COMO ACONTECEU...?

“O medo de um acontecimento é

sempre mais insuportável que   o

próprio acontecimento.”

Stefan Zweig

 

Capítulo 324

 

O professor Janssen, atarefado em seu trabalho no laboratório,

ouve com desagrado o toque do interfone na parede próxima. Atende, com mau humor:

— Que que é agora?

— Professor, o Diretor Skinner, do FBI está aqui e quer lhe falar.

O cientista, com ar de desagrado, quase bufando, responde ao funcionário que havia lhe falado:

, . Pede pra aguardar só um instante! — repõe o aparelho no gancho.

— Era só o que me faltava! — resmunga.

Com um gesto rápido pega um pano e com ele cobre a mais importante máquina da sua sala de pesquisas, que é o portal dimensional.

Entram na sala o Diretor Skinner com William e mais dois Agentes Federais.

— Ora, ora, por que e para quê uma criança envolvida num assunto tão sério? — exclama o cientista vendo a chegada de um menino

junto aos três Agentes.

— Porque eu sou filho daquele casal que desapareceu! — responde o menino, sem titubear.

— Eu sei, eu sei, menino, mas é que isso é um assunto conveniente somente para adultos!

Skinner segura William pelo braço:

— Bem, Professor Janssen, acontece é que o rapazinho quer ouvir do senhor como é que aconteceu o desaparecimento dos pais dele.

— Como aconteceu...?!

— Exato, senhor, quero que me conte. — completa o menino.

O homem faz cara de poucos amigos, para falar:

— Senhor Skinner, tudo bem que na verdade o senhor tem todo o direito de averiguar o desaparecimento de seus Agentes, mas no lugar

adequado, não aqui, no meu laboratório!

— Compreendo, Professor, mas o FBI tem que procurar cada caminho pelos quais passaram os meus Agentes e este lugar foi um deles.

— Que bacana! — exclama o garoto.

— Do que está falando? — quer saber o cientista.

— É um espetáculo isto aqui! — diz William, olhando ao redor.

O cientista faz vir à tona sua vaidade:

— Sim, menino, a ciência é uma coisa fantástica e necessária à humanidade! Pode criar inúmeras condições para o mundo, para a criação,

para a natureza! — fala entusiasmado.

— Posso olhar esses aparelhos?

— Claro, menino!

E enquanto William se afasta para aproximar-se dos aparelhos posicionados por toda a extensão da grande sala, o Professor Janssen conversa

com Skinner.

William segue em sua curiosidade. Absorto e admirado, vai fazendo sua inspeção pela sala.

Mas uma enorme máquina coberta com um pano lhe chama a atenção. Isso porque nela uma espécie de porta com inúmeros botões em redor se

 mostra bem diferente das demais.

Porém o pano  cobre toda a visibilidade melhor da máquina e isso incomoda o filho de Mulder e Scully. E, com muita discrição, levanta um pouco

a beira do pano para ver melhor a enorme máquina ali, à sua frente.

Ei, garoto! Não pode mexer aí, ok? — berra o cientista.

— Desculpe-me, Professor... — fala William — Mas posso lhe fazer uma pergunta?

— Naturalmente. — responde, sem o olhar.

— Essa máquina serve para o quê? O que ela faz?

— O que ela faz? — passa os dedos na barba — Meu jovem... — dá umas passadas lentas — ... dentro do laboratório de um cientista só existem

aparelhos especiais, quase fantásticos. Você já aprendeu algo sobre Arquimedes, que descobriu a força ascensional...?

— Sim... — imediatamente interrompe o garoto — ... e foi ele que, quando fez a descoberta da força ascencional, pulou da banheira e gritou:

HEURECA!! que quer dizer ACHEI! — explica, com todo entusiasmo.

O cientista, com a testa franzida, a mão segurando o queixo, está quase sem acreditar no que vê: uma criança tão esperta e inteligente diante

de si. Então recomeça a caminhar.

— Bem... existiu Galileu, Robert Hooke... sabe desses também?

— Sei, senhor. Galileu Galilei descobriu que outros planetas também têm luas e...

Hooke, em 1665 descobriu... — o Professor fica esperando a resposta, fazendo um ar de ansiedade.

— ... a existência das células em todos os organismos vivos.

— Fantástico...! — murmura o cientista.

— Também acho. — fala William naturalmente.

O Diretor Skinner está à parte com as feições paralisadas pela surpresa de ouvir as palavras cheias de sabedoria do filho de seus Agentes Mulder

e Scully.

O Professor Janssen entusiasma-se mais ainda. Já havia percebido que o pequeno nem reparara que a frase de admiração que o fizera murmura

a palavra “fantástico” referia-se à sabedoria do garoto que está diante de si.

— Meu jovem, estou simplesmente abismado com seu conhecimento!

— A mãe dele é médica... — apressa-se em explicar Skinner.

— É... minha mãe é médica e meu pai um psicólogo e ambos são muito inteligentes... por isso é que nasci assim. — gaba-se o menino.

O cientista sorri, passa os dedos sobre a amarfanhada cabeleira e continua:

— Quero conversar mais com você.

. — responde simplesmente.

