PENSAMENTOS SOB AS ESTRELAS

 

 

"O que seriam os desertos da vida sem as

brilhantes miragens de nossos pensamentos!"

Anatole France

 

Capitulo 24

Nos corredores do FBI Mulder caminha apressadamente. Nas mãos vários papéis estão seguros, parecendo, no entanto, por instantes, que possam soltar-se de entre os dedos do afobado Agente.

Ele desce as escadas rapidamente e entra em sua sala.

Ele, com rapidez, arruma vários documentos numa pasta.

Ele levanta os olhos em sua direção:

Ela volteia o olhar pela sala; faz a gaveta do arquivo deslizar vagarosamente para fechá-la:

Mulder bate com uma pilha de papéis na mesa para arrumá-la. Larga-a dentro da pasta. Caminha até onde está Scully.

- Scully, - segura-a pelos ombros - o que há com você?

Ela lança na direção do rosto dele o seu olhar intensamente azul.

Ela aconchega-se a ele para sentir o calor e a brandura que emana do homem amado.

Ele percebe que a pergunta saira automaticamente de sua boca, mas no âmago do seu sêr entende muito bem o significado das palavras de Scully.

Ela nada mais fala. Mantém-se apertada entre os braços dele.

Um ruído na porta os faz voltar à realidade. Separam-se imediatamente.

A porta abre-se e entra na sala a secretária de Skinner.

 

X x x x x X

 

O cair da tarde morno ainda pelo dia completamente ensolarado que fizera, traz em Scully desejos de imaginar-se em um lugar bem diferente de estar ali dentro daquele carro saindo a correr atrás de bandidos, loucos ou extraordinários seres.

Ela mantém os olhos fechados, com a cabeça recostada ao banco.

Mulder a fita com olhar amoroso.

Um grande espaço na estrada, com extensa vegetação rasteira como um gramado natural, que àquela hora já não mostra muito seu verde devido ao anoitecer, descortina-se diante de seus olhos.

Já começa a despontar uma infinidade de pontilhados cintilantes no céu pelo brilho das estrelas.

Mulder diminui a velocidade do veículo.

Scully o olha:

Ele faz parar o carro no acostamento.

Saem ambos de dentro dele.

Grandes rochas à beira da estrada e espalhadas pelo gramado parecem convidar à uma parada naquele amplo pedaço da natureza.

Mulder estira os braços para o alto, espreguiçando-se longamente.

Toma Scully pela mão e escolhe um daqueles improvisados bancos para ambos sentarem-se e usufruir o encanto daquela noite enluarada.

De vez em quando o canto de um pássaro noturno ressoa entre as árvores mais distantes.

Sentam-se numa grande pedra achatada.

Ambos olham para o céu, detendo a vista na grandiosidade do espetáculo que se descortina lá no alto.

Seus pensamentos levam-na a permanecer calada e distante.

"Quanta coisa fiz na minha vida da qual me arrependi e quantas outras eu poderia ter feito e mudado todo o curso da minha vida... e assim poder realizar os meus desejos... por que não posso ser totalmente feliz como preciso? Falta algo, além do homem amado, um objetivo ansiado por todas as mulheres... um objetivo que nos satisfaz pessoal e psicológicamente, uma realização que nos leva ao extremo da satisfação. Um prazer imensurável! A realização plena de um desejo que permite possuirmos uma parte de nós, nosso sangue, nossa carne...

Mas eu... eu não posso... foi-me tirada essa faculdade, não por Deus, mas por seres humanos, que no auge do seu egoismo, só tem o desejo de cuidar de sua maligna satisfação pessoal... inimigos de seus próprios semelhantes...

Oh Deus, nem desejo guardar tanto ódio no coração, mas no entanto... ao afirmar isto estou enganando a mim mesma!"

Ela desperta de seus pensamentos.

Mulder desliza os dedos sobre o rosto triste de Dana.

Ela não está chorando, mas lá, no fundo dos olhos azuis, delineia-se uma profunda melancolia.

Mulder beija os olhos amados com carinho e ternura.

O contato daquela boca a faz sentir-se mais ainda desejosa de poder alcançar os seus intentos, seus sonhos impossiveis... e dá rédeas novamente a seus pensamentos.

"Mulder merece ter o máximo de felicidade; ainda mais porque não tem uma família, não tem ninguém, só tem a mim e eu não posso satisfazê-lo no desejo de... ter um filho que lhe herde as maneiras, as virtudes, os sonhos..."

Scully sente o corpo de Mulder quente, desejoso, transmitindo-lhe amor.

As mãos dele agarram-na, afagam-na, e num ímpeto, seguram-na com ardor.

Mulder ri, gostosamente, como Scully raramente o vê fazer.

O sorriso de menino que lhe dá um ar ingênuo na fisionomia e lhe faz os olhos pequenos e esquadrinhadores esconderem-se dentro das maçãs do rosto.

Continua a rir, divertindo-se com a idéia e com o ponto de vista sempre sensato de sua Scully.

Scully corresponde com todas as forças do seu amor àquele beijo sob as estrelas.

-Scully... - murmura, encostando os lábios nos dela - ...nós temos que aproveitar o máximo de nosso tempo... - beija-a novamente - ... foi muito tempo Scully... sem te ter... só sofrendo o amargor da espera... - beija-a mais - ... do teu amor... Scully!

Ela corresponde à doce ansiedade daqueles beijos.

Separam os lábios.

Ele aperta-a contra seu peito.

Ele suspira. Volta o olhar para cima.

O céu pontilhado de estrelas e a lua de prata são as únicas testemunhas de suas palavras.

Scully puxa-o para si, apertando-o contra seu corpo. Nada fala. Sua voz está embargada. Um nó sufocante aperta-lhe a garganta. Os pensamentos voltam à sua mente num roldão:

"Por que ele me diz isso? Se tal acontecesse o que seria de minha vida? Como eu ficaria sem Mulder?

E ele diz: " Eu não tenho nada pra te deixar de mim, Scully! "

Deus! Eu não quero pensar mais na minha desesperança! Tira de mim e de Mulder os pensamentos tristes, Deus! Não me deixa chorar mais por meus problemas sem solução. Tira de mim essa tristeza do fundo do meu coração! Eu não quero mais lembrar... de nada mais!"

Scully, com os olhos brilhantes de lágrimas, toca com os dedos a pequena cruz de ouro do cordão no seu pescoço, como que assim possa fazer Deus perceber a necessidade que ela tem de Sua proteção e amparo.

"Os olhos não vêem bem Deus,

senão através das lágrimas."

Victor Hugo