RELEMBRANDO O PASSADO
"O tempo
está passando rápido e o passado
fica cada vez
mais distante."
Fernanda M.
Machado
Capítulo 336
As ondas quebram na areia branca da
beira da praia como renda adornando seu contorno.
Da varanda, Mulder sentado, segurando as
pernas com os olhos fechados, fica a escutar o barulho do mar.
— Dana...?
Ela o fita, admirada; suspende os
braços, continuando deitada na poltrona larga, ao lado dele.
— Nossa! É tão raro você me chamar
assim!
— Pára,
Scully! Não exagera!
Ela dá uma risadinha:
— Verdade, Mulder! — suspira e fica
alguns segundos em silêncio, deixando ser ouvido o marulhar das ondas —
Sabe...?
— O que?
— Na minha mente estão vindo os
primeiros momentos que nos encontramos, lá pelo início dos anos 90.
— Hum... por que fala isso?
— Claro! Você estava tão...
— ... o quê?
— ... presunçoso...! Me recebeu ali com
pouca vontade...!
— Exagerada você!
— Nunca esqueci aquela frase: "Tive a impressão de que veio aqui para me espionar!"
Ele dá uma risada:
— Eu estava inspirado.
— Ah, sei! Inspirado pra me ofender com
seu modo sarcástico de ser!
Ele se volta pra ela e deita a cabeça
sobre seu peito:
— Não, lindinha, eu estava é fascinado
com aquela figura linda e sedutora diante de mim!
— Ah, sim! — pigarreia, demonstrando
incredulidade.
— Verdade! Embora eu me fingisse
distante o tempo todo do seu fascínio, por dentro o desejo era... — beija-lhe
levemente os lábios.
Ela sorri.
— Mentiroso!
— Você é que não dava a mínima pra mim!
— Eu...?!
— Sim. — se deita novamente, mirando o
mar — Quando um dia você estava no telefone com um semblante muito romântico.
— Imagina uma coisa dessas, Mulder! Eu
não tinha ninguém!
— Tinha sim. Você atendeu o telefone
ansiosa para um encontro com um cara!
— Ah! Ah! Ah! Aquilo não deu em nada!
Não pense que...
e vou lhe falar uma coisa: não gostei do
que me falou naquela ocasião.
— Ih, nem lembro! O que foi?
— Você não lembra, mas eu nunca esqueci!
— É mesmo? E que foi que falei?
— Você não só ofendeu a mim, mas a todas
as mulheres. — pára um pouco — "Desde que o mundo é mundo as mulheres são
feras." —
ela o fita — Engraçadinho!
— Eu disse isso?
— Claro! Acha que estou inventando?
— Mas Scully, você é uma fera!
— O quê?!
— Lógico que é! Você me caçou, me
devorou o meu ser...!
Ela o agarra, agitada.
— É disso
que eu gosto, lindinha; desses seus ataques.
—
Continuando a relembrar o nosso passado, lhe digo que aquela tal mulher que
ficou lá no Reino Encantado me deixou cheia de ódio!
— Entendo,
Scully...
— É;
entende... eu sei... e não só essa fulana me causou ciúmes!
— Sei disso
também.
— Viu como
você sabe e entende?
— O fato é
que eu beijei aquela mulher porque eu já havia
tido
um caso com
ela e...
— ... tá,
Mulder.
— Bem que
você não sabe, mas ela me disse uma frase que achei interessante naquela hora.
— É mesmo,
é? Era a meu respeito?
— Sim.
Ela se joga
novamente para cima dele:
— Fala logo,
anda!
— Não sei se
devo...
— Pára com isso! Quero saber!
— Foi bem
engraçado ouvir porque eu não tinha idéia que tal
coisa poderia estar acontecendo partindo de você.
— Por que
não me diz logo? Que droga! Fala!
— É... e a gente estava trabalhando junto há
quarenta e nove dias.
— Meu Deus,
Mulder! Como você sabe disso? Você contava o tempo?
— Eu fazia
isso, sim! — ele a agarra com força — Contava os dias, sim! Eu já te
amava, Scully!
— Eu sentia
o seu olhar, Mulder...!
— E mesmo
assim me fazia entender que não estava nem aí para o que eu sentia!
— Mulder...
