EU O ODEIO!

 

"O ódio tem pressa de vingança."

C. Diane

 

Capítulo 352

 

William continua correndo; em certo momento sente que seu pé escorrega para um buraco existente no asfalto.

— Ah, não! — queixa-se, segurando o tornozelo — Não é possível!

O homem, ainda a bastante distância, não deixa o olhar se perder do lugar onde se encontra o menino agora caído. Seu olhar endurecido pela maldade

se concentra em sua vítima.

"Não é possível eu ter esse azar! Tenho que fugir das garras desse homem! Meus pais sempre foram perseguidos por ele! E ele quer me pegar, mas por

que? Para que?! Eu o odeio por tudo que ele já fez e ainda poderá fazer! Eu o odeio!"

Esse pensamento está correndo na mente de William enquanto tenta sair o mais rápido possível do local do acidente. Não tem a quem pedir socorro pois

o lugar está deserto. Começa a chorar; mas gritando, como que à espera que alguém o veja e o ajude a caminhar. E assim, mesmo com dor intensa no

tornozelo, grita:

— O que você quer comigo, hein? Eu sei que você é o Caçador de Recompensas. Não tente me enganar, seu bandido!

* * *

O casal sai do carro e começa a observar o amplo local.

— Ah, meu Deus, será que já não estão mais aqui? E aí...?

— Calma, Gilly.

Continuam a caminhar pelo bosque.

Ela está cansada agora:

Aaaah...! Tenho que parar um pouco, Dave!

— Tá ok; só fico pensando porque você não trocou de sapatos antes de vir comigo, porque essas suas sandálias... sei não...!

— Ei! Para! Você sabe que eu só gosto de usar saltos assim! — fica com ar aborrecido.

Ele se aproxima dela:

— Eu sei, minha vida...! — fita-a com seu olhar apaixonado — Você é pequenininha, daí tem que crescer um pouquinho.

Ela faz um bico com os lábios:

— Mas você fica me achando ridícula.

— Para com isso, amor! — agarra-a num ímpeto.

E ela se entrega, jogando o corpo contra o dele, com uma risada.

Após segundos ele a afasta de si:

— Ei! Espera aí! Nós viemos aqui pra isso? — olha ao redor.

— Vamos, meu bem; a gente precisa procurar o menino! — ela completa.

Num certo momento, após caminharem por alguns minutos, os olhos dele denotam algo:

— Olha lá! É o cara!

— Será...? Como você sabe?

— Pelo jeito de andar, o físico dele e tudo o mais.

— Ei! — ela sussurra — Tem certeza? Se não é o Thompson...

— Mas é o jeito do Caç...

Ele nem conclui a frase. Ela lhe lança um olhar de curiosidade por segundos:

— Eu sei, Dave. Penso o mesmo.

— Ah, não acredito! — ele ergue a cabeça com um longo suspiro — Até que enfim!

E ela meneia a cabeça com um sorriso:

— Você tem que acreditar!

Os dois dão risadas.

Ele segura a mão dela e seguem rápido em direção do homem. Logo o alcançam.

— Ei, cara! — grita Dave.

O homem se volta para olhar.

Neste momento o casal se espanta:

— Desculpa, senhor... — fala Dave.

— Pensamos ser nosso amigo... — ela completa.

O homem apenas faz um gesto de tolerância.

— Desculpe, senhor... — Dave repete, toma a mão de Gilly e caminham, saindo do local.

— Meu Deus, Dave! Nós confundimos o desconhecido com o ... o...

... Caçador de Recompensas.

— Para! — ela estaca os passos para fitá-lo — Para com essa aberração! Chega! Cansei!

— O que está acontecendo com você?! Não está acreditando no que eu falei? E ainda há pouco você disse...

— Não quero mais saber disso.

— Mas você não está mesmo acreditando no que eu já falei sobre o menino?

— Que aquele garoto veio de outra dimensão?

Ele se volta com a fisionomia irada e morde os lábios.

Ela antecipa os passos e segue em frente.

Ele a acompanha.

— Você me fez vir neste lugar só pra... — ela inicia numa queixa.

— Não; eu não lhe chamei! Você quis vir comigo.

Aahn... tá; desculpe.

Ele a envolve com carinho:

— Olha, presta atenção; precisamos nos entender melhor!

— Sim, amor; compreendo que às vezes sou intolerante; desculpe — ela coloca as mãos no pescoço dele, fazendo-o curvar-se para ficar à sua altura.

— Te amo...!

Um estranho ruído lhes atrai a atenção:

— O que é isso?

— Vem dali um som estranho...

— ... como se fosse um gemido!

— Exato.

Ambos ficam atentos ao som vindo de um local próximo.

— Você vai lá, Dave?

— O que você acha? Algo está acontecendo.

 — Cuidado!

Ele a segura pela cintura:

— Fica aqui; e se acontecer alguma coisa estranha me chama.

— Ficar aqui...? Nem pensar! Vou com você.

— Não!

— Claro que vou!

