SINTO FALTA DOS MEUS PAIS
"Nossos pais não eram melhores do que nós;
eram simplesmente menos complicados e mais
felizes."
Thuneton
Capítulo 347
O entardecer
lento e ininterrupto continua.
O homem anda
a passos largos no ambiente. Está altamente nervoso e fala para a mulher:
— Escuta
aqui, não consigo me acalmar com essa situação; afinal o que vamos fazer?
— Estou
também perplexa! Não sei, realmente, Dave.
— Por que
foi aparecer esse menino no nosso caminho para nos criar problemas? Temos nossa
família, temos nosso trabalho — reclama de mal humor — Você vê? E aí, como
fazer diante
desse dilema? Logo vai chegar a noite e estamos em poder de uma criança
desconhecida! E aí?
— Eu não
sei... eu não sei! — ela prende a cabeça entre as mãos, demonstrando aflição.
— Vamos logo
por em nossa cabeça que esse menino tem que dormir aqui hoje. Somente amanhã é
que vamos conseguir ver de onde veio e para onde ele tem que ser mandado.
— É o jeito!
É o jeito!
* * *
Os dois
garotos ficam olhando William que tem lágrimas escorrendo pelo rosto.
Logo um
vulto está à porta:
— O que
houve? — pergunta a recém chegada.
— Nada... —
o menino murmura.
Gilly se aproxima e o acaricia nos cabelos:
— Vamos
lá... me diga o que está acontecendo.
— Sinto
falta dos meus pais...!
Ela o aperta
em seus braços:
— Entendo
perfeitamente, querido. Mas logo, logo você estará nos braços deles.
— Me ajude!
— ele se agarra ao corpo dela, aos prantos.
* * *
O carro
estaciona junto ao gramado da casa.
As crianças
logo ficam prestando atenção ao recém-chegado.
— É o tio
William! — grita o garoto menor.
— Olá! —
fala o homem, abaixando-se para abraçá-lo.
— Vem! — o
menino o puxa pela mão, para entrar na casa — Mãe! — chama ele a dona da casa.
Dave surge à
porta com um sorriso.
— E aí,
amigo? Tudo bem? — o visitante o cumprimenta.
— Estava já
achando que você não viria!
— É que tive
que resolver um caso antes, mas já estou aqui.
— Vamos
entrando, William. Estou pedindo sua ajuda porque estou com um caso
extremamente absurdo para resolver e como você conhece pessoas que possam
resolvê-lo, o
chamei até
aqui.
Sentam-se na
sala.
— Qual é o
caso, Dave?
— Uma
criança que encontramos.
—
Encontraram... como?
— Na rua,
simplesmente. Numa movimentada pista de trânsito, só vendo para crer. Está
perdido e não conseguimos devolvê-lo à sua família.
— Está
certo, mas estão aí as entidades especializadas nesses casos.
— Sei disso,
William! Mas a questão é que nada conseguimos! Já fui em vários lugares e até
Polícia e não resolveram nada. Acredite!
— Não será
filho de alguma família moradora de rua? Aí então se torna mais difícil de se
encontrar, mas sempre há um jeito.
— Negativo!
Estou lhe falando que a Polícia já fez de tudo. Olha, a ajuda que preciso de
você é porque você tem um amigo psicoterapeuta, certo?
— Certo. E
você acha que o menino está precisando de tratamento?
— Nem tem
que ser um tratamento e sim algo rápido, concreto, porque há uma extrema
necessidade na solução desse caso.
— Bem,
acredito que meu amigo Thompson vai resolver isso.
— Assim
espero. Por isso pedi essa ajuda a você. — agora ele caminha e dá um sorriso —
Uma coisa engraçada...
— O quê?
— O menino
tem seu nome.
O idoso
homem dá uma risada.
Nesse
momento a mocinha da casa entra na sala.
— Oi, Perla! Tudo bem com você, menina?
Ela o
abraça, sorridente.
Logo entram
os outros dois garotos filhos do casal.
— Dave, suas
crianças estão ótimas! — diz o visitante.