— Sabe garoto, o nosso pequeno e insignificante planeta, localizado na borda exterior de uma galáxia de tamanho médio que contém bilhões de

planetas, não é o único que comporta a vida e...

— Sei disso, Professor. — o menino corta a fala do cientista — O meu pai sempre cita uma frase de um filósofo do século IV Antes de Cristo.

O homem, incrédulo, pára diante do menino:

— E sabe me dizer essa citação do filósofo?

William, levanta a cabeça e os ombros em atitude de extrema segurança, para dizer:

— “Supor que a Terra seja o único mundo no espaço infinito é tão absurdo como acreditar que, num campo inteiro semeado de cereais, somente

um grão crescerá nele.”

O Professor Janssen aproxima-se de William, estende a mão para ele:

— Parabéns! Você é um jovem inteligente e sagaz. Terá um futuro brilhante!

— Obrigado.

Skinner, movimenta os óculos em seu rosto e levanta as sobrancelhas, ao estar diante de tanta sabedoria numa criança de apenas 12 anos de idade.

— Senhor Skinner, gostei de conhecer esse capacitado rapazinho, filho dos Agentes. Obrigado.

— Ok, professor. — ele mal tem como falar algo no momento, pois também está surpreso com a sabedoria de William.

Neste exato momento um homem transpõe a porta do laboratório.

Ei! Neil! Como pode ser isso?! Como você voltou, cara?

O rapaz olha para um lado e outro, sem entender a pergunta:

— Voltei... de onde, Professor? Eu estava naquela missão a qual o senhor me havia dado.

— O quê? Então quem estava com Carl aqui no laboratório naquele dia?

— Que dia?! — o rapaz não entende.

— O dia em que vocês... — pigarreia, sem jeito — ... sumiram?

— Sumiram...? Ângela e Carl sumiram? E foi através da...?

O cientista pigarreia insistentemente e coloca a mão fechada na boca, fingindo abrandar o ruído de uma tosse.

— Sumiram, entende Neil? Eles saíram daqui e não mais foram vistos... entende? — coloca a mão no queixo — Então era Ângela que estava com ele...!

 — reflete — Eu não tinha certeza ainda.

— Sim! Eu já havia saído para...

— Sei, sei, sei!! — corta a frase apressado — Senhor   Skinner, por favor, eu preciso continuas minhas pesquisas e naturalmente concordo que temos

que procurar meus funcionários e os seus dois Agentes... — abaixa o tom de voz — mas preciso trabalhar.

— Claro Professor.

O cientista experimenta mais uma vez os conhecimentos de William:

— Me diga, meu rapaz, o que significa a palavra “antibiótico”?

— Vem do grego e significa “contra a vida”.

— E quem descobriu a vacina? — continua o homem.

— Na Inglaterra, um homem e uma mulher em 1798.

— E a anestesia, garoto? — o cientista insiste, tentando ver se William desiste de responder.

Humphrey Davy em 1801.

O Professor Janssen nem se move, olhando fixamente para o menino, completamente admirado pela sua sabedoria e determinação.

William retorna os passos até a máquina da qual deseja saber mais.

— Professor, por favor, mostra pra gente o que essa máquina faz? Acho ela diferente! — pede, então.

O cientista levanta as sobrancelhas, franze os lábios. Parece incomodado com o pedido do menino.

O Diretor Skinner repara no interesse de William. Resolve reforçar o desejo dele e ao mesmo tempo exigir do cientista uma resposta. Havia notado que

o Professor Janssen está enrolando, para não dizer para que serve a máquina e assim o  pressiona, dizendo:

— Professor Janssen, lhe sugiro dar as devidas explicações ao menino. E eu também  quero saber qual a utilidade dessa máquina.

William meneia a cabeça positivamente, satisfeito com as palavras de Skinner.

— Pois é, a gente falou nesses gênios que fizeram essas grandes descobertas e ... pois é ... — dá uma risadinha — ... não é o meu caso. Não sou um inventor

tão criativo. Isso é apenas um detector de metal e vai ser instalado um visor nele, o que ajuda a saber se o formato do metal corresponde a alguma arma,

para evitar constrangimento de uma pessoa ao ter que retirar o celular, chaves e outros itens ao passar por uma porta.

— Bem interessante! Como funciona seu sistema? — fala o menino.

— É um segredo industrial; nem o patenteei ainda, meu jovem!

— Por favor, então faça uma demonstração, Professor. — insiste agora o Diretor do FBI.

— Como eu falei, ainda não instalaram o visor. Infelizmente não vai ser possível uma demonstração do que ela faz.

Skinner aceita a explicação, com um gesto sutil de cabeça.

Em seguida puxa William pelo braço e ambos saem do laboratório, despedindo-se do cientista.

— Sabidinho o menino, hein, Professor? — comenta o auxiliar do cientista.

Este nada comenta, acompanhando a saída dos dois visitantes, enquanto segura o queixo, coçando um pouco a barba.

Retorna após, com um ar um tanto preocupado.

— Neil...?

— Sim, Professor?

— Precisamos ter cuidado com ele.

 

A sabedoria é o contrapeso

necessário da liberdade.

Tullegrand