Ele a agarra com força:

— Já te falei; fica aqui.

— Não! Sei lá o que pode vir até aqui? Está escuro, não vê?

Abraçando-a com fervor:

Gilly, eu sei que você faz questão de me ajudar, mas não quero envolvê-la nos meus problemas...

— ... seus problemas são os meus também. — interrompe-o com os lábios quase juntos aos dele.

— Para! — ele sussurra — Você sabe que é difícil eu resistir... para! — sorri — Fica mais longe de mim...!

Dão-se as mãos e seguem em direção ao estranho ruído que lhes chega aos ouvidos.

— Olha, Dave! Ali! — ela fala.

— É o menino! E está caído.

Aproximam-se do garoto que está no chão.

O menino está gemendo.

— O que houve? — Dave quer saber.

— Aquele homem, senhor Dave, ele quis me matar!

— Como assim? E por que? — ela pergunta.

William chora mais quando Gilly o abraça ternamente, tentando erguê-lo do chão.

— Ai, meu tornozelo!

Dave o toma em seus braços.

O menino vai fechando os olhos aos poucos.

— Dave, ele está perdendo os sentidos!

— Vamos levá-lo a um hospital.

— Rápido!

Caminham apressadamente em direção do carro estacionado à distância. Já dentro do carro colocam a criança no banco traseiro.

— Eu fico aqui com ele. — ela fala.

Ele vai para o banco dianteiro a fim de pegar o volante.

— Ai... ai...! — o menino geme.

— Ele está despertando, Dave! — ela anuncia.

— Puxa vida! Já por duas vezes isso está acontecendo com ele e a gente, hein?

— A mesma situação daquele dia! — ela fala com o menino, lhe tocando o rosto — Oi, tudo bem?

— Tá doendo... — diz William — ... felizmente vocês lembraram de mim e me salvaram.

— Você diz que aquele homem quis matá-lo, mas por quê... por quê? — Dave pergunta.

— Ele é inimigo dos meus pais.

— Por qual motivo?

— Ele é um...

— ...um...? — repete Dave.

— ... alienígena.

Gilly, ouvindo essas palavras do menino, cruza os braços:

— Tenho mais é que desempenhar o papel da minha personagem Scully diante dessa sua resposta, garoto! — conclui, apertando os lábios, num ar

cético; volta-se para o menino — Você vai ficar bem; vamos levá-lo para casa.

— Vocês não acreditam... mas é verdade, senhora Gilly! É verdade! Ele sempre perseguiu meus pais!

Dave chama-lhes a atenção:

— Espera aí! Tem uma blitz policial lá adiante!

— Blitz...?

— É. Tem um policial ali, à frente.

O carro é estacionado.

— Pois não, policial. — fala Dave.

— Saia do carro. — o homem fardado ordena.

Dave abre a porta.

— Não! Não saia! É ele! — alerta o menino, com nervosismo.

Dave volta-se para perguntar:

— Tem certeza?

— Eu sinto!

Gilly suspira e está apreensiva.

— Vamos, saia! — ordena o homem novamente, voltando-se para olhar Dave diante dele.

Gilly retira discretamente o celular da bolsa. Fala baixinho ao telefone agora; guarda rapidamente o aparelho.

— Vamos! Não ouviu? Saia! — repete o policial.

Dave coloca um pé fora do carro.

— Você pode conferir nosso carro, se tem algo ilegal. Pode ver.

O homem não dá atenção às suas palavras.

Agora olha para dentro do vidro traseiro.

— Saia com o menino. — fala para Gilly.

— Senhor, ele não está bem; vamos levá-lo ao médico.

— Saia, já disse!

O menino se agarra ao corpo dela, chorando.

Neste exato momento estridentes buzinas se fazem ouvir, vindo na estrada.

— É a polícia! — comenta Dave, olhando firmemente para o estranho homem, que agora volta o olhar frio para os carros que se aproximam.

— O que houve? — ele pergunta aos outros que estão saindo do carro — Estou fazendo meu trabalho. Só isso.

— Ele é um impostor, senhor policial! — grita Gilly de dentro do carro, ainda agarrada ao menino.

— Espera aí, colega, o que está pensando? — diz o homem agitado para os policiais  — Esse pessoal aí é louco!

Os verdadeiros policiais o seguram, exigindo documentos que comprovem a veracidade de sua identidade. Após verificarem a falta de comprovação

vão algemá-lo.

O estranho ataca com um soco um dos policiais, derrubando-o no chão e corre do local. O colega atira e acerta o indivíduo impostor que cai no chão,

parecendo já sem vida.

Segundos após os policiais se aproximam:

— Nossa! O que é isso?! — exclamam ao mesmo tempo.

Dave vai até eles. Verifica, então, o motivo do espanto dos dois policiais.

O corpo do homem caído ao chão tornara-se somente um vulto desenhado no solo. Tudo o que restara da criatura era apenas uma cinza negra.

 

"A vida é como uma cebola: tiras-lhe

uma camada de cada vez e às vezes choras."

H. Sandburg