O outro
sorri, agradecido.
A mulher
chega até a sala. Segura pela mão o menino William.
O visitante
a cumprimenta, levantando-se para abraçá-la.
Nesse
instante o menino se solta da mão dela e se coloca às suas costas, com ar
apavorado.
— Senhora Gilly! Cuidado! Esse homem aqui?! Cuidado!
— O que está
falando, William? — diz o dono da casa.
— Senhor
Dave, esse homem é um inimigo!
O visitante
ergue as mãos, num gesto pedindo complacência.
Os olhos do
menino, arregalados e com ar furioso, continuam fixos no idoso homem.
— O que está
acontecendo com esse garoto, gente? Eu nem o conheço! — queixa-se o homem.
— Claro que
conhece! Você sempre quis destruir minha família com sua maldade, mas não
conseguiu, nem conseguirá, ok? — brada o garoto com convicção.
O homem
tenta se aproximar de William.
O garoto
recua os passos, ainda com olhar furioso.
— Por favor,
menino, pára com isso! — pede Dave autoritário.
Gilly se aproxima dos dois homens:
— Calma,
gente, calma...! — ela pede — Eu sei o motivo da confusão e você também sabe,
Dave.
Ele a fita
com seu olhar desvendador de pensamentos.
— É o que
estou pensando?
—
Justamente. — ela afirma, apertando os lábios.
— Bom
pessoal, eu estou aqui sem entender nada do que está se passando! Não conheço
esse menino, nem os pais dele.
Gilly sorri, com os lábios ainda apertados, para em seguida
explicar:
— O William,
esse rapazinho aqui — aponta o menino — diz ser filho de Fox Mulder e Dana
Scully, entendeu?
— Como é...?
Quem são...?
— Ei! Não
está lembrando da série que filmamos durante nove anos na produtora Fox?
— Ahn...? — admira-se o idoso — Ah, claro amigos, a série
Arquivo X, que tinha os Agentes do FBI e eu era...
— ... o
Canceroso! — murmura Gilly, junto dele.
O menino
continua fitando o visitante com ar de poucos amigos.
Agora
William, o homem que os está visitando, dá uma risada:
— Entendi
agora Dave, porque você falou sobre meu amigo terapeuta.
— Isso,
William.
— Por que o
chama de William, senhor Dave? Por que? — reclama o menino, revoltado.
Dave se
volta para fitar o garoto por sua reclamação:
— Esse é o
nome desse senhor, entende William? Ele se chama William B. Davis e foi nosso
colega de trabalho na série que fizemos, desempenhando o papel de Agentes do
FBI,
entende?
— Mas... —
balbucia o garoto.
— E ele é
nosso amigo, frequenta nossa casa e assim como eu e o Dave, trabalhamos juntos
naquelas filmagens da série que você conhece, William. — explica Gilly.
— Mas ele é
o Canc... — tenta reclamar novamente.
—Sim! Isso
mesmo! Lá, naquelas filmagens, naquele árduo trabalho que enfrentamos durante
nove anos, ele era um homem mau, inimigo, mas na vida real não é nada disso;
merece
respeito e atenção. — ela continua.
— Garoto,
ponha na sua cabeça e no seu coração que eu não sou aquele homem. Sou apenas um
ator; velho, mas ainda firme! — conclui William Davis sorrindo.
— Entendeu
agora, William? — pergunta Dave.
O menino,
fitando o homem idoso, pisca várias vezes, para depois balbuciar:
— S... sim.
É então, um
momento de descontração.
Perla se aproxima para avisar:
— Mãe, já
está providenciada a mesa com um belo lanche para o nosso querido amigo! —
anuncia, entre sorrisos.
— Ok, filha.
— diz Gilly, encaminhando todos para a sala de
refeições.
William, o
visitante, coloca a mão sobre o ombro do garoto, tratando-o com carinho:
— Vamos lá,
menino. Nossos amigos são muito legais.
"O sorriso apaga-se como a luz."
R. Gomes de la Serna