ENCANTO DO PAI

"O mais generoso de todos os afetos que

fazem palpitar o coração humano é o de pai."

Paolo Mantegazza

Capítulo 96

 

Scully está atarefada.

Havia mandado fazer uma grande faxina em seu apartamento. Mas a parte que lhe compete, arrumar coisas pessoais, dava-lhe imenso trabalho.

Muita coisa retirara de seu armário, para, novamente ser recolocada. Trabalheira.

Em dado momento suas mãos tocam em um objeto que a faz, imediatamente, relembrar algo.

A desengonçada figura surge, segura pelos dedos de Dana.

"Eu já nem lembrava mais dela!" - pensa.

Ganhara-a na véspera de um dia grandemente atribulado.

"Não gosto de pensar na ocasião, mas este presente me tocou fundo, no coração."

Ela está distraída, segurando o objeto em suas mãos, de pé, junto às portas escancaradas do armário.

Dana sente-se mais descontraída.

Ele afasta-se, cruzando os braços diante dela.

Mulder corresponde.

Dana afasta-se.

Ela tira uma caixa com um par de bonecos.

Mulder senta-se na cama para olhar.

Dana continua retirando objetos do armário e os vai jogando ao lado de Mulder, na cama.

Ela pára o que está fazendo e olha-o, amorosa.

Ele ergue-se, alcança-a e a puxa pela cintura, derrubando-a sobre a cama.

Grudam-se, gostosamente, um ao outro, prazerosos.

O bebê chora no berço.

Retira, jeitosamente, o bebê do berço, carrega-o no colo e deita-o sobre a espaçosa cama.

Enquanto Dana arruma os objetos de volta ao armário, Mulder brinca com os pezinhos do filho, debruçado sobre ele.

Ela volta-se para olha-lo.

Dana olha-o, pesarosa. Em segundos, porém, seu semblante modifica-se, demonstrando alegria, para descontrai-lo.

O bebê agarra a primeira peça de roupa que está próxima e vai levando-a à boca.

Mulder a puxa, cuidadoso, de suas mãos. Olha para trás, a fim de falar alto, de modo que Dana o possa ouvir de onde está.

Mulder segura, novamente seu filho para coloca-lo no colo. Caminha com ele para onde Dana está.

O bebê, agitando as mãozinhas, olha, firmemente para o pai.

Dana, às voltas com pratos e talheres que tira do armário, pára de repente, para apreciar a bela cena à sua frente.

Mulder continua a brincar com o filho no colo. Senta-se Em sua mão o objeto dado à criança para distrai-lo, cai ao chão. Ele o apanha do chão e continua a agitá-lo frente aos olhos do bebê.

Em um dado momento em que havia parado por segundos, seu trabalho, Dana, vê, horrorizada, o que Mulder tanto agita diante dos olhos da criança, para chamar-lhe a atenção.

Ele assusta-se:

Mulder fixa, estático, os estupendos olhos azuis de Dana a lhe censurarem.

E sacode a desengonçada boneca diante dos seus apaixonantes olhos cor do céu.

Dana vai rápida na direção de Mulder.

Após toma-la, sai em direção do quarto com a boneca nas mãos.

Mulder dá de ombros, indiferente.

Dana retorna à cozinha.

Novamente seus olhos deparam com uma cena que não lhe é nem um pouco agradável.

Mulder havia deixado que a criancinha agarrasse com sua pequena força a ponta da toalha da mesa, incitando-o com palavras ternas e incentivando-o a puxa-la.

Dana pára à porta, com o olhar fixo na cena. Percebe que poderia causar estragos a toalha arrancada da mesa, pois sobre ela se encontram utensílios de vidro e porcelana, copos, potes com alimentos em conserva e demais vasilhames preparados para uma refeição. Ela chega a abrir a boca para protestar, quando um pensamento aflora à sua mente:

"Tenho que parar de chamar a atenção dele a todo instante. Afinal, os pais são tão crianças quanto seus filhos... eu tenho que ser menos ranzinza e se eu ficar menos em cima de tudo o que ele faz, com esforço, ele se conscientizará de que deve agir com sabedoria e cautela ao lidar com uma criança. E ele está, agora, experimentando o encanto de ser pai."

Tenta distrair o bebê e o pai, mostrando uma travessa repleta de apetitosas e vermelhas ameixas.

Ele toma uma das frutas e leva-a à boca.

O bebê solta a ponta da toalha que tinha agarrado e fixa o olhar no vermelho escuro chamativo da fruta na mão do seu pai.

Dana ri, divertida.

Ela aproxima-se com um prato que havia retirado do micro ondas. Dá um beijo rápido e suave nos seus dois amores; olha-os por segundos e continua sua tarefa.

Ele senta-se, com o bebê no colo.

Começam a servir-se para o almoço.

Ela ri e continua a comer, tranquila, sua refeição.

Prosseguem no seu almoço.

Mulder, jeitosa e ordenadamente, vai usando seu garfo, enquanto apoia o bebê sobre a perna, sustentando-o com um braço.

Em dado momento as mãozinhas do pequeno tocam no copo que está muito à beira da mesa. Mulder interrompe, rapidamente, a queda do mesmo, que estraçalhar-se-ia no chão, caso não fosse impedido.

Dana contém-se para não chamar novamente a atenção de Mulder. Controla-se. Com esforço.

Mulder, com seu sorriso de menino, ri da travessura de Will com suas agarradoras mãozinhas. Enche o copo com água, toma-o na mão, e o leva, cuidadosamente, à boquinha diminuta de seu filho, fazendo com que a água escorra-lhe da boca, esparramando-se na camisinha macia e delicada do bebê.

Dana, por sua vez, enche de água o seu próprio copo que está ao lado do prato. Sorve a água, enchendo a boca, sem engolir o líquido. Assim permanece por minutos. É um sacrifício. Continua olhando a cena do pai e filho. E com a boca cheia d'água. O que, certamente, a impede, então, de falar. Reclamar. Xingar. É, portanto, contida em seu propósito.

Por segundos passa-lhe na mente a idéia: "Se Mulder falar qualquer gracinha, eu não vou poder me conter e, se eu tiver que rir, será um desastre. Soprarei água pra todos os lados. Não quero nem pensar! "

Mulder, em sua ocupação de dar a água ao bebê, nem repara que Dana mantém-se, há vários minutos olhando-os, com a boca cheia d' água, para impedir-se a si mesma de protestar.

"Para dizer a palavra certa no momento

oportuno, fale o menos possível."

John W. Raper