O PASSADO

"Deixemos que cada mulher tenha um

presente, para que o futuro não a

surpreenda desprovida de um passado."

Priscilla Craven

 

Capítulo 45

Dana havia chegado do Bureau. Cansada. Esgotada.

Havia passado mal com seus enjôos durante a correria do trabalho. Precisa agora descansar.

Dirige-se à cozinha.

Pára diante da pia. Fecha os olhos.

É a primeira imagem que lhe vem ao pensamento. Toma sempre todo o espaço de sua mente. E do seu coração. Não tem jeito.

Tanto havia tentado encontrá-lo!

Juntamente com seus companheiros de trabalho. E até aquele novo agente que faz parte da equipe, agora.

Scully suspira.

Coloca a mão sobre o ventre, acariciando-o, docemente.

O seu filhinho!

Uma grande onde de náusea se apodera dela, que corre em direção do banheiro.

Alguns minutos se passam até começar a aliviar o estômago dos enjôos e tonteiras.

Retira, lentamente a roupa. Coloca-se à frente do espelho.

Com o olhar triste, examina os menores detalhes do seu corpo.

Devia ter prestado mais atenção! Na verdade já havia notado que seus seios haviam aumentado, as linhas esguias do seu pescoço haviam engrossado, o ventre já traz um pequeno e quase despercebido arredondado, a cintura havia aumentado alguns milímetros, a região do seu útero tornara-se um tanto endurecida, uma linha escura desenhara-se visivelmente do umbigo até abaixo de seu ventre.

"E eu não havia percebido tão pequenos, mas visíveis detalhes! Aliás, havia percebido, mas não queria acreditar! Não podia! Esta é a verdade."

Ela suspira, profundamente, fechando os olhos, engolindo em seco.

Os olhos enchem-se de lágrimas. Recosta-se à mesa da cozinha, para divagar seus pensamentos mais um pouco.

Vem à sua lembrança as imagens de Mulder no hospital de neuropsiquiatria, sofrendo aquela doença na cabeça, a qual o deixara semimorto e que havia causado danos ao seu cérebro.

Como ele estivera mal naquela ocasião!

Dana recorda estar junto ao leito dele, falando-lhe, chorosa, temendo que o pior pudesse acontecer.

Mulder estava deitado, abatido e inerte, com olhos abertos, olhar fixo.

Ela havia chegado bem próximo a ele.

Tocou-lhe a testa, suavemente.

Ele movera-se levemente.

Esse sutil gesto enchera o coração de Dana de profundo alívio, pois vira nele um sinal de vida.

Uma lágrima havia caido sobre a face de Mulder.

Ele havia movimentado os olhos sob as pálpebras fechadas.

Abriu-os, a seguir. Entreabriu os lábios um pouco e tentava falar algo, olhando para Dana.

Ela levantara o rosto molhado de lágrimas.

Esse gesto fôra uma maravilhosa reação do seu amado Mulder.

Ela então soluçava e abraçava-o, amorosamente.

Mulder teve, então, forças para agarrá-la contra seu peito.

E Mulder havia se recuperado... ou simplesmente fôra isso um engano? Agora a sua mente está doente e ele desaparecido...

Já havia lido em algum lugar, que os médicos pediatras aconselham as mulheres grávidas falarem com seus bebês em gestação, pois mesmo dentro de seus ventres, eles assimilarão o carinho, a ternura e o amor que suas mães passem a transmitir-lhes.

"Fantástico!" - pensa Dana, com um leve sorriso nos lábios e os olhos carregados de lágrimas.

Abre a geladeira, procurando algo que possa comer. Algo frio, que lhe faça bem ao estômago, agora vazio: uma fruta, por exemplo.

Somente isso aplacará sua fome e tirará, certamente, um pouco do enjôo, que persiste.

O telefone toca na sala.

Dana dirige-se para lá, a fim de atende-lo.

Scully desliga o telefone.

"Que loucura! - pensa - Quando poderia eu imaginar que estaria me preocupando com problemas de gravidez? As esperanças eram tão poucas! - pensa nele novamente - Mulder! Oh, meu Deus! Quanta falta ele me faz!"

Amanhã, o dia seguinte, novamente estará enfrentando o maior de seus esforços para encontrá-lo. Não vai desistir hora nenhuma de seguir em busca dele.

Dana lava uma maçã na pia. Dá uma mordida na fruta, mastigando-a, vagarosamente.

Vai até o quarto. Recosta-se na cabeceira da cama.

Enquanto vai mastigando a fruta, seus pensamentos correm soltos.

Relembra cenas que já fazem parte do passado, mas que, para ela, sempre estarão presentes em sua vida.

Seu pensamento vai para aquele mês de abril de 1994.

Lembra-se de que foi até onde Mulder estava de vigília dentro do carro, acompanhando os passos de um criminoso. E Mulder não dormia há três dias, por causa dessa vigilância.

Dana trabalhava há pouco mais de um ano junto com ele, porem o modo como ele a tratava, como ele a fitava intensamente, era realmente encantador.

Lembra-se perfeitamente do diálogo que trocaram, quando ela entrara no carro para entregar-lhe um lanche.

Ela abaixara o olhar, perturbada com o poder hipnotizador do olhar dele. Iniciara então

uma frase:

Ele rira-se ao ouvi-la chamá-lo assim. E dissera:

Dana enfrentara novamente a atração do olhar dele, para falar:

Olharam-se profundamente, quase que um terno, mas ardoroso beijo trocado com o olhar.

E ele lhe falara, ainda segurando seu olhar, vendo-a com um pacote nas mãos:

As cenas desenrolam-se em sua mente, tal qual um filme.

E enquanto seu cérebro concentra-se nesse diálogo do passado, de há tanto tempo atrás, com os olhos azuis nadando em lágrimas, conclui que, verdadeiramente, foi nessa importante ocasião que a chama do seu amor por Mulder começou a arder-lhe dentro do peito.

Não dava mais para resistir àquele olhar, àquelas mãos suaves quando a tocavam, àquela voz doce e quente, sedutora, quando lhe falava aos ouvidos.

Mulder era no passado, é no presente e sempre será, verdadeiramente, o seu destino.

"É o destino que baralha as

cartas para nós jogarmos."

A Schopenhauer