BRINCADEIRINHAS - ALEGRIA DO CORAÇÃO

 

 

"O coração precisa encher-se de alegria ou de dores.

Tanto uma como outra o alimentam. Ele não pode

suportar o vácuo."

A Karr

Capítulo 59

Domingo.

Dia de descanso, embora véspera de um novo dia de trabalho.

Dana, deitada em sua cama, deixa-se levar pelos seus pensamentos.

Imagina-se junto ao pai de seu filho ali, naquele momento e também junto à sua criança deitadinha entre eles, fazendo mil perguntas, a fim de satisfazer a sua curiosidade infantil. Dana sonha de olhos abertos.

Ela não tem idéia de como será seu filho.

"Como será? Como será? Com qual de nós parecerá?" - pergunta-se.

Imagina Mulder, como costumava fazer; braços cruzados sob a nuca, olhando para o teto, conversando com ela.

Agora, neste momento ela está assim: braços cruzados sob a nuca, olhar inundado de lágrimas, fixado em direção ao teto do quarto.

* * *

Mulder virou-se de lado para olhar Dana:

* * *

Dana fecha os olhos; existe no seu peito uma imensa aflição. Saudade. Tristeza. Desesperança.

Nquela ocasião, no dia seguinte, ela fôra ao médico.

Após ter sido realizada toda a bateria dos necessários exames, dias depois, junto a tantos outros e após terem ido à Bellefleur, antes de toda a tragédia de sua vida acontecer, dar-se-ia a solução e definitiva resposta a todos aqueles problemas de saúde pelos quais estava passando.

E iria dizer a Mulder o fantástico resultado, quando...

As lágrimas dançam dentro de seus olhos azuis, ainda dirigidos para o teto.

O lustre parece dançar sob o efeito do seu olhar molhado.

* * *

Ele levantou-se da cama, rápido, no seu jeito decidido.

Dana permanecera na cama.

Haviam despertado cedo naquela manhã e tinha sido deliciosamente gratificante para o seu coração estar com Mulder ali, amando-a, ele deixando-se amar por ela... acariciarem-se... viverem enfim!

Mulder, no seu passo característico jogando os pés, relaxamente vestido num short, voltara até o quarto.

Sentara-se à beira da cama e deixara o corpo bem próximo ao de Dana. Apoiara a cabeça em seu peito.

Mais tarde, já sentindo-se bem disposta, observava Mulder, que estava cortando a pizza, enquanto falava entusiasmado:

Dana, mordendo um pedaço da dourada e crocante pizza, tomara um susto:

Ele levantou-se rápido e foi até a geladeira.

Dana levantou-se, fingindo-se enraivecida:

Dana deu uma volta pela cozinha.

Ela deu mais uma volta e sentou-se à mesa.

Ela fingiu não ouvir. Recomeçou a comer sua pizza, silenciosamente.

Ela voltou o rosto para olhá-lo.

Ele levou a cabeça para trás, rindo.

Novamente ela fez que não ouviu o chamado. Continuou calmamente a cortar a pizza.

Sentiu, porém, que ele se aproximava.

Ficou alerta, pois sabia que ele estava a fim de brincar; era como sempre dizia.

Ela sentiu um beijo molhado em sua nuca.

Ela levantou-se para sair da cozinha.

Ele tomou-a entre os braços.

Ele a apertou contra si, carinhoso.

Dana soltou-se dos braços dele.

Mulder aproximou uma cadeira o mais junto dela que podia e sentou-se, em seguida.

Começaram ambos a comer seus respectivos pedaços da iguaria.

Dana levou à boca o primeiro pedaço da massa ainda quente.

Mulder, num segundo, mordeu-o junto com ela.

Dana arregalou os olhos profundamente azuis, espantada com a audácia dele.

Ambos mastigaram o mesmo pedaço.

Ele, encostando seus lábios nos dela a fazia entregar-se ao desejo dele de comer a pizza e beijá-la ao mesmo tempo.

Mas sabia e já conhecia o homem amado, tão empolgado quando desejava, realmente, alguma coisa!

Dana não suportou aquele apelo. Não dava mais prara continuar fingir-se brava. Riu demais! Era muito engraçado mesmo o seu Mulder!

Ela olhou-o de soslaio. Cortou o pedaço da pizza. Levou-o à boca. Olhou-o de soslaio, novamente.

E outra vez ele abocanhou o pedaço que ela havia levado à boca e prendido entre os dentes.

Dana deixava-se acarinhar por aquele gesto.

Amava-o; desejava-o Era tudo que podia saber e avaliar. Nada ou ninguém poderia mudar seu coração e o seu sentimento.

Mastigaram juntos o pedaço ao mesmo tempo, entre risos e abraços carinhosos.

Do interior da sua boca inteira. Completamente.

E amaram-se naquele modo um tanto original de sentir um o outro.

As mãos grandes de Mulder amassavam-lhe as carnes e andavam sobre todas as suas protuberâncias.

E a pizza, o pivô do acontecimento, permanecia lá, esquecida sobre a mesa...

Por longos minutos tatearam-se, ofereceram-se no supremo desejo de possuirem-se reciprocamente.

* * *

Dana havia deixado a cozinha por instantes. Ao retornar procurou por Mulder.

Ele estava lá. No chão. Deitado em decúbito dorsal. Inerte.

Em cada olho uma rodela de vermelho tomate; na boca uma azeitona; entre os cabelos pedacinhos de verdes folhas de alface; em cada ouvido um galhinho de coentro; nas faces um pedaço de queijo.; no peito ketchup derramado.

Dana mal pudera pronunciar essa frase. Ria sem poder conter-se.

E ele continuava lá, impávido, aguardando a sua reação.

Dana ajoelhou-se ao seu lado.

Dana não conseguia conter-se. Deitou-se ao lado dele, para ficar ao seu lado.

Debruçou-se sobre ele e primeiramente abocanhou uma das rodelas de tomate.

Continuava a rir, sem parar.

Ela continuava a rir.

Lambeu em seguida o ketchup sobre o peito dele.

Deitou-se, finalmente por cima de Mulder.

Sabia que sujaria sua roupa, que se lambuzaria com os condimentos... mas tudo bem.

Aquele momento era deles. Seu momento de pura diversão.

Tinham mesmo que aproveitar aquela rara ocasião.

"No amor, a ocasião é semelhante a uma garrafa

que nos escapa das mãos, se não a segurarmos

pelo gargalo."

Francis Bacon