressão
que tem no momento.
— Pois não. Pode
falar. — ela começa.
— Olhe, doutora Scully, como já lhe disse, preciso muito de sua ajuda.
— Pode contar comigo.
— Ótimo. Você é uma
mulher inteligente.
— Obrigada.
— Bem... antes de mais nada preciso que me acompanhe até o hotel
onde estou hospedado.
— Até o... hotel...?!
— Sim, isso, linda doutora. É necessário que conversemos sobre
um assunto serio.
— Assunto sério...?!
— Isso.
— Eu o acompanho até o
hotel. — ela fala.
O homem apenas sorri para ela e com um gesto de cavalheiro
mostra que vai caminhar
ao seu lado.
* * *
Mulder, na pousada, tenta manter os olhos abertos enquanto vê a
desinteressante programação da tv.
Seu pensamento o faz
olhar o relógio.
— Scully...?
— murmura.
Levanta-se
rapidamente.
“Por que ela está demorando tanto? — pensa — Bem, na certa
fazendo compras para levar para as nossas crianças... — pega
o celular para chamá-la
— Droga! Desligado! — exclama.
Respira fundo. Resolve esperar com paciência. Joga-se numa
poltrona e fica observando
lá longe o horizonte e sob ele o mar azul.
* * *
No quarto de hotel Dana está sentada quietamente; aguardando
as palavras de Burton.
— Doutora Scully, quero lhe falar agora: sofro de um mal que me
consome as forças e em consequência, a paciência. — ele explica,
servindo duas taças com
uma bebida.
— Quais os sintomas
que sente?
— Os músculos do meu
corpo. Muita canseira!
Ela ouve sua
narrativa.
— Começou quando, certo dia, ao mastigar um alimento,
em questão de segundos,
senti uma enorme fraqueza...
— Sei. —diz ela — Com certeza também sente enorme fraqueza
nas pálpebras como se
estivesse...
— ... dopado?
Exato!Sinto-me exatamente assim!
— É uma doença em que certos músculos do corpo se apresentam
normalmente debilitados.
— Isso mesmo! É como
se estivessem assim. Que doença é essa?
— É carência de uma substância que transmite instruções dos
nervos para os músculos.
Burton a fita,
assustado:
— E tem cura isso?
—Sim! Sem dúvida.
Ele morde os lábios;
parece refletir um instante.
— Doutora
Scully, preciso do seu auxílio.
Dana dá alguns passos, recuando e voltando o olhar para um quadro
na parede.
— No que lhe posso ser
útil? — pergunta sem olhá-lo.
— Mas que modo mais desconsertante de tratar um cara doente,
doutora!
— Você não está
prestes a morrer, senhor Burton.
— Ora, ainda bem, mas
preciso de sua atenção.
Dana o fita, levantando as sobrancelhas.
— Olhe pra mim, por
favor!
Ela atende
o pedido dele.
— Doutora Scully, quero que me atenda. — ele segura sua mão
com força.
Dana sente o olhar dele sobre si. Ouve-o falar como se estivesse
noutra dimensão. Acha
bem estranho.
— Entendido
doutora?—ouve-o perguntando.
— Ahn...?
Ah, sim, entendido.
* * *
Mulder vê Dana chegando carregando sacolas
de compras.
— O que houve? —
pergunta.
— O que quer saber? — ela pergunta, por sua vez, com ar
desinteressado.
— Só acho que demorou
demais! Estava preocupado.
Ela nada fala e tira das sacolas seu conteúdo e vai colocando tudo
na mesa.
— Até imaginei que você estivesse fazendo compra de presentes
para as crianças. Sculy, se você quer ir àquele restaurante que
fica à beira da praia,
então a gente...
— Não quero ir a lugar
nenhum.
— Desistiu, é? — ele faz um gesto com as mãos andando pelo
aposento — Ah, tá. Mas você é que queria ir lá à noite pra
contemplar a lua! — conclui
sorrindo, num gesto de gozação.
— Não quero ir. — responde, sem sequer
olhar para ele.
— Então tá, lindinha. Ao invés de ir contemplar a lua na praia,
podemos curtir aqui mesmo
nossos momentos de paz.
Dana, após esvaziar as
sacolas, dirige-se ao outro aposento.
Mulder a segue.
— Vamos nos fartar com
essas frutas!
Dana nada fala, então.
Mulder coça o nariz e faz um bico com os lábios. Aproxima-se
dela para falar:
— Escuta, Scully... — segura-a pelos ombros — ... o que está
acontecendo com você?
Ela desvia o olhar, levanta
as sobrancelhas e faz um gesto de enfado.
— Scully,
estou falando com você! — ele insiste,
nervoso.
Ela, suave, mas decididamente, retira as mãos dele que estão sobre
seus ombros.
— Mulder,
por favor, eu
estou cansada; preciso deitar um pouco.
— Deitar...?! — surpreende-se — está sentindo alguma coisa?
— Irritação. —
responde secamente.
— Pois então me conta!
O que aconteceu que a irritou, Scully?
Ela balança um pouco a
cabeça demonstrando impaciência:
— Você, Mulder, me irrita com essa... — não conclui
e nem o fita.
Ele levanta as sobrancelhas, tentando entender a grosseira resposta
dela.
— Por favor, Scully, não me faça lembrar algo desagradável de há
pouco tempo atrás que
passou-se entre nós.
— Qual fato? — ela
pergunta, sem demonstrar nenhum interesse.
Mulder não alonga o assunto. Não gosta de lembrar certas
palavras que foi obrigado a usar meses
atrás:
“ Por isso não podemos ficar juntos”.
Pronunciara naquela
ocasião, com o coração ferido.
Mas ele resolve aproximar-se,
demonstrando um ar paciente:
— Scully,
fala comigo; algo aconteceu que a deixou assim...
—... assim, como? O que quer dizer? Olha, me faz um favor; procura
alguma coisa pra fazer
e me deixa em paz.
— Scully!! — ele murmura, sem conseguir compreender tais
palavras; fita-a por alguns segundos, esperando que, pelo menos, ela
volte o olhar para ele — Por que você não olha pra mim? — e a
segura pelos ombros.
Ela continua sem
fitá-lo.
— Mulder... por favor, já pedi, quero ficar sozinha...! — murmura, com
decisão na voz.
Ele retira as mãos dos ombros dela, deixando que os dedos saiam dali
deslizando sobre seus braços. Suspira. Aperta os lábios.
Afasta-se dela. E tomando de uma cadeira um casaco, apanha as
chaves do carro e sai.
“Não, Mulder! Oh, meu Deus! Não o deixe ir, por favor! Mulder! Mulder!”
Essas são as palavras que lhe saem em pensamento, lá do fundo
da alma, implorando
ao Senhor a presença do homem que ama.
“Deus é a verdade
e a luz sua sombra’
Platão