Ele não a
deixa terminar a frase; toma-a apertada entre os braços.
Ela geme de
prazer e o beija no pescoço.
— Mas fala o
que a Phoebe falou pra você.
— Disse
assim, referindo-se a você: "Ela me odeia!"
— E acertou
em cheio!
Ele a aperta
novamente nos braços:
— Scully,
quando você foi levada...
— ... um
horror na minha vida...!
— ... eu
tive um ódio tão grande do Duanne! E acabaria com ele
se não conseguisse me conter. Ainda bem que outro o matou.
— Krycek?
— Sem
dúvida. — agora se volta para olhar o céu estrelado — Estou lembrando...
— ... do
que?
— Fiquei
assim... do jeito que estou agora, fitando o céu escuro, o brilho das estrelas,
imaginando como estaria você lá no alto, entregue àqueles seres...
— Não lembra...! Não lembra! — esconde o
rosto entre as mãos — Foi horrível, meu Deus!
— Agora quero te falar uma coisa:
naquela ocasião, num encontro com sua mãe, tirei do bolso seu cordão com a
cruz...
— ... sei; você me entregou ele depois.
— Pois é; só quero te contar que disse à
senhora Scully que não imaginava que você, tão cética, tinha uma crença, fé em
Deus.
— Exato;
Deus é o que me dá forças para enfrentar
tudo na
minha
existência.
Mulder agora a agarra cheio de paixão:
— Scully,
faz de conta que acabamos de nos conhecer.
Ela se deixa
beijar no rosto, pescoço e os dois se deixam embalar por seu ardente amor.
Mulder vai
passando os lábios no pescoço de Dana, que treme de prazer.
— Te
amo. — ela sussurra.
— Você é a
mulher da minha vida, Scully. O homem não controla o próprio destino; é a
mulher de sua vida que faz isso para ele.
— Essas
palavras não são suas, Mulder! — fala rindo.
— Nietzche.
— Ah, bem
que eu sabia!
— Scully, —
desliza os dedos entre os longos cabelos dela — presta bem atenção do que
guardei na memória desde que assisti um filme; presta atenção:
"Amar é sofrer. Para evitar o sofrimento, não se
deve amar. Mas então se sofre por não amar. Portanto, amar é sofrer, não amar é
sofrer, sofrer é sofrer. Ser feliz
é amar; logo, ser feliz é sofrer. Mas o sofrimento
deixa a gente infeliz, portanto para ser infeliz se deve amar ou amar para
sofrer ou sofrer por excesso de felicidade."
— Huum... sofrer por excesso de felicidade. Gostei. Acho que
está acontecendo comigo, ai...ai!
Os dois se
abraçam, ardorosos.
— Scully,
como a gente está relembrando os velhos tempos, quero te falar uma coisa: eu
ficava confuso com sua personalidade logo que a conheci.
— Por que
diz isso?
— Eu ainda
não entendia bem quando a via, nos momentos mais complicados de nosso trabalho
ou mesmo conversando, você, naquela atitude de cruzar os braços.
— E qual é o
problema?
— O problema
é que você se fechava, se protegia e também porque discordava do que eu dizia.
— Significa
isso tudo?
— Claro. De
uma forma geral é uma posição defensiva.
— Sou assim?
—
Exatamente.
— Posso
então falar algo que você faz sempre.
— Diga,
lindinha.
— Você morde
os lábios sempre que pode. É o quê? Nervoso apenas ou significa alguma coisa?
Ele dá uma
risada:
— Acertou,
Scully! Nervosismo está em primeiro lugar, mas também é quando sinto sensação
de impotência diante de um problema que não consigo resolver.
—
Interessante...! Naqueles tempos antigos você, além de fitar meus olhos, fixava
o olhar na minha boca. Significa...?
— ...
sedução. Mas também, às vezes significa dificuldade para compreender o que o
outro fala. No entanto posso dizer que no seu caso é que esse meu gesto
sempre
significou isso: — cola os lábios nos dela e em seguida faz um gesto para se
levantar dali — Vamos entrar, Scully,
a noite está ficando muito fria
agora.
Ainda
que haja noite no coração,
vale
a pena sorrir para que haja
estrelas
na escuridão
Arnaldo
Padovani